Regressou na sexta-feira à noite à SIC e ao assunto. De alguma coisa serviram as prosas chocadas com o programa da semana passada, que levaram Francisco Louçã a reconhecer agora, e publicamente, a grande fome da Ucrânia. Um crime “do estalinismo”, foi assim que Louçã despejou as responsabilidades no colo do parceiro do lado. É a primeira mentira. Como se alguma vez, em toda a história do comunismo, tivesse havido uma única experiência livre de crimes hediondos; e como se Trotsky, o santinho de Louçã, não tivesse ordenado, por exemplo, o massacre dos marinheiros de Kronstadt.

Mas Francisco Louçã voltou a pegar no assunto e voltou a mentir. Ele insiste que a deputada Aline Beuvink disse que os comunistas comiam crianças. Ela não disse. Ele usou a deputada como exemplo de “extrema direita”, e acrescentou que Aline Beuvink, no momento do vídeo, estava coligada com André Ventura. Ela não estava. As eleições europeias tinham sido em Maio e o PPM, efectivamente, tinha concorrido em coligação com o Chega. Mas Aline Beuvink foi contra esse acordo e fez questão de afirmar a sua posição publicamente, como se vê em vários jornais, logo a partir de Março. E o vídeo que Louçã recortou é de Novembro de 2019, já passados seis meses sobre as eleições. Só neste parágrafo, vão mais duas mentiras e não cheguei à maior de todas.

Francisco Louçã acusou a direita de acreditar e espalhar o mito de que os comunistas comiam crianças, e até foi muito concreto ao imputar esta afirmação ao Salazarismo dos anos 40. Uma mentira imbecil, sobretudo se pensarmos que nos anos 40 já existia informação séria e abundante sobre os horrores soviéticos, até escrita por Trotsky, que o aparelho de propaganda do Estado Novo podia usar (e usou) para combater o comunismo. A cabeça de António Ferro não se distinguia pela ignorância nem pela idiotia.

Eis a quarta mentira, e a maior que Francisco Louçã disse na sexta-feira à noite. A ideia de que “os comunistas comem crianças” nunca foi usada pela direita, em momento algum da história, em ditadura ou em democracia. Nasceu e viveu toda a vida na boca dos comunistas, em modo de graçola sem imaginação, que assim imaginavam caricaturar a direita.

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Com isto chegamos à quinta mentira, e é possível que esta seja a mais repugnante: a palavra “debate”, disparada daquele sorriso torto, ele abrindo os braços e apontando para si mesmo. “Estou aqui, não me furto ao debate”, e era mentira. Não houve debate. Houve só Francisco Louçã, naquele tempo todo de horário nobre, e uma jornalista sem experiência do outro lado de um plástico.

A SIC dá isto a Louçã, talvez nem percebendo (há mais SIC para além daquela jornalista) que a sua escolha e a sua insistência em dar Louçã a milhões de portugueses torna a SIC também responsável pelas misérias que Louçã diz e faz.

Mas há um ponto acima disto tudo. Quem nos protege de Louçã? É a segunda vez que Francisco Louçã, conselheiro de Estado desde que o PS montou a geringonça, usou o poder que tem, e que lhe deram, para atacar uma senhora. Francisco Louçã quis fazer de Aline Beuvink aquilo que ela não é; quis apresentá-la como a mulherzinha estúpida e loira da anedota, dando a entender que a direita dos outros – excepto a da televisão – era toda assim, como a fantasia dele. Louçã foi o líder comunista que não se moveu um milímetro desde os anos 70, comporta-se e pensa exactamente da mesma maneira, com a vantagem de sempre ter tido o mesmo trato azedo e desagradável. Francisco Louçã é inteiramente previsível.