Leitores que me acompanham há algum tempo por aqui, podem reconhecer este título e pensar: o que é isso? Texto repetido? Não, não é. Este texto é um desabafo, uma explicação e, ao mesmo tempo, um convite. Em novembro de 2017, publiquei o texto “Mulheres Não São Chatas, Mulheres Estão Exaustas” no Observador. Só não sabia que esse texto mudaria completamente a minha vida.

Quando um colunista, no silêncio do cómodo onde escreve (por vezes um silêncio que tem que vir de dentro de nós, abstraindo a obra no prédio ao lado, as crianças que brincam ou as festas e brigas dos vizinhos), pensa nos seus títulos, há um processo curioso. Por vezes, o título é aquele que desejamos. Outras vezes, é aquele que “tem que ser”. Em outras circunstâncias, é o título que julgamos chamar mais atenção. Mas em algumas raras vezes, o título parece cair do céu, sem que saibamos bem narrar seu processo de nascimento.

Acho que esse foi o caso de “Mulheres Não São Chatas, Mulheres Estão Exaustas”. Foram tantas as partilhas e os comentários na comunidade lusófona sobre esse texto, que ele seguiu sua vida sem que eu tivesse muito controlo. O título tornou-se palestra, feita por mim em teatros e dezenas de empresas como Nike, Bayer, Lilly, Panasonic, IBM e XP. Mais tarde, o texto gerou um livro, com o mesmo nome, publicado no Brasil no fim de 2019 e que será lançado pela Cultura Editora daqui a duas semanas (dia 1 de julho) em Portugal.

Essa história de mulheres exaustas começou muito antes da pandemia e eu não fazia ideia que o tema poderia tornar-se ainda mais atual do que já era. No ano passado, milhões de mulheres no mundo inteiro sentiram o peso do mundo cair sobre seus ombros, acumulando trabalho, casa, família, home schooling e mais incontáveis atividades que as fizeram perceber que a tal emancipação feminina era uma falácia – uma vez que as atividades domésticas, os filhos e tantos outros temas reapareceram com responsabilidade quase exclusiva das mulheres na esmagadora maioria dos lares.

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Há solução para o cansaço? Há perspetivas de uma sociedade mais justa? Um dia teremos, de facto, salários iguais aos dos homens? Um dia seremos, de facto, respeitadas profissionalmente como são os homens? Um dia, a partilha das tarefas domésticas será verdadeiramente justa? Um dia seremos efetivamente consideradas por nossas ideias e não pelos nossos corpos? Um dia teremos tempo para cuidar de nós mesmas (incluindo saúde física e mental, e não mera aparência) sem culpa? Um dia pararão de fazer perguntas invasivas sobre nosso planejamento familiar? Um dia estaremos verdadeiramente confortáveis enquanto mulheres?

O meu livro, que já está em pré-venda em Portugal, trata um pouco disso tudo. Mas eu e o Observador achamos que poderíamos ir além. Achamos que esse assunto tornou-se urgente e que muitas mulheres precisam ser ouvidas. Achamos que as mulheres, mundo afora, precisam saber que não são as únicas angustiadas em seus corpos, seus empregos, suas casas, suas lutas, seus relacionamentos-casamentos-separações-solteirices, em suas maternidades-madrasternidades-angústias sobre ter ou não ter filhos. Eu e o Observador quisemos mais.

Na tarde deste sábado, 19 de junho, logo após o noticiário das 14 horas, estreamos o programa “Mulheres Não São Chatas, Mulheres Estão Exaustas” na Rádio Observador, conversando com mulheres maravilhosas, sem filtros e sem medo. Os episódios ficam disponíveis no site do Observador e nas plataformas de podcasts para fazer companhia a homens e mulheres enquanto lavam a louça, locomovem-se de transporte, buscam filhos na escola, correm na rua de manhã ou cozinham o jantar. Sejam muito bem-vindos.