Estive a rever o Alemanha-Portugal e acho que já percebi o que correu mal. Ao contrário do que tenho lido, o problema da nossa selecção não é Fernando Santos ser um homem muito conservador. Pelo contrário, o problema é Santos ser muito original. Não estou a falar da sua originalidade enquanto treinador, não tenho os conhecimentos futebolísticos necessários para me pronunciar sobre isso. Sei pouco sobre tácticas, apenas um pouco mais do que é permitido para comentar num daqueles programas de peixeirada clubística.

Quando digo que Fernando Santos é original, refiro-me mesmo à sua personalidade. Como pudemos constatar no Sábado, o seleccionador não gosta de repetir o que já foi feito. Quando, na primeira parte, Santos viu a facilidade com que os alemães trocavam a bola em direcção à nossa baliza, soube que devia alterar a equipa. Sucede que, na quarta-feira anterior, na cerimónia de aprovação do PRR, António Costa tinha-se virado para Ursula von der Leyen e perguntado: “Agora posso ir ao banco?” Depois disso, Fernando Santos não quis ser, no espaço de dias, o segundo líder português que, frente a um alemão, questiona se deve ir ao banco. Quis ser especial. Daí ter demorado tanto a fazer substituições.

É por isso que tenho a certeza que, amanhã, William Carvalho vai ser titular. Fernando Santos podia fazer do jogador o bode expiatório mas, lá está, esta semana já tivemos Fernando Medina a atirar responsabilidades para cima de um funcionário e o seleccionador não vai querer copiar o comportamento fujão do presidente da Câmara. É óbvio que não deixa cair William. Até porque, com aquele peso, quando o fosse levantar podia fazer uma hérnia.

Mas, além de perguntar porque é que Santos não mexeu na equipa contra a Alemanha, devemos é perguntar porque é que a equipa de Santos não se mexeu contra a Alemanha. A resposta é simples: os jogadores mexeram-se pouco porque preferem estar sossegados no mesmo sítio. Parece redundante. E é. Mas explica a atitude no jogo de Sábado. Se tivéssemos ganho aos alemães, o mais provável era acabar o grupo em primeiro. O que implicaria jogar os oitavos-de-final em Bucareste e os quartos-de-final em São Petersburgo. Só depois iríamos para Londres, onde se jogarão as meias-finais e a final. Ora, isso já não é um Euro, é um Interrail. E os nossos jogadores não têm idade para passar o Verão a cirandar pela Europa de Leste como tanques soviéticos à procura de uma revolução.

Uma derrota contra a Alemanha corrige esta maçada, uma vez que, ficando em segundo lugar no grupo, seguimos logo para Londres. É evidente que foi uma estratégia planeada. Só assim se explica termos sofrido 4 golos iguais (5, se contarmos com o que foi anulado). Se os nossos jogadores tivessem mesmo querido ganhar o jogo, tinham reagido. Quando a Alemanha está a asfixiar, toda a gente sabe que é preciso lutar, não vale a pena esperar que se lhes acabe o gás. Se não o fizemos, foi de propósito.

Claro que, para ficar em segundo, é preciso ganhar à França. Mas essa é a parte mais fácil. Para alcançar o resultado pretendido, basta replicar as condições que tivemos há cinco anos, no dia do último jogo da fase de grupos, decisivo para o apuramento. É só preciso arranjar um lago e um repórter da CMTV a enervar Cristiano Ronaldo com perguntas. Ronaldo mantém-se numa forma física impressionante, continuando a marcar como em 2016, a correr como em 2016 e a saltar como em 2016. É natural que a sua capacidade de arremesso de microfones também continue intacta.

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