Para muitas pessoas e famílias as férias acabaram. Regressaram as preocupações profissionais, as filas de trânsito, a azáfama para comprar os materiais escolares para os filhos, a desesperança perante mais um ano de trabalho árduo pela frente. É como se estivéssemos condenados: acabaram as férias, vêm aí maus tempos.

Não raras vezes vemos a imprensa a referir-se à depressão pós-férias. A depressão pós-férias não existe. Estarmos preocupados, porventura tristes, ou mesmo algo apreensivos perante o que nos espera, não são critérios que por si configurem um quadro depressivo. Mais ainda, o facto de estarmos pouco receptivos a regressar a rotinas difíceis ou perspectivarmos momentos de dificuldade, não significa que estejamos condenados ao mal-estar.

Vejamos algumas razões que nos permitem estar confiantes e enquadrar esta época do ano de forma positiva. Voltarmos às nossas rotinas profissionais e pessoais dá-nos sentido à vida. Muitas vezes estamos menos satisfeitos com situações de trabalho, queremos novos desafios profissionais, mas o trabalho é em si mesmo terapêutico. Obriga-nos a colocar metas, projeta-nos no futuro, e contribui para estarmos motivados a trilhar novos caminhos. O trabalho funciona como um lokomotiv. Faz-nos avançar. Para muitas pessoas é o espaço onde conseguem explanar alguns dos seus interesses e características pessoais.

Se por um lado é difícil fazer face aos desafios escolares dos filhos, é importante não esquecer como o regresso às aulas é também um retorno a rotinas importantes para os jovens. É certo que estamos perante múltiplas adversidades, mas os “miúdos voltarem à escola” significa também que estamos a ajudá-los a crescer e a assumirem as suas responsabilidades. Aos pais, contribui para um sentimento de realização. Sabem que estão a dar as ferramentas aos filhos para estes virem a ser adultos autónomos e capazes. A escola é lugar de crescimento.

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A nível individual é importante não esquecer que temos imensas capacidades. Somos muito resilientes, ou seja, somos capazes de nos adaptar a contextos de adversidade e a situações de risco. A capacidade de superação é imensa. Não raras vezes, apercebemo-nos das nossas aptidões, exatamente perante as adversidades. A superação mostra-nos como somos capazes de aguentar situações difíceis, conseguimos ser emocionalmente resistentes, e encontramos forças por vezes até desconhecidas para nós próprios.

Mudar de perspectiva ajuda muito. É importante recordar que, muitas vezes, mudar a perspectiva sobre um mesmo assunto faz-nos viver e sentir de forma completamente diferente esse mesmo assunto. Recomeçar o ano de trabalho também nos ajuda a colocar novas metas pessoais. Muitas vezes servimo-nos desta altura do ano para recomeçar ideias antigas ou mesmo para darmos início a novos projectos. Significa tudo isto que estamos perante um mundo de facilidades no regresso de férias? Claro que não. Significa apenas que existem também vantagens neste regresso e que não nos devemos esquecer das imensas capacidades que temos para lidar com a vida e com o mundo.

Daniel Sousa é diretor da clínica ISPA