A esmagadora maioria dos sistemas que aprendemos na escola são os que podemos aplicar estatística e cálculo de probabilidades, porque são esses onde podemos retirar alguma previsibilidade. Não quer dizer que adivinhemos o futuro, isso é o que acontece nos sistemas determinísticos. Aquilo a que chamo previsibilidade são os sistemas onde uma média e um desvio padrão significam alguma coisa. Por exemplo, se me atirar de um 4º andar posso prever que vou morrer porque 95,4% (inventei) das pessoas morrem. Isto dá-nos alguma previsibilidade e quanto mais pessoas se atirarem do 4º andar mais rigorosa é a minha previsão, se isso tivesse alguma utilidade para além de servir de exemplo neste texto. Estes sistemas tão bem-comportados do ponto de vista matemático, correspondem a sistemas que estão próximos daquilo a que se chama de equilíbrio. Se a altura do 4º andar não variar muito e se a composição do corpo humano se mantiver mais ou menos constante, não é complicado dizer que as consequências estarão sempre dentro do mesmo intervalo e x% das pessoas vai mesmo morrer em média. E vamos estar certos.

Mais complicado são os sistemas que evoluem. Sistemas como o cosmos, a biosfera, a economia ou a sociedade humana são sistemas que evoluem no sentido em que, de um instante para o outro, vamos ter um sistema diferente do anterior. Importante é que aquilo que conseguimos medir depende do instante em que estamos a medir e, por isso, é extremamente complicado prever aquilo que vai acontecer porque, em rigor, vamos ter um estado de coisas que nunca aconteceu. Do ponto de vista físico, a história não se repete nunca e não é possível usar o conhecimento do passado para prever o futuro. Sabemos que há um conjunto de “coisas” que não mudam, mas esse conjunto não chega para determinar aquilo que vai acontecer, nem mesmo estatisticamente.

A natureza tem uma forma de resolver o problema, que assume nomes diferentes conforme a disciplina em que estamos mais envolvidos, mas que se resume a obter a melhor solução com os dados que temos. Como não podemos saber o futuro, vamos ter vários caminhos possíveis e a única forma de saber qual o melhor, é percorrer o máximo de caminhos possíveis. Como o sistema evolui, as más escolhas que não permitem ao sistema evoluir são deitadas fora e as boas acabam por prevalecer. O importante é que existam muitos caminhos para seguir e que não esteja um pré-determinado.

Essa é, matematicamente, a explicação do sucesso da democracia e do pluralismo entre nós, humanos. Na verdade, cada um de nós terá a opinião que tiver sobre um dado assunto. Temos todos interesses diferentes, gostos diferentes, maneiras de pensar e de agir diferentes. E é bom que todos tenhamos ideias diferentes quanto ao caminho que todos devemos seguir enquanto agregado humano, numa cidade, num país, num planeta. Cada um de nós terá as suas convicções que influencia os seus vizinhos e, no fim, dos vários caminhos que estavam em jogo, se escolhe um naquele instante. Claro que no instante seguinte o caminho terá que ser outro, razão pela qual elegemos representantes e governantes, para que estes, de acordo com os princípios gerais que nós todos decidimos, possam experimentar o máximo de caminhos possíveis para achar o melhor deles todos. Isto, naquele instante, porque amanhã é outro dia. E, do sucesso das democracias, podemos deduzir também o fracasso dos totalitarismos e de todas as formas de receitas milagrosas para os amanhãs que cantam.

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Em todos estes sistemas, a liberdade de cada um dos componentes é o ponto fundamental. A biosfera é favorecida pela mutação, comunicação e diversidade dos genes que gera um sistema mais resiliente e mais evoluído que o anterior, o mesmo se pode dizer da economia em que o crescimento é favorecido pela inovação, comunicação e diversidade. Daí, também a nossa responsabilidade de trazer o máximo de elementos para estes processos evolutivos que envolvem seres humanos. De exigir que o máximo de pessoas possam vir dar a sua opinião para o processo eleitoral, de ter o máximo de pessoas contribuindo para os processos económicos, de ter o máximo de ideias diferentes. E para que se possam experimentar o maior número de caminhos, isto é, para que possamos ser o mais evoluído possível, precisamos de investir em educação, segurança e saúde. Isto também não será novidade para ninguém. O que pode ser novidade é que a liberdade que estamos a trazer com estes investimentos, não pode ser menor que a liberdade que estamos a tirar aos outros ao pedir-lhes que invistam, o que leva ao equilíbrio difícil entre os impostos e a despesa pública.

Está este tipo a dizer-lhes que a liberdade é o motor da evolução? Não, é mais forte que isso. Este tipo está a dizer-lhes que existe prova matemática de que a liberdade é o motor da evolução. Para que tenham uma ideia de quão avançado está o conhecimento neste campo, várias técnicas de computação usam estes princípios importados da natureza há já algumas décadas e algumas implementam-se com uma dezena de linhas de código de programação. Os matemáticos sabem há décadas que a liberdade nos sistemas evolutivos otimiza o resultado.

Por isso, também deste ponto de vista, não estamos a falar de novidade nenhuma. Onde pode estar a novidade está na forma como nós, seres sociais, eleitores e consumidores, encaramos isto. E, surpreendentemente, a nosso comportamento chega a atingir o absurdo. Vamos à praia no dia de votar, achamos que a nossa opinião não vale nada ou que em nada contribui. Achamos que não temos valor para o processo de evolução porque só contamos um voto. Olhamos com desprezo quem não consegue entrar no processo económico ou fazemos tudo para que haja quem não entre. Levamos os nossos filhos de férias nos dias em que deviam estar na escola porque dá jeito. Preferimos gastar dinheiro numas férias na República Dominicana do que num curso. Todo um conjunto de comportamentos que vai prejudicar o processo de escolha dos vários caminhos, que vai limitar a nossa liberdade e, consequentemente, a dos outros.

Mas, também, pela forma como aceitamos que a nossa liberdade seja constrangida em favor da liberdade dos outros. Como aceitamos que nos impeçam de viajar no nosso transporte, só porque as nossas escolhas políticas não estão de acordo com as escolhas dos operadores desses transportes. Como aceitamos que nos definam o que podemos ou não podemos consumir, só porque alguém tem a espectativa de nos cobrar por isso. Como aceitamos que ideias minoritárias possam prevalecer face às nossas ideias, porque se arranjam esquemas de tomada de poder. Pela forma como protegemos a opinião de um marmanjo bem alimentado que vá para as escadas do parlamento berrar, sem pensar que isso vai contra a opinião da D. Ermelinda que está em Mogadouro e não sai de casa por causa das dores nas articulações. Tudo isso são contributos para que a nossa evolução não se faça. Estamos sempre preocupados com a esquerda ou a direita, que são conceitos absurdos e sem lógica, sem estarmos preocupados em maximizar a nossa liberdade.

Liberdade é o fundamental. E demonstra-se. O resto, deixemos para os que querem ficar para trás.

PhD em Física, Co-Fundador e Partner da Closer