Os dirigentes russos não se cansam de tentar convencer o mundo de que não há maiores “anti-fascistas” e “anti-extremistas” do que eles, mas, na realidade, arriscam-se a repetir o erro de Estaline em relação a Hitler, ao aliar-se a forças da extrema-esquerda e neo-nazis europeias para alegadamente combater a “política de sanções” e a “russofobia” da União Europeia e dos Estados Unidos.

Depois de Marine Le Pen, chegou a vez de Tino Chrupalla, um dos líderes do partido de extrema-direita Alternativa para a Alemanha (AfD), visitar a Rússia à frente de uma delegação do seu partido, a convite da Duma Estatal (Câmara Baixa) do Parlamento Russo, e ser recebido por Serguei Lavrov, ministro russo dos Negócios Estrangeiros.

“Nós e a Alemanha temos muitas questões sobre as quais mantemos posições diferentes, por vezes posições antagónicas, mas, no mundo moderno, isso é uma coisa natural, e a situação, antes de tudo o aumento das ameaças transfronteiriças que são comuns a toda a humanidade, exige precisamente diálogo, procura de equilíbrios de interesses, e não o incentivo do confronto, não as tentativas de dificultar o diálogo” – declarou Lavrov no encontro com Chrupalla.

Dmitri Peskov, porta-voz do Presidente Putin, anunciou com que não está previsto um encontro com o dirigente russo, mas considerou tratar-se de uma “visita muito importante”.

A propaganda oficial também não poupa elogios à AfD. Numa coluna publicada na oficiosa agência Ria-Novosti, o analista político Piotr Akop escreve: a “Alternativa” é verdadeiramente oposição, é até um partido anti-sistema, partido criado a partir das bases e que lançou um desafio a toda a elite política alemã.

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Precisamente por isso chamam-lhe não de extrema-direita, mas xenófobo, extremista e proto-fascista. As autoridades germânicas proibiriam de boa vontade a AfD – e semelhantes apelos soam permanentemente – mas foram obrigadas a limitar-se ao boicote desse partido e a uma feroz campanha para a desacreditar e demonizar. São obrigadas a fazer isso porque a “Alternativa” claro que nada tem nada a ver com o extremismo e porque o partido, na sociedade alemã, goza de um apoio crescente”.

O Kremlin decidiu que o diálogo bilateral é mas fácil com extremistas e xenófobos do que com a chanceler alemã Angela Merkel. As relações entre a Rússia e a Alemanha não atravessam a melhor fase e Moscovo aproveitou a visita de Tino Crupalla para se vingar da afronta que foi o apoio concedido por Angela Merkel a Alexey Navalny, um dos líderes da oposição russa. Este foi vítima de uma tentativa de envenenamento na Rússia e foi transferido para um hospital alemão, onde continua a sua recuperação.

Os dirigentes russos também parecem não depositar grandes esperanças no Presidente francês, Emmanuel Macron, e “fecham os olhos” ao funeral com honras do terrorista checheno Abdouallakh Anzorov que, em Outubro passado, degolou o professor de História Samuel Paty nos subúrbios de Paris. A Europa e o mundo ficaram abalados com a notícia de que Samuel Paty foi degolado por um extremista islâmico de ascendência chechena por ter ousado exibir caricaturas do Profeta Maomé.

O Presidente da Rússia, Vladimir Putin, condenou então o acto terrorista, decisão seguida por Ramzan Kadyrov, terrorista que dirige a Chechénia a mando do Kremlin. Porém, poucos dias depois, Kadyrov atirou as responsabilidades do crime para cima do Presidente Emmanuel Macron e dos franceses que “provocam os muçulmanos”.

Ao contrário da Rússia, a França entrega os cadáveres dos terroristas aos familiares para serem sepultados onde eles quiserem. No dia 5 de Dezembro, o corpo de Anzorov chegou à Chechénia e, no dia seguinte, foi sepultado com honras na aldeia de Chalazhi, terra natal dos seus antepassados onde já existe uma rua com o nome do terrorista. A cerimónia fúnebre decorreu sob o maior dos secretismos e acompanhada por dezenas de polícias. Embora fosse proibido fotografar ou filmar o cortejo fúnebre, na Internet foram publicados vários vídeos onde se vê claramente a última homenagem a Anzorov : (https://ok.ru/video/1882059837787).

Além disso, o canal de televisão público da Chechénia, que não ousa falar sem autorização de Kadyrov, mandou para o ar uma reportagem onde o jornalista afirma que o terrorista não passou de “uma vítima de provocação”, era “um jovem temente a Deus e não se destacava pela agressividade”, mas não conseguiu “dominar os seus sentimentos” devido à “provocação islamofóbica aberta e à pressão nos sentimentos dos crentes”.

A outro órgão de informação russo, o dirigente da aldeia declarou ao jornal Mosovskiy Komsomolets: “Ele é um herói para todo o mundo islâmico. Em França e na Europa, os gays são heróis, aqui não”.

Dmitri Peskov justificou que os canais estatais de televisão apresentam “diferentes pontos de vista sobre o sucedido”, reafirmando que o Kremlin considera a “condenação do assassinato a única posição correcta.  Numa situação tão sensível como esta e tendo em conta o alto nível de controlo dos órgãos de informação pelo regime, é com muita dificuldade que se consegue acreditar na palavras do porta-voz do Kremlin.

Não tenhamos ilusões em relação à política externa do Presidente Putin. Um dos seus principais objectivos é dividir e acabar com a União Europeia com a ajuda de extremistas. É triste constatar, mas parece estar a conseguir.