Muito recentemente, em Espanha foi lançada a discussão sobre o tema da obrigatoriedade de usar dispositivos airbag na condução de veículos de duas rodas, em particular nas motos de alta cilindrada.

A polémica instalou-se, mas acabou por vingar o status quo, ou seja, o legislador travou a medida face aos enormes protestos dos motociclistas. Imperou a vontade de agradar aos eleitores, é claro, e a decisão foi aguardar por mais estudos sobre a eficácia deste dispositivo. Porém, tudo parece apontar para que Espanha apresente em breve medidas preventivas, como, por exemplo, a obrigatoriedade do uso de luvas.

O tema, entretanto, atravessou fronteiras e as reações contra a medida não se fizeram esperar. Em vez de se mostrar uma posição aberta sobre o tema, não levantando dúvidas sobre a eficácia deste equipamento quando é mais do que evidente que o airbag está devidamente testado e ajuda a salvar vidas, a opinião de um responsável do setor do motociclismo foi demonstrar desconfiança e de colocação imediata de dificuldades e problemas.

Compreende-se a defesa corporativista do espírito motard; aquela sensação de liberdade em cima de uma moto e com o vestuário que melhor se entenda usar a cada momento. Mas a verdade é que as políticas de mobilidade nas estradas estão a mudar muito rapidamente e, portanto, é preciso “pensar mais à frente”.

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A mudança de hábitos é sempre condicionada pelas mentalidades mais fechadas e corporativistas. Em vez das entidades responsáveis avançarem com o desenvolvimento de boas práticas e ir resolvendo os problemas que vão surgindo na sua implementação, começam por enumerar os problemas e as dificuldades, mandando o assunto para as calendas; ou porque não está suficientemente estudado ou porque há problemas nas caraterísticas das estradas, ou porque não há informação oficial suficiente sobre as causas dos acidentes, etc, etc.

Se olharmos para o passado, quando na década de 50 começaram a surgir os primeiros equipamentos de segurança para os condutores de automóveis, nomeadamente os cintos de segurança, a desconfiança e resistência também foi grande. Mas a verdade é que se provou rapidamente a sua eficácia na prevenção de danos maiores em caso de acidente e a evolução foi enorme nesta matéria. Pergunto se atualmente alguém entra num carro e se instintivamente não coloca imediatamente o cinto de segurança? Seguramente que não é pela obrigação legal, ou pelos sinais sonoros de “aviso”, que o condutor e ocupantes colocam os cintos. É porque realmente se sentem mais seguros com o cinto colocado.

Comecei a andar de motorizada com os quinze anos de idade, inicialmente como pendura, ora numa Honda ora numa Casal de amigos e, mais tarde, na minha Sachs. Felizmente, que na minha adolescência caí poucas vezes e sem grande gravidade, mas algumas das mazelas ainda hoje as sinto. Tudo teria sido diferente se tivesse usado proteções adequadas.

Há vários anos que conduzo motos de alta cilindrada e fico arrepiado com a quantidade de motociclistas a conduzir sem equipamentos mínimos de proteção. E nada se passa! As autoridades continuam a achar normal e o silêncio dos responsáveis que tutelam e que representam os motociclistas é confrangedor.

De facto, para além do uso do capacete, que se tornou obrigatório há vários anos, não se evoluiu muito mais. A utilização obrigatória de equipamentos de proteção para as zonas mais vulneráveis do corpo também já devia ter sido tomada. Não só porque há muitos equipamentos homologados e comprovadamente eficazes na prevenção de danos irreversíveis em caso de queda ou acidente, mas também pelo aumento significativo de motociclistas na estrada, muitos deles em motos de alta cilindrada e sem a experiência de anos de rodagem que estas máquinas exigem.

Refiro-me, por exemplo, ao uso de luvas com proteções, que já deveria ter sido defendido e implementado como obrigatório há muito tempo. Ou a utilização de blusões e calças com proteções, bem como calçado adequado. Estes equipamentos básicos de proteção existem em várias marcas e muitos deles com preços acessíveis para qualquer pessoa que tenha capacidade financeira para adquirir uma moto. Também há alguns anos que começaram a surgir no mercado coletes e blusões com sistemas de airbag incorporado. Se é verdade que até há bem pouco tempo esta tecnologia não estava suficientemente testada e era algo desconfortável na sua utilização diária, a verdade é que atualmente já não é assim; hoje o airbag é muito funcional e está devidamente testado pelos fabricantes, tanto em sala técnica de simulação como em pista, e por marcas mundialmente reconhecidas. As caraterísticas das nossas estradas e dos rails de proteção não são motivo para retirar eficácia a estes dispositivos, ao contrário do entendimento do responsável do setor.

Logo que me apercebi da evolução e inovação dos airbags para a condução de moto, não hesitei em usar e, diga-se, já tive a (infeliz) oportunidade de testar que é eficaz. Inicialmente estranha-se, mas depois entranha-se. Atualmente, ao sentar-me na moto, se não tiver o meu colete airbag colocado, tenho a sensação de estar “despido” para a conduzir. Na verdade, a sua utilização dá uma sensação de segurança e comodidade muito grande.

Naturalmente que quem, (in)conscientemente, gosta de conduzir moto com equipamento pouco adequado – do género t-shirt, calção e mocassin – vai mostrar maior resistência em mudar hábitos. Mas cabe às autoridades legislar e às organizações de motociclistas sensibilizar, para que se evolua nesta matéria, dando passos firmes na implementação de novas medidas de prevenção, contribuindo assim para diminuir as lesões graves em caso de queda ou acidente, muitas delas  irreversíveis para toda a vida.