Depois de um arranque francamente fraco, no qual o enfoque esteve demasiado centrado nos cenários pós-eleitorais, os debates para as eleições legislativas têm vindo, crescentemente, a subir de qualidade. Já fomos presenteados com alguns debates de qualidade, por exemplo Rui Rio contra Cotrim Figueiredo ou Rui Tavares contra Catarina Martins, nos quais houve sólida troca de ideias para o país e discordâncias saudáveis e civilizadas.

A mudança no sistema partidário, iniciada em 2019, e que, penso, será agora confirmada com o aumento de representação dos novos partidos, trouxe uma lufada de ar fresco a Portugal, que é fortemente visível nestes debates. Rui Tavares e João Cotrim Figueiredo são, acima de tudo, dois senhores.

À esquerda, o Livre representa uma esquerda cuja origem não é Comunista ou Neo-Comunista. Pelo contrário, pela primeira vez em Portugal, aparece uma esquerda verde, pós-materialista e na qual os principais dirigentes nunca estiveram ligados, directa ou indirectamente, às abjecções do socialismo real. Rui Tavares revela preparação, mundo e leituras, tudo coisas que, francamente, escasseiam na esquerda portuguesa. Foi confrangedora a falta de dimensão intelectual de Catarina Martins no debate com Rui Tavares.

João Cotrim Figueiredo apresenta um arsenal de ideias que, embora necessitem de ser limadas em alguns desvãos, estavam ausentes do debate político em Portugal.  As ideias liberais são importantes numa sociedade estagnada e em declínio, quanto mais não seja como força motriz de reformas que são indispensáveis a Portugal. A presença de Livre e Iniciativa Liberal nos debates das legislativas tornam Portugal um país mais Europeu e moderno.

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Por seu turno, infelizmente, a presença de André Ventura nos debates também alinha Portugal pelos padrões de competição partidária na Europa. Ventura tem aparecido nos debates no seu estilo habitual: truculento, a destilar ódio contra minorias, que, de resto, são insignificantes do ponto de vista dos gastos políticos, e com um conjunto de ideias fracas. Com a sucessão de debates, em minha opinião, a mensagem de Ventura parece perder gás. É certo que todos os partidos têm um conjunto de ideias chave, que apresentam em cada debate. Todavia, para alguém que veja todos os debates, rapidamente é perceptível que o ‘programa’ do Chega consiste apenas em meia dúzia de estribilhos vazios de conteúdo. Não devemos, contudo, desvalorizar o potencial eleitoral do partido. De facto, acredito que haja uma grande discordância no eleitorado sobre as prestações de Ventura. Muitos dos seus potenciais eleitores devem estar contentes com as suas prestações nos debates. De resto, neste momento, acho perfeitamente plausível que André Ventura tenha um bom resultado a 30 de Janeiro. A situação social do país, com mais de 1.6 milhões de pobres e um alheamento crescente da política, forma o caldo de cultura perfeito para partidos como o Chega. Não devemos confundir a percepção que no Príncipe Real temos sobre a prestação de cada candidato com aquela que existe no país real.

Infelizmente, creio que terminaremos os debates, que, em pandemia, serão os momentos altos da campanha eleitoral, sem termos resposta a algumas das perguntas mais prementes que assolam Portugal. Em primeiro lugar, face à eminente subido de juros do Banco Central Europeu, para fazer face à inflação, que estratégia terão os partidos quando, inevitavelmente, os juros da dívida começarem a subir? Recorde-se que a zona Euro não teve nenhuma reforma para mudar o seu financiamento, foi apenas ‘salva’, temporariamente, pelo QE do BCE. O que fará António Costa ou Rui Rio quando isto terminar em meados deste ano? Em segundo lugar, que tipo de estratégias cada um dos partidos tem para enfrentar o envelhecimento crescente da população, com riscos fortíssimos para a segurança social, agravados pela emigração jovem fruto de um país estagnado há 20 anos e que não oferece perspectivas de futuro? Em terceiro lugar, António Costa tem de responder cabalmente a duas perguntas. Por um lado, está o PS disposto a viabilizar um governo minoritário do PSD? Costa responderá que, em caso de derrota, sairá. No entanto, enquanto secretário-geral do partido tem obrigação institucional de deixar claro qual a posição que o partido tomará.  Para além disso, o país não poderá esperar pelos processos internos de substituição de líder do PS, que podem durar meses, para que tenhamos uma posição do partido quanto ao governo da República e ao próximo Orçamento de Estado. Costa será obrigado a pronunciar-se. Por muito que isso seja conveniente do ponto de vista eleitoral para o PS, não compete apenas ao PSD conter a ameaça da direita radical. Por outro lado, por que devem os Portugueses votar num partido, dando-lhe outra oportunidade, quando o seu modelo de desenvolvimento está francamente esgotado, com quedas sucessivas no ranking de países Europeus?

Os jornalistas têm um papel charneira na qualidade da democracia e seria importante que, ao invés de serem meras caixas de ressonância do poder político, cumprissem o seu papel. Quando um político não responde a uma pergunta ou mente despudoradamente, o jornalista tem obrigação de deixar claro que o político não quer responder. Infelizmente, com raras excepções, a nossa comunicação social limita-se a ser fraca com os fortes e a ser a voz do dono, como bem mostram os meta-debates que se seguem aos debates, nas quais vemos comentadores cuja opinião só pode ser explicada por eventuais avenças.