Reconheço que me incomoda quando escuto que o Natal é para as crianças. Eu não acho que aquilo que nos distingue das crianças é que elas acreditem no Pai Natal e nós não. Elas acreditam que no Natal renasce, todos os anos, a família. Elas acreditam na família! E, para muitos de nós, a família inquina-se com aragens de fadiga. Na verdade, celebramos o Natal. Trocamos presentes. Mas trabalhamos para a alienação familiar. E isso não é Natal.

São demais os melindres, as agruras, os mal-entendidos, os ressentimentos ou os pequenos rancores que há em todas as famílias. As fissurasinhas. As miudezas que se anotam. E tudo o mais que representa uma espécie de sinergia silenciosa de pequenas maldades que, pé ante pé, nos fazem desacreditar na família. E nos tornam familiares e estranhos, ao mesmo tempo.

Uma família não alimenta clivagens e fracturas. Uma família tem melindres, birras e “quotas de estupidez”. Mas não promove a separação. Numa família as pessoas não podem não se dar. Ou dar-se mal, que é ainda pior. Porque não dar é um desinteresse em relação ao dar que quem ama não pode ter. Uma família não afunda ressentimentos e, depois, trata-os com prendas como se elas fossem botox com que se escondem as coisas feias. Uma família fala. Não murmura. Resmunga. Mas não ignora. Exagera. Mas não cultiva nem o desamparo nem a indiferença!

A impressão que tenho é que para muitos de nós a família parece ser muito mais um repositório de descuidos, de desamparos e de desinteresses que experiências de comunhão com as quais somos felizes.

Assumamos que não é certo trocarmos prendas enquanto não somos capazes de nos dar. Não é legítimo reclamarmos o bem e fazermos maldades. Não, não é  verdade que tudo está bem quando acaba bem. Tudo está bem quando somos capazes de fazer o bem! E se não somos capazes de dirimir desencontros e ressentimentos não temos qualquer tipo de legitimidade nem de decência para comemorarmos o bem numa festa. Natal é quando não desistimos de estar gratos pela forma como alguém nos quer. Bem!

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