O Tribunal Constitucional (TC) decidiu por unanimidade declarar a nulidade das eleições legislativas no círculo da Europa, que deverão ser repetidas. Em causa estarão mais de 157 mil votos por estes não estarem acompanhados pela fotocópia do documento de identificação do eleitor.

Os juízes do Palácio Ratton ainda advertiram que o “acordo informal” entre os partidos no sentido de aceitar os boletins de voto que não sejam acompanhados por fotocópia do documento de identificação do eleitor é “grosseiramente ilegal”.

O acordo informal a que o TC se refere (reunião entre PS e PSD) faria com que fossem aceites como válidos todos os boletins de votos cujos envelopes permitam a identificação clara do eleitor, mesmo que o envelope não contenha a fotocópia do cartão de identificação, sendo que, nessa mesma reunião, ter-se-ia decidido que o elemento identificador (cartão de cidadão) servia “apenas como reforço das garantias do exercício pessoal do voto.”

Ora, é claro que a decisão do Tribunal Constitucional não poderia seria outra. Não caberá aos partidos políticos, através dos seus delegados ou mandatários, a faculdade de deliberam sobre os requisitos de validade dos votos, cabendo à Lei eleitoral da Assembleia da República, definir esses mesmos requisitos.

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Toda esta questão surge na sequência de um recurso apresentado por vários partidos (Volt Portugal, Livre, PAN, Chega e MAS), o que levou à obrigação de o TC decidir em 48 horas os fundamentos apresentados. No entanto, e como seria de esperar, até uma decisão final desde órgão de soberania, a composição do parlamento poderia resultar forçosamente no seu adiamento.

E assim foi.

Marcelo, famoso e ilustre constitucionalista, sabe bem que assim é, mas mesmo tendo conhecimento do recurso apresentado, sobrepõe-se ao Tribunal e ao Direito e assume as datas iniciais e que já estariam marcadas para dar posse ao governo.

Não, não, não. Está definido, e neste momento já está publicado o que deve ser publicado, ou em vias de ser publicado. Portanto, significa que os prazos de que se falou são os prazos que vão ser cumpridos, e eu tenciono manter a posse no dia 23…”. Acabei de citar o nosso chefe de Estado que falava aos jornalistas em Brest, França, no final da cimeira internacional Um Oceano.

Conhecida então a decisão (mais que esperada ) do TC, e sabendo que a tomada de posse para a nova composição do Parlamento só deve acontecer no terceiro dia após a publicação dos resultados finais definitivos no Diário da República, então quando é que esta trapalhada fica resolvida?

Ter-se-á que repetir as eleições no círculo da Europa, de acordo com a Lei Eleitoral no disposto do seu Artigo 119 com a epígrafe – Nulidade das eleições – “declarada a nulidade da eleição de uma assembleia de voto ou de todo o círculo, os actos eleitorais correspondentes são repetidos no segundo domingo, posterior à decisão.”

Assim, contas feitas, a votação decorrerá, segundo a Comissão Nacional de Eleições (CNE), nos dias 12 e 13 de março em regime presencial, sendo que os votos por via postal serão aceites até ao dia 23 de março. Com estas datas, tendo em conta a contagem dos votos e a publicação oficial dos resultados totais, a tomada posse será mais ou menos na segunda semana do mês de Abril. Até termos o Orçamento do Estado de 2022 em vigor, na sequência da tomada de posse do governo e do Parlamento, continuamos a ser governados pelo regime de duodécimos.

A posição de Marcelo sobre a decisão do Tribunal Constitucional não deve passar em branco. Isto porque o nosso Presidente da República, afirmou que “partiu do princípio que o Tribunal não decidia anular as eleições”.

As suas afirmações devem causar espanto no mundo jurídico e político. No primeiro mundo porque nas aulas de Marcelo na qualidade de ilustre professor, este sempre nos ensinara que deveríamos ter o máximo respeito pela Constitucionalidade das Leis e pelo seu órgão máximo de fiscalização preventiva e/ou sucessiva, esperando sempre pelas suas decisões.

No segundo, a afirmação é igualmente lamentável na medida em que esta decisão dos venerandos Juízes Conselheiros não é só uma lição para os partidos políticos mas sim e também para Marcelo Presidente.

Nunca nenhum jurista, sendo também isto que se aprende logo no primeiro ano nas faculdades de Direito, deve assumir ou partir do princípio que um determinado órgão de soberania decidirá assim ou assado. No mundo jurídico não se tomam posições esperando que uma determinada sentença/acórdão seja proferido com aquilo que se pensa.

Quando qualquer das partes, interpõe um determinado recurso, o dever é esperar pelo resultado da mesma. É a partir dela que se pode aferir uma determinada realidade jurídica.

Por essa razão, a justificativa de Marcelo Rebelo de Sousa em manter as datas da tomada de posse do novo governo e do parlamento só porque partiu do princípio que a decisão do TC não era a que foi, é para um professor de Direito Constitucional qualquer coisa de estranho.

Marcelo não pode partir do princípio de coisa nenhuma antes de uma decisão de um órgão soberania desta natureza. Se Marcelo constitucionalista sabe disto, Marcelo Presidente também o deveria saber. Não sabendo, o que diria então Marcelo comentador de Marcelo Presidente?

Quis o destino que Portugal perdesse um bom comentador político, dando-nos um afamado e consagrado constitucionalista com dons de adivinhação.