A minha tradicional série de sugestões de leituras para férias começa hoje com três títulos de autores norte-americanos.

A primeira sugestão de leituras consiste em Why Liberalism Failed, de Patrick J. Deneen (Yale University Press, 2108). Receio que a minha opinião sobre este livro possa ser relativamente simples: tem muitas coisas certas, que não são novas; e tem algumas coisas (aparentemente) novas, que são basicamente erradas. Subscrevo inteiramente a cortante crítica que lhe foi dirigida por Marc Plattner na mais recente edição da revista Nova Cidadania (Nº 65, Verão 2018, pp. 34-36).

O que entendo estar certo no livro de Deneen são as clássicas críticas liberais-conservadoras de Edmund Burke e Alexis de Tocqueville aos excessos radicais de um certo ‘liberalismo’ de inspiração jacobina. Essas críticas não são novas e, em meu entender, são basicamente acertadas.

O que está profundamente errado, todavia, é o alargamento dessa crítica à tradição da liberdade. Como recordou oportunamente Lord Quinton, as ideias liberais de John Locke foram em Inglaterra associadas a uma revolução conservadora (1688) contra o absolutismo inovador, enquanto que, em França (1789), “produziram o efeito do álcool em estômago vazio”.

Receio que a ignorância do Professor Patrick Deneen sobre esta distinção fundamental seja reveladora da pobreza a que chegou a educação universitária moderna — que em grande parte se está a tornar refém do imediatismo da cultura televisiva e das redes sociais. A pobreza do argumento de Deneen é um vigoroso alerta contra a pobreza das dicotomias infelizes que estão a crescer alarmantemente na vida política ocidental, nos EUA e na Europa — e que, em meu entender, são sobretudo expressão do empobrecimento da conversação pública nas nossas democracias ocidentais.

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Os dois títulos que recomendo em seguida contém saudáveis argumentos contra a pobreza daquelas dicotomias infelizes. Um vem do centro-esquerda: Anti-Pluralism, The Populist Threat to Liberal Democracy, de William Galston (Yale University Press). Outro vem do centro-direita: Suicide of the West: How the rebirth of tribalism, nationalism and identity politics is destroying American democracy, de Jonah Goldberg (Crown Forum).

Ambos constituem vigorosas críticas à tribalização da vida política ocidental. E ambos apelam à redescoberta da tradição ocidental da liberdade sob a lei. Esta tradição tem estado sob primários ataques de uma esquerda radical obcecada com ‘as culpas do Ocidente’. Mas a tradição da ordeira liberdade ocidental não será restaurada com respostas igualmente primárias de uma direita simetricamente tribal e proteccionista.

Um dos temas que melhor ilustra esta infeliz dicotomia tribal é a oposição entre um feroz anti-patriotismo pós-nacional (tendencialmente à esquerda) e um feroz proteccionismo nacionalista (tendencialmente à direita). Um dos grandes méritos dos livros de Galston e Goldberg é a comum recusa da dicotomia entre patriotismo e cosmopolitismo. Neste ponto (bem como noutros) eles vigorosamente convergem com o espírito de conversação tranquila entre “Patriotismo, Cosmopolitismo e Democracia” que presidiu à 26ª edição do Estoril Political Forum, na semana passada, no Hotel Palácio do Estoril — e onde William Galston proferiu a Palestra Dahendorf precisamente intitulada “Em defesa de um patriotismo razoável”.

Também Goldberg defende um ‘patriotismo razoável’, fundado na soberania dos Parlamentos nacionais. Goldberg e Galston defendem que a democracia tem sede em Parlamentos nacionais que exercem a sua soberania sobre territórios nacionais, com fronteiras definidas e políticas de imigração definidas pelos Parlamentos nacionais. Simultaneamente, ambos defendem uma política de diálogo multilateral e uma ordem internacional fundada em regras — como sempre foi timbre das democracias ocidentais.

Em suma, os livros de Galston e Goldberg poderão fornecer uma compensação civilizada contra a primitiva tribalização do debate político que nos ameaça.