Na passada sexta-feira, dia 25 de Novembro, foi lançado em Lisboa o livro precisamente intitulado O 25 de Novembro e a Democratização Portuguesa (Gradiva, 2016). Sob a coordenação de António Barreto, João Salgueiro, Luís Valença Pinto, Manuel Braga da Cruz e Vasco Rocha Vieira, a obra foi apresentada por Jaime Gama e Manuel Braga da Cruz.

Em boa verdade, a iniciativa assinalou bastante mais do que o lançamento de um livro. Culminou um vasto programa de iniciativas da sociedade civil (onze, com efeito) que tiveram lugar durante o ano passado para assinalar os 40 anos do 25 de Novembro de 1975. O livro agora publicado dá conta das comunicações apresentadas em todas essas iniciativas. Um primeiro conjunto de comunicações tinha já sido publicado pela revista Nova Cidadania (No. 58, Primavera de 2016).

Por que motivo terão estado tantas pessoas envolvidas na evocação do 25 de Novembro — sem subsídios do Estado, ou sequer de partidos políticos? A pergunta talvez tenha alguma pertinência, sobretudo tendo em conta que — precisamente a 19 de Novembro do ano passado — a actual direcção do Partido Socialista, o Bloco de Esquerda e o Partido Comunista decidiram no Parlamento que a celebração dos 40 anos do 25 de Novembro “não tinha relevância”.

Uma resposta pode certamente ser encontrada no Manifesto que deu origem ao programa de comemorações e ao livro agora publicado (originalmente assinado pelos já referidos António Barreto, João Salgueiro, Luís Aires de Barros, Luís Valença Pinto, Manuel Braga da Cruz e Vasco Rocha Vieira):

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“O 25 de Novembro é o oposto, não do 25 de Abril, mas do 11 de Março. O que o 25 de Novembro veio destruir foram os excessos da pretensa ‘revolução socialista’ e não as conquistas da revolução democrática de Abril. (…) O 25 de Abril era democrático, não necessariamente ‘socialista’. Não visava a substituição de uma ditadura autoritária por qualquer outra ditadura socialista.”

Com efeito, o 25 de Novembro de 1975 veio repor a democracia de tipo ocidental em Portugal. E veio desfazer os mitos terceiro-mundistas fundados na dicotomia “fascismo ou revolução”.

Essa dicotomia terceiro-mundista infelizmente teve uma longa vida entre nós. Durante cerca de 48 anos, sobretudo após a parcial vitória anglo-americana na II Guerra e a democratização do continente europeu ocidental, Portugal continuou, inexplicavelmente, com um regime autoritário (ainda que moderado, por comparação com os restantes).

Embora eu não seja historiador (e não alimente a menor curiosidade pelo fenómeno terceiro-mundista do salazarismo), parece que a principal justificação para a ditadura autóctone era a ameaça do comunismo (além da muito legítima memória da anarquia terceiro-mundista da chamada I República). Por qualquer motivo extravagante, não nos ocorreu que entre o autoritarismo de Salazar e o totalitarismo comunista havia a não-revolucionária alternativa da democracia constitucional pluralista ocidental.

Por outras palavras, vivemos durante cerca de 48 anos, por assim dizer, sob a “infeliz dicotomia” (uma expressão de Dahrendorf sobre o atavismo das culturas políticas continentais) do “salazarismo ou comunismo”.

Esta dicotomia foi imediatamente reposta após o 25 de Abril pelo terceiro-mundismo do chamado PREC. Nessa altura, a velha dicotomia “salazarismo ou comunismo” passou a ser chamada “fascismo ou revolução”. Em nome dela, as chamadas forças revolucionárias — lideradas pelo PCP e pela extrema-esquerda — tentaram a todo os custo impedir a estabilização da terceira alternativa que também o salazarismo tentara ignorar: a tranquilamente civilizada democracia constitucional pluralista ocidental.

Foi a esta obsessão terceiro-mundista com infelizes dicotomias – do “salazarismo ou comunismo” e do “fascismo ou revolução” — que o 25 de Novembro de 1975 pôs cobro. Foi o 25 de Novembro de 1975 que efectivamente repôs a esperança democrática ocidental que o 25 de Abril de 1974 anunciara. E foi graças a esta democracia ocidental que vivemos durante os últimos 41 anos em liberdade e em imenso progresso económico e social.

Parece, no entanto, que “old habits die hard“. De súbito, vai por aí uma grande comoção com a morte do ditador Fidel Castro. E um debate existencial parece apaixonar as mentes autóctones: qual foi o legado de Fidel Castro?

Bem, a resposta é óbvia e o tema totalmente desinteressante: o torpe ditador terceiro-mundista construiu em Cuba uma horrível prisão comunista.

Convém apenas recordar que Fidel impôs essa paupérrima prisão em Cuba com base na infeliz dicotomia do “fascismo ou revolução” — a que o nosso 25 de Novembro de 1975 felizmente pôs cobro. Pelo menos, até agora.