João Cotrim de Figueiredo põe um ar contrariado quando o querem situar à esquerda ou à direita, e tem bons motivos para isso. Um deles é a frivolidade com que emprega a palavra “liberalismo”, como veremos a seguir. Outro motivo é que o dr. Cotrim dá razão à extrema esquerda em tudo, só abrindo uma excepção para o capítulo da economia. Bem vistas as coisas, no plano do combate à esquerda ele apresenta ao país um programa parcial. Só que esse programa económico do dr. Cotrim não traz à direita nada de novo, por ser praticamente sobreposto aos programas do PSD e do CDS, que há muitos anos o defendem, em versões adaptadas a cada tempo e às circunstâncias que limitam o exercício da governação. Falamos de política, não falamos de técnica, duas disciplinas que o dr. Cotrim parece não distinguir. Talvez porque preside a um partido gerado na blogosfera, imaginado e escrito por um grupo de especialistas económicos dos quais se fariam magníficos assessores.

Só que as eleições não escolhem assessores, escolhem deputados e governantes, gente de quem se espera preparação e experiência para tomar decisões políticas. As pessoas que verdadeiramente trazem a esquerda pelos cabelos, que apontam à esquerda as mais pesadas responsabilidades nos problemas do país, que percebem a quantidade de erros decorrentes da visão que a esquerda tem do Estado e da sociedade, que querem combater a esquerda e ver-se livres dela por uns anos, essas pessoas têm de virar-se para outro lado. Por outras palavras, é isto que Francisco Rodrigues dos Santos tem dito quando se refere à Iniciativa Liberal.

Exagero do CDS? Não. O dr. Cotrim votou ao lado do Bloco de Esquerda na questão da eutanásia. Perante o momento da morte, este inspirador “liberal” recusa a vontade de Deus ou da absurda natureza das coisas, para a substituir pela vontade do Estado, delegada em alguém que o Estado indicou para validar ou não a vontade de um doente. Tal como o BE, o dr. Cotrim quer “liberalizar” a prostituição, não compreendendo que a maior parte da prostituição decorre do tráfico de mulheres, que essas mulheres ficam nas mãos das máfias e vivem praticamente em escravatura. E como se ainda faltasse aqui um grãozinho de abominação, o dr. Cotrim ainda quer abrir a porta a que esta actividade, ao ser normalizada e “regulada”, passe a pagar impostos.

É nesta frívola irresponsabilidade que o dr. Cotrim emprega o termo “liberalismo”, achando que a prostituição se resume a um problema de “liberdade individual”. Liberdade é, justamente, o que estas mulheres não têm.

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Declara o dr. Cotrim, com um ar já bastante enfadado, que a Iniciativa dele defende todas as liberdades, não só as económicas. Mas não foi isso que se viu nem foi isso que ele fez. O que os portugueses viram, sim, foi o dr. Cotrim defender as liberdades politicamente correctas, mas calar-se em relação às outras. Ele ia assistir a touradas quando era director na TVI, mas não abriu a boca quanto à proibição de touradas na RTP. Ele nunca levantou um dedo para intervir a favor dos Mesquita Guimarães, aquela família de Famalicão cujo pai luta contra o Estado português porque recusa a doutrinação dos seus filhos na escola, e não quer que eles frequentem a disciplina de Cidadania.

Pior ainda, o dr. Cotrim diz que defende a liberdade mas não tem nada contra a criação de uma ideologia oficial do Estado, porque declara que a disciplina de Cidadania deve ser um elemento estruturante na educação em Portugal.

E torna o liberalismo dele seriamente caricato quando defende a regionalização, que implica mais Estado e mais administração pública, e a criação de uma nova classe política, com a respectiva burocracia, o natural caciquismo e a mais do que esperável corrupção. É suficiente? Não é. Pede o reforço dos poderes do Parlamento Europeu e a criação de círculos trans-nacionais de candidatos a deputados europeus. O dr. Cotrim é o presidente daquele partido “liberal” que pede mais e mais Estado, e como o Estado português não lhe chega, ainda pede instruções aos poderes estrangeiros.

Não admira que o dr. Cotrim e a Iniciativa dele sejam levados ao colo pela esquerda. Dizendo-se muito arejados, não há nenhum partido mais confortável ao actual regime, desenhado pela esquerda e para a esquerda, vai fazer 50 anos.