Lembram-se dos famosos 3Ds? A descolonização já lá vai, e não é o tema deste artigo. Os outros dois Ds são os mais relevantes. A democratização aconteceu, mas a qualidade da democracia portuguesa está a diminuir. O grande fracasso aconteceu com o terceiro D, desenvolvimento (económico). É óbvio que Portugal está muito mais desenvolvido do que estava em 1974. Mas teria que ser assim, quando passou quase meio século. Qualquer país se desenvolve em 50 anos. O problema é que não nos desenvolvemos tanto nem tão bem como deveríamos, tendo em conta as condições existentes – biliões de euros de fundos europeus desde 1986, e juros muito baixos a partir de 2000. Assim, em termos relativos europeus, somos cada vez menos desenvolvidos e mais pobres.

Nos anos de 1980, os partidos políticos prometeram aos portugueses um país europeu próspero, desenvolvido e justo socialmente. Em vez disso, mais de 35 anos depois da adesão europeia, somos o país dos 3 Es: endividamento, empobrecimento e envelhecimento. Em 2000, a dívida pública portuguesa era de 54% do PIB. Em 2022, a dívida pública é mais de 126% do PIB. Ou seja, em 22 anos, houve um aumento de 72%. Desses 22 anos, o PS governou 15 anos. A dívida privada – famílias e empresas – é ainda maior, cerca de 160% do PIB.

Em 2000, a média do rendimento líquido dos portugueses era 12.000 euros. A dívida privada era cerca de 25.000 euros per capita. No início de 2022, a média do rendimento líquido é quase 15.000 euros, e a dívida privada per capita é quase 33.000 euros. Em 22 anos, os rendimentos dos portugueses aumentaram em média 3 mil euros, mas o endividamento cresceu 8 mil euros. Ou seja, cresceu quase o triplo. Esta relação demonstra o caminho para o empobrecimento das classes médias, a que se junta o aumento do peso da carga fiscal.

É verdade que a carga fiscal em Portugal, cerca de 35% do PIB, não é das mais altas na UE, o que deve deixar os portugueses nervosos porque virão aí mais impostos para pagar a segurança social. Mas o esforço fiscal – a relação entre a carga fiscal e o PIB per capita – é dos mais altos na UE, o sétimo mais alto, com 20 países mais abaixo. Este é o dado que conta.  O esforço fiscal para os portugueses é 15% superior à média da UE.

Além do empobrecimento gradual das classes medias, há dados mais dramáticos. Cerca de 20% da população portuguesa é pobre. Mas dos pobres, apenas 13% são desempregados. Ou seja, 87% dos pobres são pessoas com rendimentos, pensionistas (cerca de 28% dos pobres são pensionistas) e empregados, incluindo os trabalhadores precários (cerca de 27% dos pobres são trabalhadores precários). Pior, o risco de pobreza aumentou nos últimos 5 anos. Em 2017, havia 1.7 milhões de portugueses em risco de pobreza. Hoje, há cerca de 2 milhões. Em 2022, em Portugal, 20% da população portuguesa é pobre, 20% está em risco de pobreza. E o salário médio é cerca de 1200 euros líquidos.

Além dos milhões de portugueses pobres ou em risco de pobreza, a classe media recebe salários baixos, está endividada e sofre um esforço fiscal elevado. Ou seja, os portugueses tornam-se pobres a trabalhar. A realidade deveria ser trabalhar para enriquecer.

O envelhecimento tem, naturalmente, um lado muito positivo: o aumento da esperança de vida. É muito bom que os portugueses vivam mais tempo. Mas ao aumento do número de pessoas velhas, não teria necessariamente que corresponder um envelhecimento da população, bastava que aumentassem os nascimentos. Uma taxa de natalidade baixa é um problema geral europeu, mas Portugal tem a quinta pior taxa na União Europeia, apenas à frente da Itália, da Espanha, da Grécia e da Finlândia. Com um país a empobrecer, será difícil esperar grandes melhorias.

A outra política para combater os efeitos económicos e sociais do envelhecimento seria aumentar a idade da reforma. A esperança de vida é 15 anos mais elevada do que a idade de reforma. A prazo, não é viável. Mas não há neste momento condições políticas para aumentar a idade da reforma. A emigração sistemática dos jovens, e muitos deles qualificados, também contribui para o envelhecimento da população. Os jovens emigraram durante o tempo da troika, e continuaram a emigrar desde que o PS chegou ao governo em 2015. Só deixarão de emigrar quando puderem enriquecer e ganhar dinheiro em Portugal. Mas para que isso aconteça, seriam necessárias reformas que o actual governo nunca fará.

O três Es estão a diminuir a qualidade da democracia portuguesa. Os partidos políticos e a classe política sabem que falharam, que não cumpriram o que foi prometido aos portugueses. O fracasso do sonho europeu foi o maior falhanço político nacional desde o 25 de Abril. Mas o governo não pode admitir nem reconhecer esse fracasso histórico. Por isso, dissimula, esconde, engana e usa truques.

Compete aos portugueses decidir se querem ser dependentes ou correrem riscos para serem mais prósperos e mais livres. Também devem decidir se premeiam políticos que lhes dizem a verdade, mesmo que seja dura, ou os que lhes contam mentiras piedosas para esconder a realidade. Em suma, os portugueses querem ser tratados como adultos responsáveis ou como crianças irresponsáveis?

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