O título não está exactamente correcto. De facto, os pensionistas não elegeram sozinhos os deputados do Partido Socialista, mas todas as análises efectuadas às transferências de voto nas últimas eleições são consensuais, no sentido que foi a transferência de voto de muitos pensionistas habituais eleitores do PCP – zangados com o chumbo do orçamento – e de pensionistas habituais eleitores do PSD, em cujos ouvidos ainda zumbe a infeliz e inútil frase do “ir além da troika”, que o PS, se não deve a vitória, deve seguramente a maioria absoluta.

As últimas eleições tiveram lugar numa época não inflacionista e numa altura em que acabávamos de sair da constrangedora pandemia, graças à acção decisiva de um comandante da Armada.

A simples ideia que o regresso ao poder de outra solução governativa que não fosse o Partido Socialista era uma espécie de pesadelo para os pensionistas, pois pelo menos com os socialistas lá viriam os habituais aumentos de 10 euros mensais, que tanto jeito dão para os remédios. Bom, acontece que veio a inflação e os habituais 10 euros só servem agora para que os medicamentos fiquem na farmácia e não no bolso dos pensionistas.

Perante a inflação, como medida para compensar a base do seu eleitorado, que é maioritariamente constituída pelos pensionistas e outros restantes dependentes do Estado, o governo decidiu entregar antecipadamente um bónus de meia pensão em Outubro, o qual, feitas os cálculos pelos especialistas em contas, vai resultar numa perda efectiva de rendimento em 2023 e ainda maior em 2024.

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O governo também decidiu entregar a cada cidadão um cheque de 125 euros, desde que o seu rendimento não ultrapasse os 37.800 Euros anuais brutos, isto é, antes de impostos e taxas obrigatórias. Mais simplesmente, 2.700 euros brutos mensais x 14 meses.

Claro que o Governo fala sempre de rendimentos brutos e não rendimentos líquidos de impostos e taxas.

Ora, esquece-se de levar em conta que a taxa de retenção para IRS de quem aufere 2.700 euros mensais é de 24,8%, ou seja, só por essa via, o Estado retira em cada mês 661,50 euros só para IRS. Melhor visto, quem ganha 2.700 euros mensais, entrega ao Estado em retenções perto de 9.260 euros por ano. Oferecer a estes cidadãos 125 euros num determinado mês, é fazer-lhe um desconto no IRS de 1,3%, repito 1,3%, daquilo que obrigatoriamente esse contribuinte entrega ao Estado em 2022.

Falta ainda deduzir no rendimento bruto de 2.700 euros mensais, 11,5% no vencimento como desconto para segurança social.

Ou seja, quem em Portugal tem um vencimento de 2.700 Euros mensais, leva para casa 1.729 Euros (2.700 – 661 – 310) em 14 meses.

Mas se alguém entender que 2.700 euros é um vencimento suficientemente alto para ser merecedor de tal amplitude de descontos, vejamos então o que se passará com quem recebe perto de metade disso, ou seja quem aufere um vencimento de 1.400 euros mensais.

Neste caso, a taxa de retenção para IRS de quem aufere 1.400 euros mensais é de 15,2%, ou seja, o Estado retira-lhe em cada mês 213 euros só para IRS. Daqui resulta que quem ganha 1400 euros mensais, entrega ao Estado em retenções, 2.982 Euros por ano. Oferecer a estes cidadãos 125 Euros num mês, é fazer-lhe um desconto no IRS de 4%, repito 4%,daquilo que obrigatoriamente esse contribuinte entregará ao Estado em 2022.

A este trabalhador também será deduzido no rendimento bruto auferido de 1400 euros mensais, 11,5% no vencimento como desconto para segurança social.

Desta realidade, essa coisa tão incomodativa, resulta que quem aufere um vencimento de 1.400 Euros mensais, leva para casa 1.026 euros (1400 -213 -161) em 14 meses.

Portanto, aquilo que o governo classifica com classe média, vive com vencimentos líquidos de impostos e taxas, entre 1.026 e 1.729 Euros.

Felizmente que em Portugal temos um serviço nacional de saúde excelente, que nos dispensa de pagar seguros de saúde privados, as creches são gratuitas e têm vagas para todos, incluindo a classe média, as rendas de casa são ao preço da Albânia e a energia eléctrica apesar ser tributada com um IVA de 23%, é das mais baratas do mundo, porque – é um segredo de Estado – afinal até somos produtores de petróleo.

Se não fossem estas benesses, como é que conseguiríamos viver com estes rendimentos?