Encontrei o Ferreira no meio de uma massa humana de falantes brasileiros, numa cidade do norte de Portugal. Ficou feliz de me ver e, sem que eu pudesse evitar, deu-me um aperto de mão e um grande abraço. Perguntei-lhe pela saúde e arrependi-me. Olhando-me muito sério, disse-me: tenho um problema! Corrigiu de imediato para: não sou eu!, a minha mulher é que tem!, para de seguida concluir, ou seja, se ela tem um problema, eu é que tenho o problema maior! Apeteceu-me fugir, mas dei comigo a sugerir que nos sentássemos num dos lugares vagos da esplanada. E lá discorreu sobre a problemática (não, não lhe falei acerca da solucionática!). A história até se conta rapidamente. Ele assim o fez. Por vontade da mulher, garantiu-me, vendeu a casa que tinha: era enorme, três pisos, quintal atrás, jardim à frente; dava muito trabalho. Também, segundo o Ferreira, por vontade da mulher compraram um apartamento. Eu avisei-lhe que me ia dar mal com os vizinhos, que não estava habituado a que me o incomodassem., etc., etc. Não se zangou com ninguém, até fiz grandes amigos!, garantiu-me, mas a mulher não se deu com o andar. Tá a começar a ver o meu problema não tá?, perguntou-me. Olhei para ele sem responder mas com cara de sim, senhor, estou compreender plenamente o seu problema! Disse-me então que foi a um leilão judicial online e comprou uma casa maravilhosa, para os lados de Castro Laboreiro. Uma casa com uma vista de outro mundo, isolada de tudo, ar puro, afastada da cidade, uma maravilha! Perguntei se já lá morava. Que não, que esse era ainda um outro problema diferente do da sua mulher, pois quem ficou sem a casa recorreu para um tribunal superior e que agora não tem casa nenhuma. Então onde mora?, quis saber. Disse que mora na quinta de uns amigos, que não paga nada, mas tem de os ajudar nos trabalhos. Ele e a mulher. Que passa bem assim os dias. Mas a minha mulher não! Ela está com um problema e eu não sei como resolvê-lo. Silêncio. Perguntei então: é grave? Tem solução? Que dizem os médicos? De os olhos turvos, disse-me que o mal dela não é mal de hospital, que pensa muito na casa antiga, de cuidar dela e dos filhos. Sabe?, o problema dela são as saudades.

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