Inspirado pelo oportuno e eloquente Manifesto contra a greve do Metro publicado por José Manuel Fernandes e pela minha própria frustrante experiência pessoal enquanto utente do Metro de Lisboa, não resisto a escrever também sobre o assunto.

Por razões pessoais e profissionais, utilizo quase todas as semanas tanto o Metro de Lisboa, empresa firmemente estatizada há várias décadas, como o Metro do Porto, subconcessionado a um consórcio privado liderado pela Barraqueiro, e o contraste em termos de serviço (dito “público” em ambos os casos) é flagrante. Se no caso do Metro do Porto as falhas de serviço são raras e é possível planear deslocações com recurso a esse meio de transporte público com relativa segurança, no caso do Metro de Lisboa é inevitável a qualquer utente ter uma permanente preocupação de saber se não estará agendado para a mesma altura da viagem planeada um qualquer happening promovido pela CGTP.

Entre greves parciais, totais e plenários sindicais, rara é a semana em que o Metro de Lisboa funciona em condições normais. O aprisionamento do Metro de Lisboa pela CGTP é de tal ordem que uma das aplicações que mais utilizo (e que recomendo a todos quantos não podem evitar o uso regular dos transportes públicos em Lisboa) é a que está associada ao site muito apropriadamente denominado “Hoje há greve? Veja se consegue chegar ao trabalho.”.

No meio desta verdadeiramente deplorável situação – que nenhum Governo parece ter coragem para resolver – a CGTP tem ainda o descaramento de repetidamente invocar que a regular paralisação do Metro de Lisboa é feita em nome da defesa do “serviço público”. Na realidade, o que a CGTP realmente faz é aproveitar a circunstância de basicamente controlar uma empresa estatizada num sector onde é relativamente fácil por razões técnicas bloquear completamente o funcionamento do serviço. A partir daí, e em total desrespeito pelos utentes, as greves e plenários no Metro de Lisboa são convocados ao sabor da agenda política do PCP, compensando mediaticamente a fraca representatividade e capacidade de mobilização dos sindicatos na generalidade dos sectores de actividade.

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Toda esta farsa assume proporções ainda mais graves e hipócritas se considerarmos que são precisamente os trabalhadores mais pobres os mais prejudicados pelas sucessivas paralisações do Metro de Lisboa. Como é fácil de compreender, a maioria dos utentes regulares do metro tenderão a não pertencer às classes de maior rendimento e, de entre os utentes regulares, serão ainda os de menores rendimentos que mais dificuldades enfrentarão para arranjar (e pagar) alternativas em dias de bloqueio sindical do Metro de Lisboa.

Se o PEV fosse algo mais do que um apêndice eleitoral e parlamentar do PCP, poder-se-ia apontar também a incoerência de boicotar sistematicamente um meio ambientalmente menos poluente como o Metro de Lisboa, ao mesmo tempo que a sua falta de fiabilidade incentiva quem trabalha na Grande Lisboa a utilizar viatura própria. Mas, dada a conhecida natureza do PEV, essa não será uma boa via de argumentação.

Mais relevante será assinalar que o Metro de Lisboa, não obstante a notória falta de regularidade do serviço, tem absorvido ao longo dos anos indemnizações compensatórias substancialmente mais volumosas, quer em termos absolutos quer em termos relativos, do que o Metro do Porto, com os resultados que estão tristemente à vista de todos, também no domínio da “paz social”.

Face a este deprimente cenário, é inaceitável que tudo continue como está no Metro de Lisboa. Seria lamentável que num sector em que este Governo tem deixado, apesar de tudo, uma marca positiva por via da acção do secretário de Estado dos Transportes, Sérgio Monteiro, o Metro de Lisboa permanecesse monoliticamente uma coutada da CGTP em prejuízo dos contribuintes, dos utentes e da economia portuguesa.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa