A nossa Constituição consagra, para além de alguns tribunais especializados, duas jurisdições: a judicial e a administrativa, competindo a esta última o julgamento das acções ou recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas e fiscais.

Os tribunais administrativos portugueses, são os mais lentos e ineficientes da União Europeia, só superados nesse admirável índice, pelos tribunais administrativos de Malta, um Estado minúsculo do Mediterrâneo, com 316 Km2 e uma população equivalente ao concelho da Amadora.

O principal problema destes tribunais é o seu âmbito de jurisdição, ou seja, a larguíssima reserva de competência que lhes está destinada. Em termos gerais, praticamente todos os litígios que envolvam o Estado, as Autarquias, as entidades públicas ou equiparadas, têm de ser julgados nos tribunais administrativos.

Na grande maioria desses litígios, há uma grande probabilidade da entidade pública ser condenada, pois habitualmente é ela  a devedora aos particulares  de alguma quantia, é ela a entidade relapsa em actos que não praticou e que lhe é pedido que pratique, ou é o agente do cometimento de actos ilegais que é pedido ao  tribunal que anule.

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Não é preciso muita imaginação para concluir, que o escasso desempenho desses tribunais, seja quase sempre uma óptima noticia para as entidades públicas.

Com a cada vez maior intervenção do Estado em tudo o que mexe na sociedade, claro que aumentaram exponencialmente nos últimos anos, os processos contenciosos que acabam entregues ao julgamento destes tribunais. Para responder a essa procura de decisões em tempo minimamente decente, seria necessário aumentar de modo muito significativo o quadro de juízes, conceder-lhes assessores técnicos e peritos qualificados, equipamentos informáticos de qualidade e instalações condignas. Um investimento que o Estado não está notoriamente interessado em fazer. Esta situação de paralisia, que é um enorme dano para os cidadãos, não constitui – bem pelo contrário — problema algum para o poder político. Não funcionando estes tribunais, muitas contingências e responsabilidades que cada governo, órgão autárquico ou administração de entidade pública vai criando nos seus mandatos, ficam para resolução de quem lhes suceder. Para quê, portanto, preocuparem-se com isso? O último que apague a luz…

É absolutamente normal, dentro da anormalidade em que tudo isto acontece, que uma decisão transitada em julgado na jurisdição administrativa, que condene por exemplo  um determinado Municipio a indemnizar um particular que com ele contratou, seja produzida tão tarde, que só virá a ser cumprida dois ou três mandatos depois daquela presidência da câmara que esteve na origem dessa contingência e desse prejuízo para o orçamento da autarquia. Ou seja, o prevaricador, já há muito tempo que está imune a qualquer sanção eleitoral pelos erros que cometeu.  É a irresponsabilidade total. Por seu turno, com decisões tomadas a esta distância dos factos, o particular lesado e agora com o  seu direito reconhecido, já faliu, já emigrou, já fechou ou já morreu.

Actualmente é de cinco a seis anos em média, o tempo necessário para uma decisão de primeira instância na jurisdição administrativa. Como estamos a falar de uma média, isso significa que alguns processos – os mais complexos e relevantes- podem vegetar dez anos na primeira instância, sem que qualquer sentença seja proferida. Se à decisão, se suceder o recurso da parte vencida, é normal aguardar um tempo semelhante no tribunal superior.

Sentenças nestas condições de atraso, são claramente uma mera justiça formal, que mais não é, que um simulacro de justiça.

Pode continuar-se a enganar os cidadãos, tomando-os por tolos. Mas a verdade é que as pendências acumuladas nos tribunais administrativos já não são pura e simplesmente recuperáveis. Isso só poderia suceder e mesmo assim em largos anos, se novas acções não dessem entrada nesses tribunais.

Tal como no sistema de saúde se encontra previsto, que na impossibilidade de realização de actos médicos ou de diagnóstico necessários em tempo útil, se possa recorrer a instituições particulares, há que encarar a possibilidade de fixar legislativamente, um prazo máximo para a produção de decisões na primeira instância dos tribunais administrativos. Ou seja, sempre que uma acção contenciosa não tenha sentença produzida, por exemplo em cinco anos, qualquer das partes poderia unilateralmente fazer transitar o processo para decisão arbitral, seguindo-se os termos da Lei 63/2011 – Lei da Arbitragem, que é  uma lei da Republica com tanta dignidade, como o é Código do Processo dos Tribunais Administrativos. Seria sensivelmente mais oneroso para as partes em litígio, mas ainda assim, permitiria a obtenção de uma decisão em tempo aceitável, coisa que os tribunais administrativos, simplesmente não são capazes de produzir.

Mesmo em situação pandémica, o nosso sistema de saúde, com todas as suas deficiências e insuficiências, ainda vai salvando vidas todos os dias. Se o Serviço Nacional de Saúde funcionasse como os nossos tribunais administrativos, já estaríamos todos mortos.