Há não muitos anos, as vítimas de acidentes de viação, de trabalho ou de outra génese, viam as companhias de seguros oferecer-lhes valores indemnizatórios no limiar do irrisório. Sendo certo que os valores arbitrados pelos tribunais acabavam por não sair da mesma bitola.

Ou seja, as vítimas viam a vida destruída por causa de um acidente e as indemnizações atribuídas não permitiam, de modo algum, que a sua situação fosse minimamente mitigada.

Bastará pensar que de um acidente pode resultar não só o dano corporal, as sequelas físicas e as dores e sofrimento inerentes, mas o termo prematuro de uma promissora carreira profissional, com a frustração dos ganhos que, ao longo de uma vida, seriam expectáveis.

À presente data, já assim não é. Tem vindo a ser debelada na justiça, e bem, a pecha das indemnizações miseráveis.

Apesar da constante e positiva evolução que se tem notado na justiça portuguesa, e neste ponto em concreto, o mundo judiciário continua atormentado por uma recorrente insatisfação da sociedade com a justiça e os tribunais que tolda o facto de a justiça ser, hoje em dia, mais próxima e mais humana.

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Um primeiro passo foi dado a nível legislativo, já em 2008, com a publicação de uma portaria que, a partir de tabelas e fórmulas de cálculo, previa valores tidos como razoáveis para a indemnização por dano corporal em caso de acidente de viação e que os tribunais passaram a ter por referência, ainda que não vinculativa.

Tabelas e fórmulas que, apesar da meritória intenção do legislador, não chegavam ainda a valores verdadeiramente justos.

Por isso é que um segundo e mais marcante passo tem vindo a ser dado desde tempos mais recentes, com o inculcar nos tribunais de uma interpretação das tabelas da portaria à luz de critérios de razoabilidade, permitindo calcular valores que, efetivamente, vêm permitir à vítima ter uma vida financeira semelhante à que teria tido se não fosse o acidente.

Em muitos casos, indemnizações que antes se computariam em milhares ou dezenas de milhar de euros têm vindo a ser fixadas na casa das centenas de milhar. Não são indemnizações desproporcionadas, como se vê noutros sistemas jurídicos, nem tal seria desejável, mas sim compensações equitativas e, acima de tudo, justas. Valores que asseguram à vítima as condições para uma vida mais aproximada daquela que teriam se não houvesse ocorrido o acidente.

Neste campo, o sistema judicial português tem vindo a fazer inteira e sã justiça. O que é preciso é assegurar que a sociedade assim o reconheça e entenda. E assegurar que as vítimas não se deixam levar pelo conformismo e têm a iniciativa e a sagacidade de reclamar e defender o direito que é seu, e que, as mais das vezes, vai muito além dos valores das propostas que lhes são apresentadas. São os tribunais quem faz a justiça, mas a iniciativa de a pedir é de cada um.