Com a certeza de que em matéria de cumprimento dos objetivos de redução dos níveis de emissões de gazes de efeito estufa (GEE), mesmo tendo em conta todas as estratégias e tecnologias usadas até aqui, o último relatório emitido pelo Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) é claro quanto à capacidade das atuais agendas climáticas se mostrarem suficientes para enfrentar o problema, ou seja, alcançar a indispensável redução do aquecimento global, limitando-o a um aumento não superior aos 1,5 graus. Apesar do avanço significativo na sofisticação dos quadros regulatórios que se têm vindo a desenvolver, um pouco por todo o mundo, a partir do Acordo de Paris. Apesar dos esforços que o mundo empresarial, instituições, sociedade civil, científica e os governos têm levado a cabo, somado tudo isso, todos os modelos de cálculo, assente em recolha de dados, apontam para a impossibilidade de conseguirmos, em tempo útil, travar o aquecimento global de forma a inverter o problema, e evitar o ponto de não-retorno.

Entender o problema de forma simples

À quantidade de GEE que podemos colocar na atmosfera antes de existir um grande risco de efeitos irreversíveis no clima é chamada orçamento de carbono.

Para que o aquecimento da terra permaneça abaixo dos 1,5 graus, o orçamento de carbono é de cerca de 2.600 mil milhões de toneladas. Segundo dados do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), desde 1870 já colocamos 2.200 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono e equivalentes na atmosfera. Isto significa que já utilizamos 85% do orçamento de carbono disponível e só nos resta, 400 mil milhões de toneladas.

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400 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono parece uma quantidade enorme, mas neste momento, em todo o mundo, são colocadas mais de 40 mil milhões de toneladas de dióxido de carbono na atmosfera todos os anos e com tendência a aumentar.

Estratégias para a constituição e regulação dos mercados de carbono, programas de captura de GEE com recurso a tecnologias ou através da gestão do uso dos solos e planos de descarbonização das economias mostram-se incapazes de garantir podermos alcançar os objetivos de gestão do saldo de emissões que a humanidade possui.

Quem pode salvar a quem?

Ainda assim, sendo o clima um conjunto de ecossistemas de uma complexidade de que só agora a ciência começa a perceber as dinâmicas e inter-relações, é sólida a certeza científica de que têm sido os oceanos que têm adiado a intensidade dos eventos provocados pelos efeitos do aquecimento global. Digo adiado, porque na verdade, o que tem ocorrido é que se tem transferido uma sobrecarga de temperatura e GEE acima do normal para os ecossistemas oceânicos, adiando no tempo os efeitos desse aquecimento. Mas essa sobrecarga será a seu tempo devolvida, sob a forma de eventos que nada mais serão do que resultado e consequência do efeito de transferências anómalas que circulam da atmosfera para os oceanos.

As florestas de algas e o carbono azul

À semelhança do que são os designados sumidouros de carbono verde, ou seja, as florestas, assim designados pelo papel que estas desempenham na captura e retenção do carbono e equivalentes, retirados do ar, através do processo da fotossíntese, existe o seu equivalente, nos ecossistemas marinhos, uma vez que o mesmo processo, ocorre também com espécies como as algas, por exemplo. Daqui deriva o atual conceito e termo, carbono azul, se o primeiro é verde pela similitude que a cor relaciona à vegetação terrestre, este, segue o mesmo princípio, para identificar o processo de captura de carbono que é resultado de espécies marinhas e portanto, relacionado aos ambientes oceânicos.

Como derradeira solução, tem-se procurado, um pouco por todo o mundo, levar a cabo experiências e estudos que melhorem os processos através dos quais algumas espécies vegetais marinhas possam vir a aumentar a capacidade de captura e armazenamento de carbono e, ao mesmo tempo, tenta-se que nestes processos se incluam aquelas espécies que nitidamente resolvam o problema da restituição do equilíbrio desses ecossistemas.

Existe globalmente uma área de 48 M km2 disponíveis para a criação de florestas de algas. A cultura de algas pode ser, simultaneamente, um dos setores de produção de alimentos que auxilie na resolução da crise e segurança alimentar. As diversas variedades de algas podem ser utilizadas como alimento, medicina, cosmética e em processos de bioenergia. Além disso, as algas têm demonstrado um potencial de reverter a acidificação e hipoxia dos oceanos de forma eficaz.

As algas selvagens sequestram grandes quantidades de carbono nos oceanos através da matéria orgânica que se dissolve e se deposita nos fundos oceânicos. Relativamente às florestas de algas a desenvolver, será necessário melhorar a tecnologia para que esta facilite a exportação de algas para o oceano profundo onde podem permanecer durante milhares de anos, como depósitos de retenção de carbono.

Atualmente o potencial de compensar as emissões de GEE através do plantio de florestas de algas é ainda limitado. As algas sequestram cerca de 1,11K toneladas de CO2eq por ano por km2. No entanto estes processos têm vindo a ser otimizados e melhorados. Por exemplo, para as florestas de algas mitigarem as emissões associadas à agricultura global até ao final do século, com o atual rácio de eficácia de captura de carbono, teria de passar dos atuais 1,9k km2 para 7,3 M km2, o que representa cerca de 15% das áreas dos oceanos passíveis de serem explorados para este fim.

Embora as florestas de algas não devam ser vistas como a resolução derradeira para mitigar as emissões globalmente, podem ser uma ajuda preciosa para se atingir a neutralidade carbónica e corrigir o trajeto atual, na persecução desse objetivo.

As super-algas, da promessa à certeza

Nada no planeta sequestra carbono mais rapidamente do que a macrocystis pyrifera (Kelp), a qual pode crescer até aos 60 m a cerca de 50 cm por dia. De acordo com um estudo, cobrindo 9% dos oceanos com florestas de kelp, poderia remover 53 mil milhões de toneladas de CO2 por ano, restaurando os valores pré-industriais. As algas kelp são as algas com crescimento mais rápido, produzindo 27% mais do que as espécies comuns, podendo reduzir os custos de sequestro de carbono em 38%.

Embora o IPCC, no seu último relatório, a partir do estudo realizado (Changing Ocean, Marine Ecosystems, and Dependent Communities), tenha vindo a recomendar a necessidade de continuar com mais estudos, o facto é que no presente momento, face à urgência do problema e aos resultados até aqui obtidos nestas abordagens de exploração das florestas azuis, quer para a mitigação dos efeitos sobre os ecossistemas marinhos, quer como o principal sumidouro de carbono da atmosfera, é preciso consolidar e melhorar estas técnicas com mais trabalho científico e tecnológico;

Uma maior aposta publica em investimento e desenvolvimento das suas práticas, é urgente. Resta perguntar-se: precisamos de salvar os oceanos, ou precisamos deles para salvar o planeta.