A inflação será, muito provavelmente, uma das palavras do ano de 2022. É verdade que não se trata de um conceito novo, mas este fenómeno de inflação elevada e persistente é, de facto, algo que não estava presente nos processos de tomada de decisão recentes. Importa, portanto, saber de que forma é que pode impactar o modelo de negócio das seguradoras e, consequentemente, como se deve olhar estrategicamente a abordagem ao mercado segurador.

Estes níveis de inflação e o respetivo caráter de persistência apanharam todos de surpresa. Nenhum cenário macroeconómico no final de 2021, e mesmo início de 2022, conseguiria perspetivar os atuais níveis de inflação, que só encontram alguma semelhança no ano de 1992, quando atingiu os 9,6%. Desde então, a média tem estado nos 2,6%. Em dezembro de 2021, por exemplo, a inflação média perspetivada para 2022 pelo Banco de Portugal (BdP) era de 1,8%, já contando com uma subida dos custos de energia (fenómeno já identificado e em consolidação).

A realidade é que a inflação não se deve apenas aos custos energéticos, à guerra ou às alterações geopolíticas, mas a um conjunto alargado de fatores de certa forma interligados, que potenciam o que cada um aporta individualmente. Por outro lado, a perspetiva futura, dada a incerteza, vai no sentido de podermos estar perante um cenário de recessão, com todos os impactos negativos que trará para a globalidade dos agentes económicos.

Consequências no mercado segurador

A resposta de política monetária mais visível no atual contexto tem sido o aumento das taxas de juro e, embora esta, de forma isolada, possa ser vantajosa para as seguradoras – que, por excelência, são investidores financeiros –, a verdade é que estas ainda não estão a recolher os benefícios desta situação.

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O que já se está a manifestar negativamente do lado das seguradoras são os sinistros e as indemnizações em tudo o que são ramos expostos a gastos médicos (saúde e acidentes); custos materiais, peças e complementos (património, automóvel, responsabilidades); aumento de salários (transversal) ou períodos mais longos de substituição de peças ou património ou de reembolso de faturação.

Neste contexto e a um muito curto prazo, as seguradoras vão, certamente, adequar as suas políticas de subscrição, o que se traduzirá numa revisão das tarifas e num aumento dos standards de seleção de risco. Algo que assume um relevo especial nesta altura do ano, visto que a maioria do mercado português vai entrar em fase de renovação de portefólio de seguros nos próximos meses.

Existem duas formas de olhar para esta situação do lado do cliente corporativo.

Numa perspetiva minimalista calibrar as suas apólices, designadamente ao nível de capitais seguros e períodos temporários, para garantir que a apólice indemniza corretamente o risco do seu património físico (especial foco nas apólices de Danos Materiais e cobertura de Perdas de Exploração). Por outro lado, atualizar os limites de indemnização contratados, de forma a precaverem também o impacto da inflação (por exemplo RC Exploração, Responsabilidade Ambiental, etc.)

Uma perspetiva mais estratégica, particularmente num contexto de volatilidade, recomenda, no entanto, alinhar o investimento em mitigação (tratamento e controlo) e transferência de risco (apólices) com os objetivos de sustentabilidade e criação de valor da Organização.

As empresas devem fazer uma espécie de viagem pela gestão de risco no sentido de diminuir a sua dependência do mercado segurador; e ganhar armas no sentido de diferenciarem o seu risco.

A negociação das apólices de seguros não pode ser, e por força das circunstâncias não será, uma realidade estática, como temos estado habituados a ver. O contexto vai ser necessariamente mais volátil e o que conseguimos negociar este ano, pode não estar disponível no ano seguinte, o que obriga as organizações a gerirem risco de maneira contínua e sustentada a médio longo prazo.