A agressão russa à Ucrânia é uma barbaridade. E não apenas barbaridade, mas também tragédia para o país invadido, desastre para o invasor e infortúnio1 para todos nós. Mas todas as infelicidades, especialmente as alheias, têm pelo menos um aspeto positivo: servir-nos de lição, para crescermos em sabedoria, de modo a evitarmos erros semelhantes. Da tragédia ucraniana podemos tirar alguns ensinamentos pra a nossa vida, regras de prudência2 na relação com chefes & colegas, vizinhos y clientes, sogros & funcionários do aparelho estatal.

Três meses antes da invasão3, a 10 de Novembro de 2021, o Secretário de Estado do governo do vice4 de Obama, Antony Blinken, representando o seu país, assinou um “strategic partnership” com a Ucrânia, que prometia a integração desta na Nato e reconhecia a sua reivindicação sobre a Crimeia. Aqui temos duas possibilidades: ou Bliken, devidamente assessorado, atuou por ignorância, ou quis provocar a Rússia.

Isto, por duas razões bem conhecidas. A primeira é a fobia russa de ter fronteiras com países da otaN. Como todas as fobias, é difícil aos outros compreende-las adequadamente, mas se assumirmos que o Kremlin continua a imaginar intensões imperialistas em Washington & a ver fantasmas semelhantes, poderemos deduzir que o ato reflexo5 que o tal partnership iria causar em Moscovo não seria completamente inimaginável.

A segunda, é de a nação russa considerar o controlo da região norte do Mar Negro como indispensável para a sua sobrevivência. É algo ligeiramente semelhante à Doutrina Monroe nos EUA, e bastante parecido à fobia americana em ter bases soviéticas em Cuba. Mesmo após a desintegração do Império do Mal, com governos amigos em Kiev e a Frota do Mar Negro a operar a partir da Crimeia, a Rússia considerava que mantinha, até há pouco tempo, um mínimo de controlo na região compatível com a sua segurança. Assim, não era de todo imprevisível que a sugestão de que este status quo ira mudar causaria um ataque de nervos em Moscovo. E não só previsível, mas era também um dado adquirido por todos aqueles que ouviram as jeremiadas de George Kennan (1904—2005) a seguir à queda do Muro de Berlim, leram os livros de Zbigniew Brzezinski (1928—2017), ou que tivessem ao menos ouvido falar da avaliação do sentimento russo feita pelo então embaixador em Moscovo (e atual boss da cia), William Burns. Numa missiva de 2008, este escrevia à Secretária de Estado da altura:

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“A entrada da Ucrânia na NATO é a mais brilhante de todas as linhas vermelhas para a elite russa (não apenas para Putin). Em mais de dois anos e meio de conversas com os principais atores russos, de matulões imbecis nos recessos escuros do Kremlin aos críticos liberais mais agudos de Putin, ainda não encontrei ninguém que veja a Ucrânia na Nato como outra coisa senão um desafio direto aos interesses russos. […] A Rússia de hoje responderá [a esse desafio].”

Assim, é natural que, quando a Rússia sentiu que lhe estavam a pisar os calos, tomou isso como provocação e desatou aos pontapés à perna do imperialismo que estava mais a jeito, a Ucrânia. Daqui se segue a primeira lição: quem não quer sarilhos deve evitar chatear os outros. Deve ter cuidado em não lhes pisar os calos, em não os provocar, perceber quais são as suas fobias e evitá-las, e não passar por cima das linhas vermelhas que eles traçam no chão, por absurdas que pareçam. Deve viver & deixar viver.

De notar que não é relevante para a dor russa se Bliken agiu malévola ou imbecilmente. O que nos leva à segunda lição: não é como nós interpretamos o que dizemos e fazemos que é importante para o nosso vizinho ou para empresa concorrente, mas sim como ele, na sua idiossincrasia, interpreta o que nós dizemos e fazemos. Pode ser que, por incrível ignorância, os EUA não pretendessem provocar a Rússia. Mas a Rússia sentiu-se ameaçada por um ato, que ela tinha tornado claro, não toleraria.

O que nos leva à terceira lição: a inconveniência de anunciar publicamente aquilo que não toleramos. Sempre houve, e sempre haverá, uma pequena percentagem de indivíduos disfuncionais para os quais o provocar os outros, os insultar e criar sarilhos lhe dá prazer e é a sua razão de ser. Para estes, saber o que nos irrita, o que nos provoca, é ganhar o dia. Quando sabem o que nos chateia, e quais são as nossas linhas vermelhas, ficam com o poder de determinar quando, e de que modo, nos levarão a fazer aquilo que dissemos faríamos nessas circunstâncias, mesmo que sejam contra os nossos melhores interesses. Por outro lado, quando essa escumalha não sabe o que nos irrita, ficamos com a liberdade de agir, ou não agir, face a uma potencial provocação, e de acordo com o que nos apetecer fazer ou não fazer nessa altura. E teremos do nosso lado o fator surpresa.

Quer isso dizer que temos de tolerar o intolerável? De modo nenhum, apenas que não ganhamos nada em que os outros saibam o que não toleramos. Não os deixando saber, não só reduzimos o risco de nos provocarem por malevolência, mas ficamos com o poder de defender os nossos interesses de modo inesperado, e geralmente por pouco custo. Idealmente, seguindo as regras de engament preconizadas pelos mestres de artes marciais japonesas, do ai-ki-dói ao judo, e que consiste em utilizar, não a nossa, mas a força & energia do provocador contra ele próprio.

Quarta lição: é muito importante escolher com cuidado os nossos vizinhos e amigos. Embora selecionar vizinhos não seja fácil, especialmente para países, não é, para muitos de nós, de todo impossível. Escolher bem amigos, por seu lado, está totalmente na nossa mão, e é essencial para a nossa prosperidade, paz e felicidade—que o digam os militantes no ps/d. É lamentável, mas óbvio, que se temos certo tipo de vizinhos, trazer os nossos amigos siganos6 para casa nos vai criar problemas. Se queremos fazer festas com eles, é melhor que não seja em nossa casa e, preferencialmente, que os vizinhos não saibam. Haverá ocasiões mais apropriadas para lhos dar a conhecer.

Quinta lição: para garantir a paz é necessário preparar para a guerra, e não só preparar para a guerra, mas dar a conhecer que estamos preparados para o que aí vier, seja o que for. Nos últimos anos a Ucrânia tinha feito um esforço notável para modernizar as suas forças armadas e tinha constituído um exército de cerca de 250.000 homens, o terceiro na Europa a seguir à Rússia e à Turquia. As dificuldades russas não são devidas apenas à incompetência dos seus oficiais e falta de preparação dos seus soldados, mas muito especialmente devido à força e ao espírito de missão do exército defensor. O problema, para a Ucrânia, é que Putin não fazia ideia da força nem do corpo nem do espírito das forças armadas ucranianas.

Finalmente, mais uma lição: quando a pancadaria começa, tudo fica muito incerto, nomeadamente acerca de quando & como a coisa vai acabar, de quem sairá vencedor e de quanto lhe custará a vitória. Imagine-se que a Rússia implode de repente e totalmente. Será que ficará deserta? Ou não será antes invadida e ocupada pelos Hunos7? E o que ganharão os países da otaN com os Hunos, em vez de russos, nas suas fronteiras? Se conseguimos por o vizinho chato fora do prédio, será que queremos mesmo que os nossos queridos amigos siganos venham viver para a casa dele?

Mas será mesmo tudo incerto uma vez iniciado o conflito? Não, uma certeza haverá: ambos, vencedores & vencidos, ficarão pior do que se tivessem evitado passar a vias de facto. Assim, sempre que possível, evite provocar, ser mal-entendido, ser provocado, escolha bem com quem se dá, & mostre que está bem preparado para o que der y vier. E, se tudo isto não funcionar, reze a Deus Nosso Senhor para que a coisa não lhe doa muito.

U avtor não segve a graphya du nouo AcoRdo Ørtvgráphyco. Nein a do antygo. Escreue sua vi suaque sponte. #EncuantoNusDeixam

  1. Infortúnio: uma lição, ou sessão de carater-building, quando dele se tem consciência; uma desgraça & desperdício, quando não o sentimos.
  2. Prudência: um vício (às vezes) praticado pelos que não confiam na providência.
  3. Invasão: uma conquista que correu mal e que não se consumou numa anexação; uma oportunidade de ouro, e única, para patriotas atestarem o seu proclamado amor à pátria; momento em que se percebe a fibra dos nossos aliados: no caso ucraniano, o momento definidor da amizade do governo do vice de Obama para com a nação ucraniana foi o seu convite para Volodymyr Zelensky fugir assim que a invasão se iniciou.
  4. Vice: vício, ou certo tipo de abstenções tal como a preguiça é abstenção ao trabalho, a gula a abstenção à saúde cardiovascular (ou à linha, dependendo do sexo), a luxúria a abstenção ao amor e a loquacidade é abstenção, de alguns dos nossos governantes, ao sentido de estado; substituto; os dois significados anteriores complementam-se e são inseparáveis no caso do vice de Obama.
  5. Ato reflexo: reação inata, imediata e involuntária que ocorre na presença de certos estímulos, como quando o sr. prof. Marcelo vê um microfone, ou um gato um rato; segundo o materialismo dialético todos os atos humanos são atos reflexos inatos aos membros de cada classe social, o que explica a escolha automática do privado pelos membros do nosso governo quando têm a possibilidade de usar o sns ou as escolas públicas; elemento constitutivo do livre arbítrio que sustenta as refletidas posições políticas da iliberal, principalmente quando se põe de cocaras na presença do ps/d.
  6. Sigano: membro de uma nação que segue o seu caminho sem chatear8 ninguém, ao contrário de socialistas e du sr. eng. Costa; seguem-no os subsídios e alguns animais domésticos; ser humano que que pertence a um grupo minoritário, mas extenso; pessoa que nos enche o coração de alegre esperança ao nos fazer visionar uma risonha fortuna futura, lendo-nos a sina nos signos, em troco de uma percentagem sobre a fortuna presente, tal como o fazerem u ps e o sr. eng. Costa.
  7. Huno: pessoa simpática, dinâmica & de espírito construtivo que, por onde passa, consegue deixar obra da valia da construída pelu sr. eng. Costa.
  8. Chatear: dar chá a quem prefere café, uma característica de suciedades, guvernos e pulíticos sucialistas.