Partimos para mais uma semana de conflito bélico na Ucrânia, mas aparentemente só alguns percebem o valor da resistência ucraniana.

Diria que é consensual afirmar que os portugueses ficaram chocados com a posição firme do PCP relativamente ao conflito na Ucrânia. Desde a queixa quanto ao recente discurso do Presidente Zelenski na Assembleia da República, por considerar um “insulto” à Revolução dos Cravos, até à exposição da crença de que só é a favor da paz quem se recusa a lutar pelo seu país.

Segundo Jerónimo de Sousa “a posição do PCP acabará por ser compreendida” e, por mais absurdo que possa parecer, indiretamente e de forma despercebida, existe uma possibilidade de tal vir a concretizar-se devido ao crescente esforço em aprimorar a influência de organizações e ideais internacionais desde há várias décadas até aos dias de hoje.

Quem (ainda) não leu Marx e se baseia apenas em alguns chavões anticomunistas terá, à partida, menos “visão de jogo” para interpretar a força que puxa o PCP para a sua polémica opinião.

Quem se situa à direita do PCP pode fazer as costumeiras piadas sobre a inexistente URSS e que de comunista Putin nada tem nada, sendo assim um desperdício eleitoral para o PCP. Mas quem o faz cai numa jogada de xadrez político subtil.

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A posição “chocante” do PCP não é nada mais do que uma consequência do internacionalismo marxista, uma vez que Marx acreditava que o nacionalismo era um fenómeno temporário artificial e a divisão dos homens em estados nações antagónicas os separava por meio de fronteiras, além de os afastar da própria “natureza humana”, pois atribuíam os seus poderes a uma entidade superior, a nação.

Quando o PCP condenou Zelenski por continuar a guerra, quase todos fizeram o raciocínio óbvio de que isso significaria a rendição da Ucrânia e vitória de Putin, mas não é isso que interessa ao PCP. O importante é que não exista um sentimento de sacrifício para além da revolução internacional, sendo esse sentimento neste caso não uma ideologia em específico, mas sim a nação, algo que Putin também detesta nos ucranianos, mas não pelos mesmos motivos. O que os ucranianos têm feito na prática é um ato de puro sacrifício pela sua soberania, com milhões de ucranianos dispostos a lutar para salvarem o seu país, algo que em países da Europa Ocidental é cada vez mais raro de acordo com estatísticas recentes.

Daí ter referido no início que só dois partidos (relevantes) entenderam o porquê profundo da contínua resistência ucraniana. Não é primordialmente pelos clichês da liberdade, do humanismo ou da democracia como alguns afirmam, até porque a Ucrânia não tem, nem tinha, uma classe política que respeitasse tais valores antes da guerra ao ponto de se esforçar como tem feito para os proteger com vidas humanas. É, pois, pela independência nacional ucraniana, que aí sim se pode relacionar com a liberdade num outro tópico ligado à soberania.

Para finalizar, pode-se criticar a ideologia em causa, mas se estamos a elogiar de forma subliminar o indireto nacionalismo apolítico, espiritual e prático dos ucranianos, a verdade é que estaremos também, isto se quisermos ser coerentes, a atribuir qualidades ao nacionalismo no seu geral como ideia e forma de ver o mundo, o que não ajudaria nem ajudará os seus opositores, se quem o defende for competente na sua missão.