A paisagem tech tem vindo a evoluir a alta velocidade. Entre start-ups, unicórnios e os gigantes de renome, este setor tornou-se uma força incontornável a influenciar a realidade social – e até civilizacional –, através de inovações constantes, que moldam o nosso dia-a-dia. Trabalhar em tech é sexy, é trendy e acima de tudo, é o futuro.

No entanto, apesar de cada vez mais os jovens serem encorajados a seguir carreiras nesta área, ainda prevalecem alguns estereótipos acerca do que é realmente trabalhar em tecnologia. Numa fase académica, poucos serão aqueles que sabem quais os verdadeiros desafios da realidade de trabalho.

Na Sky Portugal, onde trabalho há 7 anos, os desafios de construir uma aplicação que é usada por dezenas de milhões de pessoas são uma constante, a nível técnico e a nível de gestão. Uma aplicação desta escala, como é o caso do Peacock, a aplicação de streaming da NBCUniversal que concorre diretamente com os grandes serviços de streaming nos EUA, não se constrói com 5 programadores e uma caixa de pizza.

A complexidade do código, o número extenso de equipas e uma infraestrutura de backend capaz de espantar até os mais fortes de coração, é muitas vezes intimidante para os profissionais mais juniores que se juntam a nós. Precisamente por isso, uma das minhas principais preocupações é derrubar ideias pré-concebidas do que é ser um bom profissional e ter sucesso nesta área. E é isso que quero fazer também aqui.

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Tecnologia é só para nerds

Longe vão os tempos em que a imagem de um programador era a de alguém que vivia recôndito numa garagem ou cave, rodeado por latas de refrigerante e banda desenhada. Um ser cavernoso, que programava noite e dia como se a síndrome de túnel de carpo jamais lhe pudesse atingir os tendões fortificados pela força de vontade e açúcar.

A realidade não poderia ser mais díspar. Atualmente, universidades por todo o país (e mundo!), abrem as suas portas a enxurradas de aspirantes a engenheiros informáticos, cada vez mais representativas da diversidade que compõe a nossa sociedade.

Alguns ingressam nesta área guiados pela curiosidade, outros pela motivação e, claro, outros porque lhes disseram que tech está de boa saúde e recomenda-se, afinal é o futuro. Na verdade, não só é a tecnologia que é o futuro, mas também a multiplicidade de perspetivas que esta crescente diversidade lhe traz.

Existe uma metodologia perfeita para trabalhar

Vamos já desmistificar: existem metodologias de trabalho para todos os gostos, e quase todas prometem soluções milagrosas, contudo, nunca haverá uma silver bullet.

A metodologia A, B ou C é a solução para todos os problemas. Nunca é. Como já referi existem inúmeras metodologias de trabalho, exemplos disto são waterfall, kanbam ou scrum, sendo esta última a utilizada pela Sky. Independentemente de qual a escolhida, elas são meras ferramentas com o objetivo de facilitar e agilizar a construção de um produto final. A primazia deve ser sempre a qualidade daquilo que produzimos, e por isso, a melhor metodologia é aquela que se adapta à realidade da empresa e das equipas.

Estar aberto a considerar ou experimentar novas formas de trabalho também é crucial, mas nem todas serão necessariamente mais vantajosas ou benéficas apenas por serem novas ou diferentes.

Mais horas trabalhadas traduzem-se em maior sucesso profissional

Quase que voltamos à imagem inicial de alguém cuja vida não vai além do ecrã à sua frente. Felizmente, a realidade não é assim.

Inovações constantes e cada vez mais velozes fazem imperar a cultura do resultado imediato, mas esta não pode ser a mentalidade que nos orienta. Não serão horas a mais que irão necessariamente atribuir qualidade e velocidade àquilo que entregamos.

Muito pelo contrário, conseguir um equilíbrio saudável para a nossa vida pessoal e desafios profissionais é um dos fatores que mais contribui para a qualidade do que criamos. Aprender a gerir este equilíbrio nem sempre é linear, mas é algo que devemos começar a fazer logo desde o início da nossa carreira.

Falar inglês é mania das redes sociais

É verdade que temos assistido a um grande boom de tecnológicas a nível global e esta tendência também é notória no nosso contexto em Portugal. Isto contribui para que estejamos cada vez mais inseridos numa sociedade global, o que tem trazido cada vez mais estrangeirismos para o nosso léxico do dia-a-dia.

O lado bom é que saber falar inglês fluentemente a nível profissional abre-nos mesmo muitas portas. Se no estereótipo inicial vivíamos comicamente na garagem da casa da mãe, hoje essa garagem pode ser o mundo inteiro. O mercado de trabalho e empresarial neste momento é mais global do que nunca e cada vez mais vemos grandes empresas a investirem no talento tecnológico português. A própria Sky é um exemplo disso, estando em terras lusitanas há pouco mais de 10 anos.

Seguindo com o exemplo da Sky, sendo britânica e pertencente ao grupo americano da Comcast, faz com que muito do nosso quotidiano aconteça em inglês. A maioria das nossas reuniões, ou mesmo as interações entre programadores, é feita em inglês. Saber falar inglês bem é um dos melhores investimentos que podemos fazer na nossa carreira.

Após tudo isto, o meu conselho final para quem está agora a terminar o seu percurso académico e a dar os primeiros passos no contexto profissional é: respirar fundo, arregaçar as mangas e encher o peito de humildade.

As escolhas são muitíssimo variadas, desde a programação pura, QA, segurança, automação, entre muitas outras. Na Sky, por exemplo, existe um leque alargado de posições, e não é incomum o trajeto profissional de alguém começar por programar na linguagem X, Y ou Z, mas não se ficar por aí.

O importante é manter a mente aberta, empenho e gosto no que se faz. Num mundo cada vez mais dependente dos prazeres do pequeno ao grande ecrã, existe sempre uma grande diversidade de perfis e perspetivas a contribuir para os produtos e as aplicações que consumimos todos os dias de forma desenfreada. Para todos aqueles que almejam um dia vir a gerir uma equipa e guiar o barco tecnológico é essencial lembrar: as águas navegadas podem ser agitadas, mas a primeira preocupação deve sempre ser a tripulação.

A Ana trabalha na área da tecnologia há cerca de 10 anos, tendo progredido no âmbito do desenvolvimento Android, passando mais recentemente pela liderança de equipas técnicas. “Orientar o barco tecnológico” da sua equipa é o seu dia-a-dia enquanto Engineering Manager na Sky Portugal. Mas além da tecnologia a Ana é possuidora de um número (quase!) infinito de hobbies: gamer fervorosa, ávida leitora, adora montar móveis e bricolagem, tem um gosto afincado por fotografia, legos e por fazer crochet, é apaixonada por aquariofilia, mãe de coração inteiro e cozinheira apenas em part time.

O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.