1 Depois de ter recusado os sebastianismos na procura de um líder para o centro-direita, falo agora de ideias — fundamentais em qualquer projeto reformador. Num país economicamente estagnado, sem chama e ambição, com  sucessivas perdas de competitividade e num caminho aparentemente irreparável para fazer companhia à Bulgária e a Eslováquia como os países com menor poder de compra da União Europeia (UE), qualquer programa do centro-direita só pode ter como prioridade promover uma inversão de tal declínio em que o país mergulhou por via da governação socialista em 18 dos últimos 26 anos.

Um programa que tem de concentrar-se na liberdade individual dos cidadãos, nas escolhas e convicções das famílias e no investimento e empreendedorismo das empresas para alcançar o progresso económico e o enriquecimento da população em geral. Tudo para se opor à constante e crescente estatização da sociedade que o Governo de António Costa promoveu desde 2015.

A uma política de mais Estado, de mais impostos, de mais condicionantes à livre iniciativa individual, de mais obstáculos ao livre funcionamento do mercado, de diabolização quase institucionalizada a tudo o que seja capital privado — a tudo isto a direita só pode responder com liberdade, liberdade e liberdade.

2 À direita portuguesa não lhe falta inspiração histórica. Se olharmos para as governações da AD entre 1979 e 1983, de Cavaco Silva entre 1985 e 1995 e de Passos Coelho entre 2011 e 2015 (sim, estou a deixar Durão Barroso propositadamente de fora por falta de resultados), constataremos que a liberdade foi uma matriz e um vetor essencial daqueles executivos.

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A AD de Francisco Sá Carneiro e de Francisco Pinto Balsemão emancipou o país da influência e tutela militar. O PSD de Cavaco Silva reformou o Estado e fez o programa de liberalização da economia mais ousado (e bem sucedido) da história de Portugal, entregando um país em 1995 convergente com a UE e incontornavelmente diferente em inúmeras áreas daquele que Cavaco recebeu em 1985. E a aliança PSD/CDS liderada por Pedro Passos Coelho saneou e recuperou as contas públicas entre 2011 e 2015 para podermos ser livres novamente, sem ter tido oportunidade para aplicar o seu programa reformista num segundo mandato.

São estas as referências para o centro-direita conquistar o poder por via de um novo programa, de novas ideias e de uma nova matriz que volte a ter a liberdade económica e social no seu centro.

3Comecemos pela liberdade económica. Numa semana em que Portugal teve luz verde para levantar mais 16,6 mil milhões de euros de apoios europeus, que somam aos 96,1 mil milhões que já tinha recebido entre 1989 e 2013 — o que levou a comissária Elisa Ferreira constatar que “é penoso ver que Portugal, com estes anos todos de apoio, ainda está entre os países atrasados” da UE —, é imperativo ter políticas que levem Portugal a sair da cepa torta.

Não podemos insistir num modelo económico esgotado que promove um crescimento médio anual anémico de 0,5%, ao mesmo tempo que o poder de compra dos portugueses continua a baixar face a UE e a carga fiscal sobre as famílias e empresas a subir de 29% em 1995 para 45% em 2019 — o que faz com o Estado tenha cobrado uma média de 4.474 euros por pessoa impostos neste último ano, o valor mais elevado de sempre a preços constantes.

Se a ideologia consiste em dar uma fórmula de determinadas ideias para o melhor governo da comunidade, o centro-direita tem de ter como desígnio alcançar a média do poder de compra da UE através de políticas que façam com que um português tenha o mesmo rendimento (em termos de paridade de poder de compra) que um francês, um finlandês, um belga, um irlandês e mais seis países que estão acima da média europeia.

Como?

Em primeiro lugar, a carga fiscal para as famílias (IRS) e para as empresas (IRC) tem de descer para níveis competitivos a nível internacional. Não é sustentável que um cidadão de classe média entregue quase ou mais de 50% dos seus rendimentos ao Estado (IRS + Segurança Social) e não consiga marcar em tempo útil uma consulta médica básica no Serviço Nacional de Saúde, arrisque processos burocráticos morosos e ineficientes em boa parte das interações que tem com o Estado ou não saiba se terá uma pensão minimamente proporcional ao que entregou à Segurança Social ao longo da sua vida. São apenas três exemplos entre muitas outras falhas de um Estado que se limita a consumir recursos das famílias e das empresas sem lhes dar uma perspetiva de futuro e de progresso.

E aqui é tempo de olharmos para os sistemas fiscais de países como a Letónia, Estónia ou Lituânia — em que imperam os sistemas fiscais assentes numa flat rate. Isto é, todos os cidadãos pagam a mesma taxa de IRS (regra geral, algo entre os 15% e os 20%) independentemente dos seus rendimentos. E isso gera uma grande prova de confiança dos cidadãos no sistema fiscal e o cumprimento das respetivas obrigações.

Por outro lado, está mais do que provado em termos de ciência económica que uma descida impostos leva inevitavelmente a um aumento do investimento das empresas e do consumo ou poupança dos cidadãos. E até ao crescimento da receita fiscal — como bem confirmou o acordo entre Passos Coelho e António José Seguro em 2013 para descer o IRC.

Refira-se, por último, que a ideia do G7 de impor uma taxa global 15% em cada país para as multinacionais tecnológicas ajuda a perceber como o nosso sistema fiscal para as empresas não é competitivo.

Aliado a uma descida de impostos para as empresas tem de estar uma política coerente, flexível e integrada para o mercado laboral. Porquê? Porque esta é uma combinação muito eficiente para conseguir atrair investimento direto estrangeiro. Quanto mais flexível for a legislação laboral, maior será a capacidade de atração para um investidor — e maior será a rotatividade no mercado de trabalho.

4 Para que tal descida significativa de impostos (incluindo taxas e de taxinhas) surta efeito de forma sustentada, é necessário que mesma implique uma reestruturação do Estado e consequente baixa da despesa pública. Quanto maior for o Estado, maior necessidade incessante de receitas anuais terá.

Veja-se o caso da subida do número de funcionários públicos que se verifica anualmente desde 2015. Os dados oficiais indicam que no primeiro trimestre de 2021, o número total é de 725.775 trabalhadores. Isto é, uma subida de três por cento em termos homólogos e a maior de sempre.

Só para termos uma noção comparativa: temos pouco mais de 2.000 trabalhadores face a 2011 e cerca de 5,7 mil funcionários a mais do que em 2005. Ou seja, já estamos muito perto de regressarmos ao ponto mais alto do emprego público desde que há registos. Se queremos umas finanças públicas saudáveis que sejam compatíveis com baixas de impostos, temos de diminuir igualmente a despesa estrutural gerada pela contratação de funcionários.

Outro exemplo passa pela Segurança Social — uma área que a esquerda se recusa a reformar, metendo a cabeça de avestruz na areia. Em nome de uma solidariedade inter-geracional, é fundamental reformar o sistema e os benefícios existentes. Basta atentar nesta conclusão de um estudo da Comissão Europeia para percebermos quão urgente é o tema: daqui a 20 anos, o valor médio das pensões cai para metade do valor.

Sendo o plafonamento — que já existe há muitos anos em Espanha e noutros países com sucesso — uma medida que só deve ser aplicada em tempos de crescimento económico, os próximos anos serão certamente uma oportunidade para tentar aplicar uma medida que permite potenciar a liberdade de escolha dos cidadãos e, ao mesmo tempo, dar alguma racionalidade económica a um sistema falido. Tudo para evitar que os mais jovens hoje venham a receber amanhã uma reforma de 40% do seu último salário.

5 “Uma região aberta, livre e segura que não quer tutelar e proibir os seus cidadãos mas sim acompanhar as suas próprias aspirações e estar ao lado em momentos difíceis”, através de “uma política económica assente na baixa de impostos como garantia de crescimento e prosperidade (…), na promoção da poupança e do investimento das famílias e das empresas, por ser esse o motor autêntico do crescimento económico.”

Esta foi uma das ideias fortes do programa da candidatura de Isabel Ayuso (PP) para as recentes eleições da Comunidade de Madrid. E é certamente outra das boas inspirações para a direita portuguesa. Nem que seja pelos resultados obtidos por Ayuso mas também pelos resultados da política económica coerente que o PP tem seguido no governo daquela região espanhola desde os anos 90.

Qual foi o resultado? A resposta está aqui: o PIB per capita em 1995 de Portugal e da Comunidade de Madrid estavam separados por uma pequena diferença de 290 euros favorável ao nosso país; em 2019, os madrilenos têm um PIB per capita de 34.916 euros. Um pouco menos do dobro da riqueza individual dos portugueses.

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