De acordo com fontes fidedignas, Pedro Passos Coelho recusou a hipótese de vir a ser agraciado com a Grã-Cruz da Ordem Militar de Cristo. Uma condecoração que o Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, lhe queria atribuir como recompensa pelos serviços prestados a Portugal enquanto primeiro-ministro. A regra da vida habitual.

Como era expectável, houve quem visse nessa recusa uma forma de Passos Coelho mostrar o seu desagrado pela forma como o atual Presidente da República viabilizou a geringonça que o expulsou de São Bento. Pessoas que, sobretudo se eleitores afetos à extinta PaF, se solidarizaram com o antigo líder do PSD e aceitaram como boa a sua decisão. Uma posição de que me permito divergir.

De facto, na Academia aprendi as três regras a cumprir no que diz respeito às homenagens ou condecorações. A primeira estipula que nunca se pedem. A segunda clarifica que nunca se recusam. A terceira esclarece que nunca se agradecem.

Como se constata, a fazer fé nestas regras, principalmente na segunda, Passos Coelho não deveria ter recusado a condecoração. A injustiça de que se sentiu – e provavelmente ainda sente – vítima não constitui razão suficiente para a não-aceitação. Menos ainda, a justificação de que é demasiado jovem para receber uma condecoração nacional. Quem tem idade para liderar o executivo também tem anos suficientes para ser agraciado pelo desempenho do cargo.

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Desempenho que, diga-se, ficou marcado pela coragem de governar um país que a crise mundial e o desregramento socrático tinham colocado na banca rota. Um ativo que, obviamente, foi acompanhado por um passivo. Aquele que resultou de erros próprios. Como ir além das exigências da Troika. Um erro de que a geringonça viria a tirar proveito sem que tal se refletisse, de forma sustentada, no presente e no futuro próximo dos portugueses.

Como a História mostra, a Ordem Militar de Cristo já foi recebida, entre outras personalidades, por primeiros-ministros como Sá Carneiro, Mário Soares, Pinto Balsemão e Santana Lopes. Passos Coelho deveria ter mantido essa tradição, mesmo sabendo que algumas condecorações perderam prestígio devido ao excesso de atribuições. Uma situação que vem de trás. Basta lembrar o que escreveu Almeida Garrett: Foge cão que te fazem barão. Para onde se me fazem visconde?

Uma denúncia que não implicou que também Garrett aceitasse ser visconde. Um exemplo que, na minha ótica, Passos Coelho deveria ter seguido.

Aliás, a aceitação não representaria qualquer melindre para o homenageado. De facto, voltando às regras atrás enunciadas, há um quarto elemento que aprendi com o Professor Adriano Moreira. Uma regra que diz que, depois de aceite, a condecoração só deve ser usada se o homenageado se sentir confortável com ela.

Talvez convenha recordar que Pedro Passos Coelho manteve na lapela a bandeira de Portugal, mesmo depois de ter visto o segundo mandato ser interrompido. Um sinal de que continuava a considerar o lugar de primeiro-ministro seu por direito. Por isso se sentia confortável com a bandeira portuguesa na lapela do casaco. Uma espécie de primeiro-ministro no exílio.

No caso em análise, a condecoração destinava-se a premiar o exercício de um cargo. Independentemente das mãos que a colocam. Não representa uma condecoração marcelista. Decorre da tradição.

Passos Coelho, que não pediu a Grã-Cruz, deveria tê-la aceitado sem qualquer agradecimento. Aliás, não parece abusivo afirmar que merece usá-la. Porque o ativo superou o passivo. Ao contrário de outros que passaram por São Bento e que não guardaram a condecoração na gaveta.

Professor de Ciência Política