Eh pá, agora a sério. Vamos lá parar com isto. Chega de fazer pouco de António Costa por causa do, já histórico, “Now I can go to the bank?”, dirigido a Ursula von der Leyen, aquando da entrega do Plano de Recuperação e Resiliência ao primeiro-ministro. É evidente que se tratou de uma piada de Costa. Alguma vez o primeiro-ministro ia sair dali directo para o banco? Para quê? Para depositar o cheque e deixar o dinheiro a render a prazo? Claro que não. Isso seria absurdo. Toda a gente sabe que, por estes dias, os depósitos a prazo não pagam nada. António Costa saiu da reunião com o cheque mas foi para ir a correr torrar o dinheiro em adjudicações de auto-estradas. E em boa altura, diga-se. Que uma pessoa, quando vai para o Porto, por exemplo, debate-se sempre com o mesmo dilema: “Então e agora? Vou pela A1? Vou pela A8? Raisparta, fazia imensa falta outra auto-estrada, para desempatar. Olha, se houvesse aquela terceira ligação que, um dia, foi um sonho do – nos seus sonhos – engenheiro José Sócrates, tudo se resolveria”. Bem, se não é desta que a coisa avança, não é nunca.

A propósito de corridas aos bancos, quem também não vai tomar parte nesse sprint rumo a instituições bancárias é a generalidade dos portugueses. Desde logo, porque não têm lá nada, nem guardado, nem para guardar. E depois porque, mercê do estupendo efeito económico das medidas de combate à pandemia tomadas pelo governo, a que se somará, entretanto, o estupendo efeito económico das medidas incluídas no PRR, temo que, acabando as moratórias, não vai ser preciso os portugueses irem ao banco. Serão os próprios bancos a irem visitar os portugueses às suas casas. E a por lá ficarem. Tipo visita abusada. Que, eventualmente, acaba mesmo por correr com os antigos moradores para o olho da rua.

E talvez por ter abordado a temática “esturricar dinheirinho”, ocorreu-me o antagónico tópico “verbas investidas criteriosamente”. Isto porque a comissária europeia para a Coesão e Reformas, Elisa Ferreira, veio dizer que “é penoso” ver que o país, apesar de vários anos de apoios comunitários, “ainda está entre os países atrasados”. O que seria apenas óbvio, e não extremamente giro, não fosse o caso da mesma senhora ter afiançado, ainda há menos de um ano, que Portugal gastar mal o dinheiro europeu “é uma ideia completamente absurda”. “Incoerência!”, gritarão os mais precipitados. E um bocadinho histéricos. Nada disso, meus caros. Acontece, simplesmente, que a Dra. Elisa é uma rigorosa frugal, indignada com a forma como sucessivos governos esbanjaram apoios da Europa. Já a Mrs. Ferreira ninguém convence que Portugal não tem dado um uso magistral às verbas provenientes da União Europeia. Posto isto, não deixar de tomar a medicação e as melhoras para isso da dupla personalidade são, respectivamente, o meu conselho e o meu desejo para Elisa Ferreira.

De facto, o momento é complicado. Mas é premente pôr as coisas em perspectiva. Tal como Vítor Gaspar dizia no tempo da Troika, é preciso lembrar que nós não somos a Grécia. Tenhamos calma. Calma, que bem vamos precisar dela. Quando, para aí daqui a dois anos, virmos os gregos ultrapassarem-nos pela direita em tudo o que é indicador económico. Isto porque os helénicos elaboraram um PRR com o potencial para aumentar o PIB da Grécia entre 2,1% e 3,3% até 2026. Enquanto nós elaborámos um PRR com um potencialzinho para aumentar o PIB de Portugal entre 1,5% e 2,4%. Se bem que é um bocado injusta, a comparação. É que o PRR grego foi antecedido de um detalhado plano de desenvolvimento para a economia grega, coordenado por uma comissão de peritos encabeçada por um prémio Nobel e professor da London School of Economics. Ao passo que o nosso PRR foi feito num fim-de-semana por um gajo.

Bom, mas fazendo minhas as palavras do Presidente da República, hoje é dia de futebol e aqui estamos todos unidos em torno do futebol. Logo, eu não vou estar a falar de outros temas, porque é desconcentrar do fundamental, que é a bola. Portanto, peço desculpa e retiro tudo o que disse. Menos aquela parte do nosso PRR ter sido “feito num fim-de-semana por um gajo”. Que até tem alguma piada. Acho eu.

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