“O comunismo e o extremismo de esquerda na Europa Ocidental são agora, e de um modo geral, quase inteiramente uma forma de masturbação. As pessoas que na realidade não têm qualquer forma de poder sobre os acontecimentos consolam-se a si próprias, fingindo que, de um certo modo, estão a controlá-los. Do ponto de vista dos comunistas nada mais importa, desde que consigam convencer-se a si próprios de que a Rússia está por cima”, escreveu George Orwell em “Diários”.

Esta citação é bastante actual, pois caracteriza bem o Partido Comunista Português como força política cada vez mais decrépita e impotente.

Não imaginava que um dia iria ser alvo de tão atentas críticas do “Avante”, órgão do Comité Central do Partido Comunista Português. Isto significa apenas que acertei no alvo certo.

Este jornal escolheu Gustavo Carneiro para desmascarar o José Milhazes, mas o jornalista nem se preocupou em investigar um pouco da minha biografia, e para isso bastava-lhe ir à Internet ou ao arquivo do PCP. Mas não, decidiu que sou “um especialista no PCP e no comunismo em geral”, o que mostrou que não deve ter lido nada ou quase nada do que eu escrevi. O “PCP e o comunismo em geral” devem constituir menos de 10% do que eu escrevi.

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Mas avancemos. O dito jornalista escreve, sobre a minha passagem pelo PCP, que “durante quanto [fui militante] tempo pouco interessa”, mas claro que interessa e, como ele teve preguiça de consultar o arquivo do citado partido, eu revelo: fui militante da UEC/PCP entre Outubro de 1974 e Maio de 1991, ou seja, apenas durante 17 anos.

É verdade que escrevi um artigo no Observador “em que manifesta a sua concordância com a resolução aprovada no Parlamento Europeu que equipara o nazismo ao comunismo”. Mas como se trata de um facto provado, o autor do “Avante” foge para  “milhares de refugiados à sobre-exploração ou à morte no Mediterrâneo, quando promovem a militarização da União Europeia ou quando, no Parlamento Europeu e em cada um dos seus países, privatizam empresas, desmantelam serviços públicos, fragilizam as relações laborais, concentram a riqueza…” Fica-se com a impressão de que o Milhazes apenas se preocupa com o comunismo e o nazismo, mas apoia todos os males deste mundo. Onde defendo, por exemplo, a morte de milhares de refugiados no Mediterrâneo? Gustavo Carneiro recorre à velha táctica do “apanha que é ladrão!”, mas de forma bastante grosseira.

Mas deve dizer que o PCP, por vezes, tem cuidado com a imagem que quer fazer passar e refina-se. É verdade que, no meu texto do Observador em discussão, “o Milhazes… não referiu ao facto de ter sido a União Soviética a assumir o papel mais relevante na derrota do nazi-fascismo e a pagar por ela o mais elevado preço em vidas humanas: mais de 20 milhões”, mas já escrevi isso em dezenas de artigos e livros. Normalmente, os comunistas não falam em União Soviética, mas em Estaline, o que torna a discussão completamente diferente, pois eles querem-nos provar que o ditador soviético foi quem salvou o mundo do diabo Adolfo Hitler.

Além disso, é preciso actualizar os números: quantos mais de 20 milhões? 25? 27 milhões? Ou para o PCP não importa os erros e crimes cometidos por Estaline durante a guerra? Não há dúvida que o Exército Vermelho libertou a Europa Central e Oriental, mas é preciso continuar a história: libertou do nazismo, mas impôs-lhe uma ditadura comunista. É verdade, e eu nunca pus em causa essa afirmação, que os comunistas foram fundamentais na luta contra o fascismo, mas também se deve acrescentar que, em 1975, Álvaro Cunhal lutou pela imposição de uma ditadura comunista em Portugal.

Quanto à ocultação de que “foram (e continuam a ser) comunistas os mais combativos resistentes antifascistas em todos os países, incluindo em Portugal”, apenas posso dizer que não conheço máquina para determinar o nível de combatividade. Apenas posso imaginar que os comunistas alemães que Estaline “ofereceu” a Hitler em 1939 estejam no cimo da escala.

E onde é que o Milhazes “clama por purgas”? Eu, por acaso, defendi a proibição do PCP ou do BE? Gustavo Carneiro, o senhor não deve imaginar o que são purgas! Eu defendo o arejamento do Ensino Secundário e Superior no que diz respeito ao ensino da História e outras ciências sociais, onde a extrema-esquerda possui autênticas “coutadas”.

Claro que não podiam faltar as citações de ilustres homens para justificar o injustificável. Neste caso, trata-se do escritor comunista alemão “Thomas Mann, para quem comparar comunismo com fascismo, «na melhor das hipóteses, é uma superficialidade; na pior das hipóteses, é fascismo. Quem insiste nessa comparação pode ser considerado um democrata, mas na verdade, e no fundo do seu coração, ele é realmente um fascista e é claro que só combaterá o fascismo de maneira aparente e hipócrita, deixando todo o seu ódio para combater o comunismo”.

Mas não há verdades absolutas, mas sim opiniões e, neste campo, não tenho dificuldade em encontrar outros ilustres homens de letras que apoiaram e apoiam o que eu escrevi:

“O comunismo distingue-se fundamentalmente do fascismo porque foi o primeiro” – Virgílio Ferreira.

“O comunismo não é amor, o comunismo é um martelo com o qual se golpeia o inimigo” – Mao Tse Tung.

“Eles (os comunistas) não precisavam refutar argumentos adversos: preferiam métodos que terminavam antes em morte do que em persuasão, que espalhavam antes o terror do que a convicção” – Hannah Arendt.

Pode-se juntar a estas citações muitas outras, mas isso não resolve o problema. O fundamental é basear-se na prática dos dois regimes totalitários, na sua atitude para com as pessoas, nos resultados (!!!). Não há fins que justifiquem quaisquer meios.

Quanto às discussões teóricas, são interessantes, mas não nos podemos esquecer que estamos a falar de crimes operados com muitos milhões de mortos e de vidas destruídas.