Na próxima quinta-feira, 21 de Abril, o mundo de língua inglesa celebrará os 90 anos da Rainha Isabel II. A 9 de Setembro do ano passado, intensas celebrações assinalaram a data em que Isabel II se tornou a monarca que mais tempo ocupou o trono, ultrapassando a Rainha Vitória.

A Rainha e a monarquia britânicas mantêm elevadíssimas taxas de popularidade. É a monarquia constitucional mais antiga do planeta. A Rainha é a Chefe de Estado de 16 países da Commonwealth (incluindo Austrália, Canadá e Nova Zelândia), reinando sobre cerca de um quarto da população mundial. Em 63 anos de reinado, teve 12 primeiros-ministros britânicos, incluindo Churchill, Thatcher e Blair.

A que se devem o sucesso e a longevidade da monarquia constitucional britânica? Talvez uma forma de sugerir a resposta consista em observar que um sistema deste tipo não seria hoje desenhado intencionalmente — seguramente não pela maior parte dos nossos políticos, dos nossos comentadores ou dos nossos activistas das chamadas “redes sociais”.

Uma monarquia constitucional choca os mais básicos preconceitos da era moderna. E isso foi ostensivamente declarado pela funesta Revolução Francesa de 1789, a que a nossa cultura política ainda erradamente atribui a origem da democracia moderna.

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Só que a monarquia constitucional britânica não foi na verdade desenhada centralmente por ninguém, por nenhuma revolução, acto fundador ou sequer Constituição fundadora. Ela simplesmente emergiu. Emergiu de um longo e multissecular processo de interacção entre várias instituições, várias correntes políticas, vários interesses e vários propósitos particulares. Por outras palavras, a monarquia constitucional britânica emergiu do espírito de compromisso e de moderação — da evolução gradual, não da Revolução.

Elie Halévy, o célebre historiador francês do século XIX inglês, cunhou a expressão “milagre inglês” para designar o milagre de a Inglaterra ter feito todas as revoluções da época moderna sem ter recorrido à Revolução. Por outras palavras, Halévy não distinguiu a Inglaterra por ser imobilista. Pelo contrário, sublinhou que fizera muitas mudanças, frequentemente antes dos outros países. Mas que as fizera sem rupturas, sem revoluções e contra-revoluções, sem fanatismo.

Com efeito, a última Revolução ocorrida em Inglaterra teve lugar em 1688, quase cem anos antes da revolução americana de 1776 e mais de cem anos antes da funesta revolução francesa de 1789. Foi uma revolução conservadora, assente num bloco central de moderados da direita e da esquerda, cujo propósito principal era evitar mais revoluções. Eles disseram que queriam restaurar a “Antiga Constituição” da Magna Carta de 1215, contra o despotismo inovador de Jaime II, por um lado, e o despotismo inovador dos republicanos radicais, por outro. O choque entre esses rivais despotismos inovadores já custara ao país uma guerra civil e uma ditadura republicana, entre 1640 e 1660.

Winston Churchill descreveu este gradualismo britânico com a expressão “corrente de ouro”, a propósito da filosofia política de seu pai:

“[Lord Randolph Churchill] não via razão para que as velhas glórias da Igreja e do Estado, do Rei e do país, não pudessem ser reconciliadas com a democracia moderna; ou por que razão as massas do povo trabalhador não pudessem tornar-se os maiores defensores destas antigas instituições através das quais tinham adquirido as suas liberdades e o seu progresso. É esta união do passado e do presente, da tradição e do progresso, esta corrente de ouro [golden chain], nunca até agora quebrada, porque nenhuma pressão indevida foi exercida sobre ela, que tem constituído o mérito peculiar e a qualidade soberana da vida nacional inglesa.”

Isabel II tem sido seguramente o símbolo destacado desta “corrente de ouro” que permitiu ao Reino Unido fazer todas as revoluções da época moderna sem recurso à Revolução.

Num artigo notável no Telegraph de Setembro último, Charles Moore (antigo director do jornal e biógrafo autorizado de Margaret Thatcher) resumiu magistralmente o papel de Isabel II na vida política britânica:

“Ela compreendeu que a monarquia é potencialmente hostil à democracia, e por isso teve o cuidado de evitar esse confronto. Mas também viu que a democracia, porque inevitavelmente funciona através do conflito, poder tornar-se demasiado rude. Pode levar os participantes a desprezarem-se uns aos outros. Por isso a Rainha pode ajudar a acalmar os ânimos — uma figura de paz, cortesia e confiança. […] Esta combinação de monarquia e democracia ajudou o país a ser livre e seguro ao mesmo tempo.”