Historicamente Portugal é um país de emigrantes. Ora dado que a população do país não é assim tão grande, dado que o seu território não é assolado por uma guerra há muitos anos, dado que os desastres ambientais são uma coisa relativamente rara e inconsequente e dado que a perseguição étnico-religiosa, e desde 1974 também a política, são fenómenos residuais, só sobra uma grande causa para explicar o êxodo dos portugueses: a procura por melhores condições de vida.

Verdadeiramente essa é a principal razão pela qual os portugueses emigram. Após um pico nos anos 60, em que, face às precárias condições de vida, muitos portugueses se fizeram à estrada, a emigração acalmou com a queda do Estado Novo, algo que deu ânimo e esperança à população. Contudo, a tendência viria a inverter-se, acentuando-se na última década. Em 2020, mesmo estando os números em queda desde o recorde de 2014, ainda foram quase 70 mil os portugueses que emigraram. E se a globalização poderia ser um argumento, é de ressalvar que, de entre todos os estados-membros que aderiram à UE no século XX, só Portugal tem mais nacionais emigrados que estrangeiros no país, realçando o mau exemplo que o país é no contexto europeu.

Estes são dados poucos surpreendentes. Basicamente, em períodos de maior sufoco os portugueses emigram, e em períodos de maior otimismo social, a emigração cai. Apesar de óbvios, estes dados permitem retirar uma conclusão: os portugueses não emigram porque desejam, emigram por necessidade. Por outras palavras, se os portugueses encontrassem condições e oportunidades na sua terra, não as procurariam fora dela. Assim, quem calcorreie as ruas de Saint-Gilles, em Bruxelas, ou de Esch-sur-Alzette, no Luxemburgo, ouve frequentemente falar em saudade e em orgulho nas suas origens, mas raramente encontra alguém disposto a abdicar do contexto em que vive em função desses sentimentos.

Perante isto, urge uma reflexão por parte dos portugueses, em particular aqueles que vivem no estrangeiro. Portugal tem de deixar de ser visto apenas como um destino de férias mas também como um país com muito potencial. O tempo com familiares e amigos não pode servir só para matar saudades mas também para os espicaçar a exigir mais aos governos e classe política no geral. Quem todos os dias tem contacto com uma realidade que também poderia existir em Portugal não se deve resignar à condição dicotómica de que ou tem Portugal ou tem uma vida digna.

Se, regra geral, os portugueses que emigram conseguem acumular riqueza, o que é que se pode fazer para isso se tornar regra também em Portugal? A resposta mais pragmática de todas é: replicar no nosso país aquilo que teve sucesso noutros lados. Será um pouco simplista, mas a verdade é que reinventar a roda é um desperdício de energia. Há razões pelas quais as economias dos países “mais portugueses” são mais robustas. Se temos exemplos que funcionam, basta copiá-los e aperfeiçoá-los. No Benelux,os exemplos são muito distintos. Por exemplo, a fiscalidade light dos Países Baixos contrasta com o pesado sistema fiscal belga. Todavia, é muito mais aquilo que une os três países que aquilo que os separa. Nos três, políticas amigas do progresso e do risco sempre foram uma constante. Nos três, a mentalidade vigente incorpora a ideia de que a melhor pessoa para decidir sobre a sua vida é sempre a própria pessoa. Em dois (na Bélgica nem tanto), a liberdade económica é a chave que sustenta toda uma economia. No fundo, os portugueses residentes no Benelux podem testemunhar em direto os resultados de longos períodos marcados por políticas liberais. Dirão que nem tudo é um mar de rosas. É evidente que não é, mas se a conjuntura nestes locais não fosse um enorme upgrade face à encontrada em Portugal poucos portugueses constituiriam aí raízes.

Há uma componente cultural nos dados da migração que não pode ser negligenciada? Claro que sim. Portugal sempre foi um país de aventureiros, pelo que perante as dificuldades, os portugueses fazem-se à vida. É redutor partir dos dados da emigração e fazer uma extrapolação tão grande para o estado de Portugal? Talvez o seja, a realidade nunca é assim tão simples, é sempre multifatorial. Porém, o facto de a diáspora ser tão grande e vasta tem um significado profundo. Uma boa parte dos emigrantes, se pudesse voltar ao seu país mantendo o estilo de vida que tem no estrangeiro, não hesitaria em regressar, pelo que se permanece longe de casa, é porque tem motivos. Cabe a Portugal tornar-se um país capaz de oferecer amplamente condições dignas a todos os portugueses, e cabe-nos a nós, emigrantes, fazer pressão por isso.

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