A 31 de Agosto, passam vinte anos sobre a trágica morte de Lady Di, que alguém teve o mau gosto de cognominar ‘princesa do povo’. Diana Spencer, que foi princesa de Gales pelo seu casamento com o herdeiro da coroa britânica, foi muito querida pelo seu povo, como costuma acontecer com os reis e príncipes das casas reais mas, se não era princesa por nascimento, também não era, como então se fez crer, plebeia.

Uma certa imprensa sensacionalista, muito dada a intrigas palacianas e muito pouco sabedora destas matérias, forjou a lenda de que a primeira mulher do príncipe Carlos seria uma espécie de Cinderela que, por algum encantamento ou bruxedo ainda não explicado, teria tido a imensa fortuna – gata borralheira como era! – de se casar com o futuro monarca do Reino Unido. Para fazer ainda mais comovedor o romance, inventou-se que Diana, por ser plebeia, foi mal recebida pela sogra, a Rainha Isabel II, a bruxa má desta história, que teria sido em parte responsável pela desgraça da infeliz ‘princesa do povo’. À conta deste embuste e da alegada infidelidade conjugal de Carlos, a princesa de Gales passou a ser a heroína popular que, a trágica morte num aparatoso acidente automobilístico – um óbvio atentado inspirado pelos serviços secretos ingleses, ao serviço da Coroa, segundo os mais conspirativos fãs de Diana –, logo elevou à excelsa condição de mártir. Do povo, claro.

Se é verdade que abundam as princesas e até as rainhas plebeias – como Letícia de Espanha, Sónia da Noruega e Sílvia da Suécia – esse não era, decididamente, o caso de Diana que, precisamente por ser da nobreza britânica, era, por direito próprio, Lady, muito antes de ser, pelo seu casamento, princesa de Gales e Alteza Real.

Filha dos oitavos condes Spencer, Lady Di era nobre por três dos seus quatro avós. Por varonia, ou seja pela sua ascendência por linha masculina, era neta e bisneta dos 7º e 6º condes Spencer, respectivamente. A sua avó paterna, Lady Cynthia Eleanor Beatrix Hamilton, era filha dos terceiros duques de Abercorn, que descendiam dos duques de Bedford e de outras famílias titulares do Reino Unido.

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Também por sua ascendência materna, Lady Diana Spencer era, como se costuma dizer, de sangue azul. Sua mãe, Frances Ruth Burke Roche, era filha de Edmund Maurice Burke Roche, 4º barão Fermoy, filho do Honorável James Boothy Burke-Roche, 3º barão Fermoy, e de sua mulher, a baronesa Frances Eleanor Work, e neto paterno do 1º barão Fermoy, Edmund Burke-Roche

Dos quatro avós de Lady Di, a menos nobre era, certamente, a sua avó materna. Com efeito, Ruth Sylvia Gill, era filha de William Smith Gill e de Ruth Littlejohn – um apelido que procede certamente de uma alcunha e que lembra o lendário Robin dos Bosques. Esta linha da sua ascendência é a única que parece ser, efectivamente, popular, pois não constam que tivesse quaisquer pergaminhos nobiliárquicos.

Tal como é apresentada, em Geneall.net, a árvore genealógica de Lady Diana Spencer, pode-se tirar ainda uma curiosa conclusão: três dos seus quatro avós – todos menos a sua avó materna – eram descendentes do primeiro Rei de Portugal, D. Afonso Henriques! Diana também descendia dos reis Guilherme I de Inglaterra; Fernando I de Leão e Castela; Hugo Capeto, tronco da Casa Real francesa; e do imperador Carlos Magno. Para princesa ‘do povo’, convenhamos que não está nada mal!

Quando Diana se divorciou do príncipe Carlos, foi-lhe permitido manter o título de princesa de Gales; Camila, a actual mulher do herdeiro do trono britânico, é apenas duquesa da Cornualha. Contudo, Diana deixou de ser Alteza Real. Embora alguns, como o seu irmão, o actual conde Spencer, tivessem criticado que se lhe tenha retirado este tratamento, a verdade é que não foi um caso único: a duquesa de Windsor, mulher de Eduardo VIII, nunca o teve, mesmo sendo casada com um ex-rei de Inglaterra. A partir do momento em que se divorciou, Diana deveria ter também deixado de ser princesa de Gales, uma vez que o não era por direito próprio, mas apenas por ser mulher do príncipe Carlos, condição essa que, obviamente, cessou com o seu divórcio. Portanto, não só não foi injusta a decisão de lhe retirar o título de Alteza Real como a Rainha foi muito generosa em autorizá-la a permanecer princesa de Gales. Afinal, Isabel II não é assim tão má …

Embora Diana Spencer não fosse, por nascimento, princesa, era de uma família nobre, ao contrário dos cônjuges dos outros filhos da Rainha e do príncipe Filipe. Aliás, nem sequer foi uma excepção na história recente da monarquia britânica: a mãe de Isabel II, Elizabeth Bowes-Lyon, que foi rainha pelo seu casamento com Jorge VI e, depois de enviuvar, rainha-mãe, também não era de família real, mas filha dos 14º condes de Strathmore. As ascendências da rainha-mãe e de Diana são, em termos nobiliárquicos, equivalentes, porventura até com alguma vantagem para a princesa de Gales que, portanto, era menos ‘plebeia’ do que a mãe da Rainha Isabel II, que nunca ninguém jamais ousou considerar como princesa, ou rainha, do povo …

Mais importante do que a nobreza de sangue é a do espírito, que se mede pelas acções e, sobretudo, pela atitude de serviço a Deus e à pátria: ser nobre é, numa palavra, servir. Se o próprio Cristo não desdenhou a sua linhagem, pela qual aliás remotamente descendia do Rei David, cumprindo-se assim uma antiga profecia messiânica, não será despropositado este devaneio genealógico. Não só em abono de Isabel II, tão injustiçada a este propósito, mas também da memória de Diana, embora nem sempre se tenha comportado de acordo com a alteza da sua condição – noblesse oblige!

Portanto, nem princesa, nem do ‘povo’. Mais do povo é Camila, duquesa da Cornualha pelo seu casamento com o príncipe Carlos, não obstante a ascendência nobre da sua mãe, filha dos terceiros barões Ashcombe. Mas, como a actual mulher do príncipe de Gales não é princesa, só poderá vir a ser, quanto muito, ‘duquesa do povo’. Mas isso já são outras histórias…