Ao contrário do que se diz, os adolescentes não são distraídos. Assumem a urgência climática. Discutem os dramas dos refugiados e das minorias. Defendem os direitos dos animais. Reciclam. Abrem guerra ao plástico. Estão cada vez mais ciosos dos alimentos biológicos. Adoram as novas tecnologias. Marcam a agenda das grandes transformações que as redes sociais nos propõem. São minuciosos nas escolhas que fazem. Inovam na linguagem. Discutem os sentimentos, a identidade e as relações. Insurgem-se contra tudo aquilo que consideram injusto. Amam! Dão importância à amizade e são cuidadosos e carinhosos com quem admiram. São sensíveis ao encantamento. Cultivam a ironia. E reagem, de forma ”aguçada”, às incoerências das pessoas crescidas. Por outras palavras, os adolescentes são “do caraças”!

Só não entendo porque é que, sempre que falamos deles, o façamos dando-lhes “desconto”. O que é impede de nos colocarmos no lugar deles e perguntarmos se, para além de tudo aquilo que lhes damos, não lhes estaremos a negar, em nome do futuro, o seu direito à adolescência? E porque é que evitamos imaginar a distância que vai entre aquilo que lhes exigimos e o mundo que lhes deixamos? E porque é que, entre os sonhos que eles constroem, sobressai o desejo de se afastarem, para longe de nós, como se aquilo que lhes damos, aqui e agora, não lhes chegasse para aquilo que sonham? E até que ponto eles estarão distraídos com aquilo que nós conseguimos, melhorando de vida numa geração, e que talvez não seja tão possível e tão fácil para eles? E, finalmente, será que eles nos admiram pela integridade das nossas conquistas ou condescendem porque nos sentem a trabalhar, a trabalhar e a trabalhar mas sem espaço para sermos donos da nossa vida, para a construirmos com “a nossa cara” e de acordo com tudo aquilo que sentimos merecer?

O que é que fica daquilo que achamos deles? Ou é porque os achamos, a todos, com as mesmas “manias”. Ou é porque o telemóvel faz parte do seu corpo. Ou porque são consumistas, murmuram, têm “mau feitio” e resmungam por tudo e por nada. Ou porque são os melhores amigos das marcas. Ou porque são egocêntricos e narcisistas.

Por menos — por muito menos — daquilo que dizemos deles, e por menos de todas as reticências com que o seu futuro os ameaça, já nós estaríamos numa rebelião interminável. Por menos, já muitos de nós teríamos baixado os braços e desistido de crescer. Por menos já a nossa insubordinação seria ácida, azeda e corrosiva. E o que fazem os adolescentes? Pegam nos valores que lhe damos. Juntam àquilo em que acreditam. Falam e escutam. Sonham, trabalham e pensam. Aturam os nossos preconceitos e a ponta de inveja que nos despertam. Toleram-nos quando lhes exigimos mais do que aquilo que lhes damos. E acreditam que o amanhã poder ser um lugar melhor.

Em resumo, falamos da adolescência como se ela fosse “viral”. Desconsideramos os adolescentes. E desbobinamos para cima deles as nossas patranhas. E, apesar de tudo, eles esperam por nós e acreditam em nós. Podiam ser melhores? Quem não podia?… Mas, seja como for, os adolescentes são “do caraças”!

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR