Hoje, ao fim da manhã, acabámos, quase de surpresa, num baloiço. Só mesmo um baloiço. Despretensioso. Feito de troncos de madeira, habilmente cruzados. Onde se podia estar, acompanhado, olhando para o rio, logo abaixo. Enquanto o baloiço ia e vinha. E uma vista (fantástica!) de Coimbra, sobre o rio e a outra margem, nos deixava quase sem jeito, diante de tanta beleza. Há alturas em que a beleza parece tão, meticulosamente, “no lugar”, que as palavras estão a mais. Às vezes, chega, até, a incomodar que tanta beleza seja um acaso da Natureza e não tanto uma “obra de arquitecto”. Pensada, ao pormenor, para nós a usufruirmos e crescermos com ela. E, depois, havia a simplicidade de todo aquele espaço, ali à volta do baloiço, imaginado por alguém para que aqueles momentos não fossem só seus. Que nos ajuda a perceber que um mundo de pessoas que se cuidam, a ponto de cuidarem (até) da beleza, é o mundo que todos queremos uns para os outros. E para os nosso filhos, mais em particular.

Quando saímos, caminhámos alguns minutos em silêncio. Até que, “do nada”, um dos meu filhos, dos mais pequeninos, perguntou: “Mãe, quem é que criou o mundo?” Eu acho que ele entendeu que a beleza é uma dádiva tão preciosa que nos coloca em comunhão uns com os outros — e que só isso traduz a paz — que, à escala da sua idade, isso lhe trouxe o espanto. E que fez com que ele acabasse a perguntar quem teria sido capaz de uma obra monumental (épica, mesmo), como a beleza. Quase como se quisesse agradecer-lha. E em nada, mesmo em nada, parecesse incomodado pela forma como, à escala da beleza que entra por nós adentro, sermos todos pequeninos perante o belo.

Não achei que conseguíssemos dizer-lhe tudo aquilo que talvez ele procurasse saber sobre a criação do mundo. Mas agradeço que não tenha perguntado quem é que o estraga, por falta de cuidados, para as crianças. Aí, não tenho dúvidas, só lhe podíamos responder: somos nós!

Por mais que as perguntas mais preciosas nunca sejam demais, o mais importante será descobrirmos que sempre que não nos cuidamos uns aos outros não estamos à altura da beleza com que o mundo se criou. E, se tivéssemos dúvidas sobre ela, foi só o tempo de chegarmos até a um baloiço, sobre o rio, para a  percebemos melhor. O que faz a diferença sobre a forma como cuidamos uns dos outros não é tanto o jeito como ora somos cuidadosos ora desmazelados e omissos. Ou como “cuidamos” todos uns dos outros, tomando medidas “para a frente e para trás”. O que faz a diferença, diante de tudo aquilo que nos torna pequenos e frágeis, é o modo como, ao olharmos o mundo de um sítio mais alto, percebermos as vezes todas em que não o merecemos nem a ele nem à beleza, sempre que não cuidamos uns dos outros (e dela, claro) como devíamos.

E, depois, o que pode haver de mais mágico do que perguntar a uma mãe quem é que criou o mundo? Como se ela, sobretudo ela, fosse a seu jeito Deus e tivesse a chave de todas as respostas?

Quem, diante das perguntas de uma criança — quando ela nos leva a um sítio de onde se vê mais alto — pode achar que elas são pequeninas e distraídas? Ninguém! Aliás, devíamos — todos! — sentirmo-nos obrigados a “criar o mundo” outra vez, de forma melhor, sempre que uma criança põe os seus porquês ao nosso cuidado. Para merecermos as suas perguntas. E toda a beleza de que, sem elas, nos vamos distraindo. Feliz Dia da Criança!

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