Recentemente, muito se tem discutido sobre Web3, as alterações de dinâmicas socioeconómicas que daí podem advir e as implicações que as mesmas poderão ter no nosso futuro enquanto humanidade e no futuro do planeta. Mas, afinal, que papel ocupamos nós, enquanto designers, neste movimento e como podemos melhor refletir sobre a nossa prática para criarmos um futuro mais promissor para todos os seres vivos?

Um dos grandes entraves à adoção em massa da Web3 é a sua dificuldade de utilização por pessoas inexperientes. É sempre complicado imaginar o que ainda não existe e resolver problemas ainda não solucionados, mas é nossa função, enquanto designers, através de um processo de tentativa e erro, tentarmos encontrar soluções. Há vários pontos que convém termos em mente ao desenharmos para a Web3, dos quais realço:

  • Utilizar elementos familiares que nos permitam suavizar a curva de aprendizagem e adaptação (por exemplo, ao mostrarmos o valor em criptomoedas, convém incluirmos a conversão numa moeda fiat, como o euro ou o dólar);
  • Mostrar os próximos passos num flow, por ser, especialmente durante o processo de aprendizagem, uma forma de guiar novos utilizadores para que percebam o processo e se sintam mais acolhidos;
  • Transparência não é só uma palavra bonita, é um pilar desta nova fase da internet e, consequentemente, tem de estar incluída nas decisões estratégicas de produto e design;
  • A blockchain é imutável, portanto as ações irreversíveis são mesmo irreversíveis. É importante que tentemos prevenir possíveis erros, ao mostrarmos aos utilizadores que certas ações podem ter consequências desastrosas, como a perda total do seu dinheiro.

A questão ética da Web3 seria, por si só, assunto para um artigo completo. Neste contexto, gostaria apenas de referir dois pontos que podem ser uma porta de entrada para uma análise mais profunda sobre o tema.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

Primeiramente, é fácil sermos iludidos por ideias mirabolantes e apresentações bonitas. Isto acontece tanto enquanto designers num novo projeto, como enquanto potenciais utilizadores ou investidores de um determinado produto ou projeto. Não é algo exclusivo da Web3, mas é especialmente comum agora, visto ainda estarmos numa fase embrionária onde a linha entre o possível e o impossível é ténue e se altera com regularidade. Enquanto designers, devemos ter atenção ao projeto onde trabalhamos e fazer uma pesquisa prévia sobre o mesmo e sobre a equipa por detrás dele. Isto, embora não impeça que imprevistos aconteçam, deixa-nos mais confiantes e tranquilos. É especialmente importante que isto aconteça, visto que o nosso trabalho como designers num projeto com as motivações erradas, pode vir a ser prejudicial para muita gente no futuro. Como referiu Victor Papanek, “existem profissões mais prejudiciais do que o design, mas apenas algumas.” Precisamos de ter consciência do nosso poder e utilizá-lo no que está alinhado com os nossos valores.

Para além disso, vários problemas que hoje se estão a tentar resolver utilizando a blockchain, poderiam ser resolvidos com soluções de web2. Então por que não utilizarmos tecnologia mais estável e de mais fácil acesso para a generalidade da população? Será que o facto de incluirmos buzzwords como Web3 ou NFTs, para atrairmos mais atenção (e dinheiro) sobre o projeto compensa o que iremos perder com essa decisão? Porquê investir em soluções de web3, quando o problema em si não pede isso? Como designers devemos ter sentido crítico e intervir quando acharmos que a solução encontrada não é a que melhor se enquadra com o problema.

Muito mais poderia ser referido sobre Web3 e todos os tópicos que lhe são adjacentes. Há uma beleza especial no que fica por dizer, por conter em si infinitos problemas à espera de solução, possibilidades por serem exploradas e espaço e liberdade para experimentação. Creio que seja um pouco como a Web3 e como o pensamento daquilo que pode ser a prática do design nesta nova fase da internet: incerta, por vezes caótica, mas sempre esperançosa e confiante na possibilidade de uma internet mais justa e livre. Ficamos nós, designers, encarregues de fazer a nossa parte.

Filipa Ribeiro é Product Designer na Subvisual, um venture studio focado em web3. Acredita no poder do design e da tecnologia de mudar o mundo e procura ativamente envolver-se em projetos de impacto social.

O Observador associa-se à comunidade Portuguese Women in Tech para dar voz às mulheres que compõe o ecossistema tecnológico português. O artigo representa a opinião pessoal do autor enquadrada nos valores da comunidade.