Desde que começou a saga do tenista “não vacinado” Novak Djokovic, e inspirada nas tão profundas reflexões do meu amigo Mário Rosa sobre o filme magistral de Terrence Malick,  Uma vida escondida, só me vem à memória a comparação entre os dois homens, salvaguardando as óbvias diferenças.

Um, aquele que o filme retrata, é totalmente leal ao agir concordantemente e sem qualquer cedência à verdade que a sua consciência lhe dita. O outro, o tenista, tenta ainda assim contornar o obstáculo. Mas não o conseguindo, também ele vai manter a sua posição até às últimas consequências, ficando de fora de um campeonato com uma importância fulcral para a sua carreira.

Não tecerei aqui as considerações que merecia a ligação entre estes dois casos. Seriam longas e talvez nem fossem lidas, para além de que, muito provavelmente, não seria capaz de exprimir com a exactidão merecida essa comparação.

Tentarei apenas exprimir aquilo que mais me tocou – a semelhança entre os dois no que concerne à consciência. Em ambos os casos, os protagonistas foram impedidos por uma maioria de serem fiéis às suas convicções. Uma vida escondida, ou uma vida a esconder-se? Participar num campeonato, ou esconder o que o pode impedir?

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Tanto num caso como no outro, a ignorância – essa mãe de todas as desculpas – relativamente ao que estaria em jogo poderia ter sido evocada como pretexto para seguirem a maioria. Mas não foi. A essa mesma desculpa não recorreu também o filósofo Robert Spaemann no momento em que recusou, igualmente, jurar fidelidade a Hitler. Quando, muito tempo depois, lhe perguntaram como se deu conta, respondeu: “fiz apenas algumas perguntas”. Talvez as mesmas “algumas perguntas” que hoje se põem, de novo, no contexto que estamos a viver.

Franz Jägerstätter foi o único habitante da sua aldeia que votou contra a anexação da Áustria pela Alemanha. Mal tratado por todos os vizinhos em razão da fidelidade à sua consciência, teve de sofrer a ditadura da opinião pública por causa de uma atitude moral que hoje é considerada básica, elementar. Nem o Bispo da diocese, nem o sacerdote da aldeia estiveram à altura deste simples fiel. O mesmo se passa com o tenista, que representa aqui os chamados (e muito mal chamados!) negacionistas.

Cristo morreu pela resposta a uma simples pergunta: «Conjuro-te pelo Deus vivo que nos digas se tu és o Cristo, o Filho de Deus» (Mt 26, 63). Poderia ter dito que não. E não haveria morte. Franz Jägerstätter (a personagem central do filme) poderia, também ele, ter assinado o papel que lhe deu o advogado – «são apenas palavras» – e teria ficado em paz. Preferiu a guilhotina. Novak poderia ter-se vacinado e iria ao encontro do sucesso. Alguém, hoje em dia, acha que vale a pena morrer pela verdade? Todos nós somos Pilatos e gostamos de responder: o que é a verdade? (Jo, 18, 38).

No filme de Terrence Malick, podemos ouvir um pensamento desconcertante: “Chegará o dia em que os homens serão tão inteligentes que não combaterão mais a verdade, irão simplesmente ignorá-la”… Esta afirmação não nos choca. Também a lemos nos futuros distópicos do 1984 e do Admirável Mundo Novo. Ou nos totalitarismos do passado. Só não toleramos que seja esse o nosso tempo. O nosso presente, a nossa “querida”opinião pública, nunca erra. Só o passado foi monstruoso.

Temos assim reunidas as condições para novas perseguições e novos massacres!