O ambiente económico é instável e as previsões apontam todas no mesmo sentido: inflação elevada, contração do consumo, subida das taxas de juro, desequilíbrio da cadeia de abastecimento global. Vivemos num cenário de incerteza e navegação à vista. O cenário da pandemia dos últimos anos trouxe enormes mudanças em todos os sectores da sociedade, e o novo normal já ocupou espaço em diversas áreas.

Em períodos de instabilidade económica e, até mesmo, de recessão estamos habituados a cenários de desemprego preocupantes. Mas neste novo normal assistimos agora a uma realidade diferente. Os indicadores não são os ideais, mas em diversos setores de atividade assistimos a fenómenos que correspondem a um quase pleno emprego.

Assim, ainda que o mercado de trabalho funcione com o suposto ajuste da oferta e procura, esse equilíbrio é um novo tipo de equilíbrio, um “novo normal” do mercado de trabalho, esse ainda por descobrir.

Desde logo, os próprios conceitos de “empregador” e “empregado” sofreram alterações tão relevantes, que têm hoje outros significados. Falamos agora, acima de tudo, de relações entre pessoas, com linhas hierárquicas muito mais ténues. Passa a ser critério de escolha as relações entre pessoas, a afinidade, a satisfação pessoal e profissional que se fundem. De uma oportunidade profissional espera-se realização pessoal e bem estar, num ambiente de respeito, empatia, sintonia, partilha de objetivos, sucessos e também as frustrações de cada um.

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Podemos afirmar que o lado da “procura” evoluiu numa direção diferente do lado da “oferta”. A maioria dos “empregadores” não se encontra preparada para responder às expectativas da maioria dos “empregados”. As questões do trabalho remoto e da flexibilidade estão longe de terem encontrado o seu equilíbrio e continuamos no trial-and-error típico dos processos de mudança, que demoram a ser interpretados e aceites por todos nós.

Outra mudança significativa no âmbito do funcionamento do mercado de trabalho a refletir diz respeito à nova noção de prazo, seja ele médio ou longo. A procura de um propósito e da realização pessoal de cada indivíduo é indistinta da realização profissional, ela sobrepõe-se aos objetivos de carreira e muitas vezes ao valor monetário. A noção de seguir uma carreira e crescer nesse cargo está cada vez mais em desuso. O que importa para além da carreira é o gosto pelo que se faz e as condições a ele associadas, o work life integration.

O salário emocional tem ganho preponderância. A noção do bem-estar é um bem mais valorizado do que o cargo e/ou carreira que se tem ou que se pretende seguir. A carreira  continua a existir enquanto caminho, mas pode ter desvios, avanços e recuos, desde que haja satisfação pessoal e paz de espírito no imediato. A resiliência continua a ser um valor partilhado por todos, no entanto, hoje em dia, a resiliência não se confunde com sacrifício no local de trabalho.

Podemos afirmar que o comportamento dos “millennials”, a pandemia e toda a conjuntura económica tem-nos ajudado a desenvolver novas competências ao nível emocional que tanto influenciam a organização do mercado de trabalho, quer do lado da oferta (empregadores) quer da procura (empregados).

Acresce ainda que “em tempos de guerra (de talento) não se limpam armas”, reconhecendo assim que a Guerra de Talento está hoje, mais do que nunca, instalada. Falamos de níveis de concorrência mais elevados, e nem sempre a coopetition (colaboração-competição) sobrevive aos objetivos individuais das organizações. As vantagens da coopetition podem ser imensas e derivam essencialmente do aproveitamento de sinergias em algumas partes do processo, desde logo a capacidade de em conjunto resolver desafios de um setor, ou a recetividade para construir programas ou projetos dos quais todos beneficiam.

No caso concreto dos serviços profissionais qualificados, alguns desafios formativos e até de preconceito (no significado teórico de conceito formado antecipadamente) relativamente ao que é e não é uma profissão, encontrariam seguramente melhor solução se todos remassem no mesmo sentido.

A partilha de informação e tomada de consciência coletiva desta nova realidade também ajudaria seguramente a estabilizar e construir o que virá a ser o novo normal do mercado de trabalho. Fica o orgulho de pertencer a uma geração que assiste e pode contribuir para esta mudança.