Estamos todos habituados a um discurso, invariavelmente, alarmista sobre a má educação dos adolescentes. Sobre as maneiras que não têm. A forma como, supostamente, não respeitam ninguém. Ou os maus modos com que se dirigem aos pais, às pessoas mais velhas ou aos professores. É claro que, depois, quando estamos numa rotunda e só queremos virar à esquerda, há sempre uma pessoa que, indo numa fila que vira para a direita, não nos deixa passar; “só porque sim”. E quando nós olhamos, para pedirmos que nos ajude, esperando ver um adolescente sem maneiras, damos com um adulto a olhar para o lado, de forma cobarde, como se aquilo tivesse acontecido por acaso. Ainda a imaginar que tudo terá acontecido num dia mau para quem reagiu assim para nós, entramos num sítio público e, quando seguramos a porta para que alguém passe, a regra parece ser passarem, sim, sem sequer agradecerem, sorrirem ou trocarem um olhar breve ou afável. Como se a boa educação fosse uma espécie de fato de cerimónia incompatível com um estar mais casual, por exemplo. Acontece que não estamos a falar de adolescentes. Mas de pessoas que, muitas vezes, têm idade para ser pais deles. A má educação tornou-se tão banal que, de repente, damos por nós a responder da mesma forma. Como se ela representasse uma forma cerimoniosa de estarmos uns com os outros e não um modo de “fazer o bem”, mais vezes.

A mim inquieta-me que se cultive, em “português suave”, a ideia de que a boa educação representará um tique “de direita”. Ou que é, manifestamente, característica das pessoas da província, como se, em relação à boa educação, para cima da Vialonga, nos faltasse a todos alguma educação. É claro que, depois, assiste-se a alguns debates na Casa da Democracia e, de repente, desde a forma como, por vezes,  se falta à verdade, ao modo como se apupa ou, por exemplo, se “atropela” um discurso da oposição com palmadões na mesa, percebe-se que nem os provincianos são tão sub-urbanos como se supõe, nem a má educação parece tão exclusiva dos adolescentes como se diz.

Na verdade, só somos mal educados porque somos egocêntricos. Porque nos achamos melhores que os outros. E porque imaginamos que, por mais que não os conheçamos de lado nenhum — ou, simplesmente, que só nos cruzemos com eles — não precisamos dos “outros” para coisa nenhuma. Mesmo que “sirvam” para aprendermos com eles a sermos melhores. Vendo bem, só somos mal educados porque somos pessoas muito sozinhas. Porque nos educaram para o individualismo. Porque não aprendemos a colocarmo-nos no lugar do “outro”. Porque não aprendemos a escutar. E, por mais que todos perfilhemos o contraditório como a porta para a sabedoria, a dúvida, a diferença, a pergunta ou a crítica são vividas por nós como uma ameaça às nossas convicções. Como se as interpelações não contribuíssem para a síntese de tudo aquilo que aprendemos, uns com os outros, todos os dias. E fossem, pelo contrário, uma afronta que faz da estranheza que se sente, diante daquilo que não se conhece, uma intimidação da qual se ataca ou se foge.

Este artigo é exclusivo para os nossos assinantes: assine agora e beneficie de leitura ilimitada e outras vantagens. Caso já seja assinante inicie aqui a sua sessão. Se pensa que esta mensagem está em erro, contacte o nosso apoio a cliente.