Desde criança ouvimos coisas do tipo “é preciso enfrentar os seus problemas” ou “você não pode fugir das coisas só porque elas te desagradam”. E foi assim que eu vivi durante mais de 30 anos – sempre afirmando para mim mesma que tudo aquilo que fosse um incômodo precisava, necessariamente, ser resolvido o quanto antes e jamais deixado de lado.

Todavia, recentemente, estava lendo um livro de um professor de psicologia da Universidade de Yale (Permissão Para Sentir, de Marc Brackett, Diretor do Centro de Inteligência Emocional de Yale) e fui surpreendida com uma visão bastante diferente do assunto.

Brackett fala das chamadas “estratégias de antecipação” para gerir algumas das nossas dinâmicas emocionais negativas. Ou seja, fala sobre aprendermos a nos conhecer e, antecipadamente, identificar as situações ou pessoas que nos despertam gatilhos, nos geram irritação ou nos subtraem a segurança. Saber o que nos faz mal é um grande começo, mas eu imaginava que, na sequência ele nos orientaria a combater esses problemas de alguma maneira.

Ocorre que, em seguida ele passa a explicar as chamadas “estratégias de desvio de atenção”. Essa ideia consiste basicamente em evitar as tais situações que nos geram desconforto. Fiquei um pouco atônita. Nunca tinha me deparado com essa proposta. Sempre ouvi que o correto era pegar o mal pela raiz e arranjar uma forma de lidar com ele. Certo? Talvez não.

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O professor de Yale afirma que não há problema em evitar aquilo que não nos demanda uma solução. Por exemplo, um familiar que nos incomoda é algo que quase todos temos – e que a maioria de nós busca formas de tentar entender, de encontrar pontos de interesse comuns e coisas do gênero. Brackett diz que não há nada de errado em sentar na outra ponta da mesa quando encontramos esse parente num almoço de família. E que, muitas vezes, lutar contra essa realidade (de não conseguir ter harmonia com alguém) é algo que causa muito mais desgaste do que o relacionamento em si.

Ele propõe a mesma atitude para outros tipos de situação. Se você não gosta do seu vizinho, você não precisa lutar contra isso. Apenas evite sair nos horários em que cruza com ele. Se você não pode comer fritura, você não tem que aprender a resistir a batatas fritas olhando para elas. Proponha aos seus amigos ir a um restaurante italiano ou japonês.

Resistir a tentações nem sempre é fácil. Em geral é bem difícil. Ter paciência com algumas pessoas também não é. Resistir a provocações é igualmente desafiador. Vivemos numa sociedade que nos incentiva a trabalhar o autocontrole, a treinar a compreensão, a evitar a raiva. Ninguém nos dá um salvo conduto dizendo que podemos, às vezes, fugir para as colinas e deixar tudo como está. E devo dizer, Marc Brackett, que muitos de nós estavam precisando disso. É bom poder fugir de vez em quando.

Como diria o teólogo estadunidense Reinhold Niebuhr “Concedei-nos, Senhor, a serenidade necessária para aceitar as coisas que não podemos modificar, coragem para modificar aquelas que podemos e sabedoria para distinguirmos umas das outras.”.