Há, hoje, um grande consenso em torno da igualdade de oportunidades. Os seus defensores dizem que é desejável que as oportunidades sejam iguais para todos, dos mais velhos aos mais novos, dos mais gordos aos mais magros, dos mais altos aos mais baixos.

Até tenho amigos da direita conservadora que acham que a “igualdade de oportunidades, à ‘nascença’ e não imposta, por exemplo por quotas, é um objectivo que a nossa sociedade não pode deixar de ter”. Há outros que defendem que na igualdade de oportunidades “o que importa não é que o ponto de partida seja igual mas que o ponto de chegada seja atingível por todos, com base no mérito”.

Estes meus amigos dizem ainda que “defender a igualdade de oportunidades não é ser socialista. O próprio elevador social é um bom exemplo. Uma pessoa deve poder subir pelo seu esforço e não ficar pobre apenas porque nasceu pobre”.

Eu digo outra coisa: a igualdade de oportunidades é totalmente indesejável. Desejável é haver diferentes oportunidades porque sinaliza sociedades dinâmicas e “efervescentes”, onde cada pessoa pode realizar os seus sonhos de uma forma honrada, através do mérito, do esforço e da dedicação.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Por isso, a prioridade da sociedade deve ir no sentido de haver mais oportunidades para os que têm poucas, como John Stuart Mill defendia, e não para que haja as mesmas oportunidades para todos.

Para defender a minha dama vou tentar argumentar que há aqui uma grande confusão de ideias. A igualdade de oportunidades é dificilmente defensável para quem não seja um igualitário radical, e por isso acho que os meus amigos da direita conservadora andam um pouco iludidos relativamente a esta questão. A um defensor intransigente da igualdade chama-se habitualmente “socialista” e não “conservador de direita”.

É fácil provar porquê, e para isso vou usar um exemplo e um argumento que envolve temas polémicos da moda do politicamente correcto como a igualdade de género e salários de mulheres e homens.

Há algumas semanas, numa reunião do Conselho Económico e Social em que participei, houve um conselheiro que teve a “ousadia” de comentar que o texto de um parecer estava errado uma vez que referia que da maior igualdade de género resultaria maior crescimento económico. Ouvido isto, logo uma “luminária” brandiu “centenas de estudos científicos” que supostamente o provariam.

O que aquela “luminária” não percebe é que todos esses estudos sofrem da falácia da composição. Se há mais mulheres a trabalhar, e se os salários aumentam para o nível dos salários masculinos, temos mais igualdade e o efeito no crescimento é positivo. Mas se houver menos homens a trabalhar e se os seus salários diminuírem para o nível salarial das mulheres, também temos mais igualdade mas o efeito no crescimento é negativo.

A consequência lógica deste exemplo é que maior igualdade não conduz necessariamente a maior crescimento económico. A única afirmação que é verdadeira é que haver mais pessoas a trabalhar e com maiores salários resulta em maior crescimento económico, independentemente de qual seja o seu sexo. Mas a verdade nunca foi muito importante para os radicais, que até fazem gáudio em desconstrui-la e em tentar relativizá-la.

A igualdade de oportunidades é análoga. Teoricamente é possível alcançá-la se os que têm menos oportunidades passarem a ter mais ou se os que têm mais oportunidades passarem a ter menos. O problema é que enquanto a primeira parte da frase é consensual, a segunda apenas é desejada pelos radicais igualitários. Na prática, para haver igualdade de oportunidades é necessário que as duas aconteçam em simultâneo. Ou seja, o argumento a favor da igualdade de oportunidades implica a defesa da redução de oportunidades para os que têm mais.

Por isso, a resposta à pergunta explícita no título deste artigo só pode ser uma: a igualdade de oportunidades não é desejável – é até uma utopia muito perigosa para a liberdade -, o que é desejável e o que devemos querer é que haja mais oportunidades para todos, e especialmente para os que têm menos, o que é uma coisa fundamentalmente diferente.

Um exemplo ajuda a perceber porquê. Paulo Azevedo, que era filho do falecido Belmiro de Azevedo e que eu não conheço, terá sensivelmente a minha idade. Tivemos iguais oportunidades ao longo da vida? Não. Paulo Azevedo acedeu a coisas que eu não poderia aceder. Por exemplo, estudou numa excelente escola privada de gestão na Suíça, teve acesso aos melhores hospitais em qualquer ponto do mundo e beneficiou do legado do seu pai para as funções que desempenha no grupo Sonae.

Para que eu e todos os da nossa geração pudessem ter as mesmas oportunidades era necessário que as escolas fossem todas iguais, que os hospitais fossem todos iguais e que Paulo Azevedo fosse impedido de receber qualquer legado do seu pai. No limite, seria necessário abolir a propriedade privada e termos um Estado totalitário. O mundo ficava melhor com isso? Evidentemente que não. Paulo Azevedo é mais feliz? Não faço a mínima ideia, nem me interessa particularmente.

O contra-argumento que já deve estar na cabeça do caro leitor é que o exemplo inclui dois “privilegiados”, e por isso não serve. Mas esse é precisamente o ponto. Os meus amigos conservadores deixaram-se capturar pelo discurso “igualitário” ao fazerem uma associação mental entre igualdade de oportunidades e proporcionar mais oportunidades a quem tem poucas. Isso leva-os a defender a redução de oportunidades para os que têm mais, o que me parece bizarro num conservador de direita.

Haver mais oportunidades para os que precisam é desejável, e por isso é muito importante um acesso alargado a serviços de educação ou de saúde, por exemplo. Mas isso não é defender a igualdade de oportunidades e para isso não é preciso dar privilégios a uns em prejuízo de outros, como acontece com as quotas. Porque é isso que a igualdade faz, beneficia uns e prejudica outros, nivelando por baixo e promovendo a mediocridade. E é por isso que não é desejável.

O exemplo serve apenas para comprovar a aberração que é a igualdade de oportunidades. Como Amartya Sen reconhece, as oportunidades podem aumentar para todos sem que se pretenda que sejam iguais. As pessoas têm características diferentes e contextos diferentes. Oportunidades iguais é uma coisa utópica porque irrealizável. Mas também é perigosa porque leva a políticas de nivelamento por baixo.

Haver igualdade de oportunidades implicaria que todos nascêssemos em iguais circunstâncias e com iguais condições, como John Rawls implicitamente defendia. Mas isso é altamente indesejável pois não só obrigaria a que houvesse um ditador centralizador que nos forçasse a estudar numa escola e a usar um hospital do Estado com a qualidade nivelada por baixo, como seria necessário que houvesse um imposto de 100% sobre sucessões e doações, evitando que os pais pudessem deixar qualquer herança aos filhos.

A igualdade de oportunidades seria não só um ataque inaceitável à liberdade das famílias como romperia os vínculos geracionais em que assenta a nossa sociedade, além de representar um enorme desincentivo à criação de prosperidade.

O texto reflecte apenas a opinião do autor