Desde que a invasão da Ucrânia, por parte da Rússia, se iniciou, que, além dos horrores que nos entram pela vida adentro a cada minuto que passa, somos, igualmente, obrigados a suportar uma panóplia de comentadores (alguns deles também comentam futebol em outros horários) que falam muito e muito cheios de si mesmos.

O exercício seguinte é o de apresentar um género de glossário, relativo aos vários temas, expressões e posições que se têm repetido com mais frequência, desde o início da guerra, através dos nossos Pundit, assim como algumas da minha lavra.

Advérbio: Todos aqueles que, condenando a Rússia, terminam a frase com: “mas”. Este advérbio é o busílis da questão. “Mas”, neste tema, leva sempre a um qualquer nível de desculpabilização da Rússia e é música para os ouvidos de Putin.

Bravata: 1º tivemos o Bono, que foi desafinar para o metro de Kiev. Agora, temos o cantor que nunca tira os óculos, a gritar impropérios em cima de um palco. É a receita certa para se ser falado. Desconfio deste tipo de valentia, ou bravata. Por que razão, não mandou o cantor, para a mesma parte – ou, melhor dizendo, para a mesma actividade – o Sr. da Coreia do Norte, o Maduro e mais uns quantos? Porque as atrocidades do Putin nos entram pela tv? E quantos milhões já morreram de fome, por esse mundo fora, por responsabilidade de regimes comunistas despóticos, ou de doidos comunistas que falam com passarinhos? Claro está que a nossa intelligentsia se colocou ao lado de Abrunhosa, mas criticou Milhazes, que, na tv, de forma natural, a tempo e na sequência do discurso, mandou Putin para aquela parte, de forma natural e sem planeamento.

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Compreensivo: “a NATO não é flor que se cheire”; “quem ganha são os industriais do armamento”; “não há santos nas guerras” (a sério?!); “deve existir mais diálogo” (pois está bem). Estas são as conclusões, costumeiras, dos compreensivos. Nos dias que correm, gostam de se abrigar à sombra do Papa, desvirtuando – ou não compreendendo – o verdadeiro alcance das palavras de Francisco. A guerra foi imposta aos ucranianos. Enquanto as bombas continuarem a cair nos seus quintais, não podem dar a outra face. Não se apercebem, os compreensivos, que é do medo que os ditadores se alimentam.

Demagogia: A trupe bloquista. Se, por um lado, se recusam a assinar manifestos contra a guerra, por outro, aparecem inopinadamente nas manifestações contra a mesma (porque estão lá as tv’s). São contra a NATO, mas dizem que é preciso apoiar a Ucrânia. Já não há paciência.

Escusado: O convite a comunistas portugueses – leia-se membros do PCP – para opinarem sobre a guerra. Para estes zombies da nossa vida política, a memória é viva até 1953 (não lhes sai da cabeça o “Morte aos EUA e a quem os apoiar”). Tudo o resto é, para eles, algo de difuso, vago, confuso. Não quero perder tempo com esta tristeza e gosto de pensar que quem os convida para botar opinião é pelo exotismo da coisa, pois de outra forma não se compreende.

Filigrana: Cinzelar, a martelo, no meio de elaboradas elucubrações, referências sobre Gogol, Tolstoi, Bolshoi e o Lago dos Cisnes. Mas, será que essa demonstração de “sabedoria”, fica bem – ou faz sentido – quando se tenta explicar um míssil num centro comercial? Vão por mim: nem fica bem, nem faz sentido.

Genial: No Eixo do mal, Clara Ferreira Alves tem alternado entre o apocalipse nuclear, a fome generalizada, o terrorismo à solta e outras tragédias. Mas, muda com as semanas: ora ganha a Ucrânia, ora a Rússia. Ora Boris – o inglês – é a salvação da Europa, ora é um palhaço que não sabe calçar os sapatos. Chegou a dizer que, com Trump, Putin não fazia isto (o que é desconhecer em absoluto a história americana uma vez que os republicanos não gostam de se meter em alhadas no velho continente) como já disse que Biden é que sabe o que está a fazer. Honra seja feita aos outros 3 comentadores que se têm mantido coerentes. Em particular – e para minha surpresa – Daniel Oliveira.

Já Sousa Tavares, no Expresso, acredita que ter opinião diferente é ser mais inteligente. Olhe que nem sempre, Sr. Dr. Acredite: nem o mundo vai acabar, nem o Putin tem razão. Se se der ao trabalho de ler “Os Séculos Otomanos” de Lorde Kinross, tenderá a perceber que não foi o Krutchev numa bebedeira que “deu” a Crimeia à Ucrânia.  Noutra página, do mesmo jornal, Henrique Raposo (que enganou, com mestria e durante bastante tempo, o mundo conservador português) entre bombas atómicas e “tratados” sobre a morte em casa (que, como se sabe, faz muita falta em qualquer lar) vai avisando da chegada do Armageddon. Já agora: Presumo que a relação dos jovens ucranianos com a ceifeira da vida, passa a ser muito mais descontraída. Vá lá que a SIC vai mantendo no ar, José Milhazes e Nuno Rogeiro. Para infelicidade de todos nós, continuam a convidar um tal de Guerreiro, 1º nome Alexandre.

História: Entre os peritos da referência histórica, estão aqueles que foram ler uns resumos de escritores russos, umas histórias abreviadas e aqui vai disto: “já no tempo do Czar…”; “O povo russo é assim…”; “estão habituados…”. Fora deste propósito, mas no estilo, lembro-me de alguém ter afirmado que é bem feito que ocorram incêndios em Portugal, porque ninguém nos mandou plantar eucaliptos (tal como ninguém mandou a Ucrânia querer aderir à NATO).

Estudar o passado, não significa desculpar o presente. Pode e deve significar a forma de evitar situações análogas no futuro, mas é apenas verborreia quando os acontecimentos já estão em andamento. Versailles já era letra morta quando o Cabo mandou invadir a Polónia. Aos historiadores amadores, sugiro a audição do “Conversas à quinta” e de “O resto é história”. Ou então, ler. Muito. O problema é que dá trabalho e consome tempo. Muito.

Imaginação: Façamos como os russos e avancemos sobre Olivença. Vejamos: 1) Existe uma querela antiga que tem de ver com uns tratados…; 2) Há por lá um nazi (embora digam que é apenas maluco); 3) Uma % da população fala português (é mais uma “algarviada”, mas serve).

Justiça: Nunca será feita. Aos mortos. Aos órfãos. Às viúvas e viúvos. Aos pais que perderam os filhos. Aos milhões de desalojados.

Litigância: Nas guerras, quando já estão em andamento, a meia-tinta, corre – no campo opinativo – a favor do culpado. Se existe uma disputa para ganhar, ou se está num lado, ou no outro. Ao ver quem está no limbo, fico satisfeito – ainda mais – com a companhia que escolhi. São aqueles que não serão acusados de litigância de má-fé.

Militares: Como é óbvio, os russos vão contentar-se com aquilo que conseguirem conquistar e segurar – Uti Possidetis. A Ucrânia, terá de engolir a situação actual se quiser entrar na EU (e quer e precisa). Uma zona desmilitarizada será criada. As teorias, +/- elaboradas, de uns quantos militares que opinam (ou se opinam!) não passam disso mesmo. De opiniões. A minha é esta.

Nazis: Há nazis na Ucrânia? É capaz. Também por cá os há, e, que eu saiba, não dá direito à Espanha de nos invadir (mesmo que essa turba fosse 10% da nossa população). Que tal, como exercício teórico, calçarmos os sapatos dos outros?

Putin: Não é doido. Não actua sozinho. Em Portugal existe a tradição de pessoalizar o mal, como se fosse um só, o culpado de tudo. Não é assim, nem nunca foi. Hitler ganhou eleições com milhões e milhões de votos, em eleições livres e legais. Filósofos e cientistas de renome aderiram ao nazismo, cuja “bíblia” – o Mein Kampf – é um livrinho não muito bem escrito e quase pueril nas suas teorias. O povo alemão gostou e apoiou o ditador e a sua ditadura. Estavam errados e pagaram bem caro esse erro. E, tal aconteceu (o pagarem caro), porque os Aliados não tergiversaram nos propósitos, nos objectivos.

Salazar: É à esquerda – sim, exactamente, mesmo da extrema – que se continua a beber da praxis salazarista da neutralidade.

Zelenski: Pouco me interessa a roupa que veste. Encarnou a Alma ucraniana. Tal qual o povo de que faz parte, não terá uma vida fácil, descansada e longa.