Dificultar o acesso ao emprego em tempo de crise dificilmente pode ser considerado uma boa opção. Menos ainda se os principais atingidos são os desempregados com menos qualificações e menos experiência profissional. Mas foi isso mesmo que o Governo acabou de fazer ao promover um aumento de mais de 4% no valor do salário mínimo. É certo que esta é uma matéria na qual um misto de iliteracia económica, populismo político e pressão de vários lobbies poderosos potencia precisamente o caminho seguido. Mas a responsabilidade de um Governo competente seria continuar a resistir a essas pressões em vez de ceder a elas prejudicando os interesses do país e de alguns dos grupos mais vulneráveis da sociedade portuguesa.

É fácil – especialmente para quem não tem problemas de inserção no mercado de trabalho – fazer demagogia com o valor absoluto do salário mínimo mas, como alertou de forma muito pertinente o ex-secretário de Estado do Emprego Pedro Silva Martins: “Sendo o salário mínimo reconhecidamente baixo em termos absolutos, importa também ter presente que o salário mínimo é relativamente elevado quando comparado com os valores praticados na Europa de Leste, com os valores reais na esmagadora maioria dos últimos 40 anos em Portugal ou com os salários médios praticados actualmente.”

O aumento do salário mínimo é ainda mais irresponsável e reprovável se for tido em conta que as pessoas mais afectadas pela grave crise financeira e económica dos últimos anos foram precisamente todas aquelas que perderam o seu emprego ou que, já estando fora do mercado de trabalho, se viram impossibilitadas de a ele aceder. São essas pessoas – que continuam a ser muitas, como atestam as estatísticas sobre o desemprego – quem mais sofrerá com esta medida. Como corajosamente resumiu João César das Neves, subir o salário mínimo é estragar a vida aos pobres.

Mesmo querendo enveredar pela via eleitoralista e populista de aumentar o salário mínimo, o Governo poderia pelo menos ter optado por uma tentativa séria de mitigar estruturalmente os seus efeitos adversos. Por exemplo através da diferenciação do montante do salário mínimo em função do nível salarial médio à escala regional ou mesmo local. Dessa forma, a definição de um valor do salário mínimo nacional, que inevitavelmente acaba por ser em larga medida determinado pelo contexto dos principais centros urbanos, poderia ser menos penalizadora para as regiões mais pobres do interior, assim como para as zonas periféricas.

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Ao invés, a opção do Governo foi pura e simplesmente ceder aos lobbies com maior peso na definição das políticas públicas. Este tem, aliás, sido o padrão emergente das decisões governamentais nos últimos tempos, como infelizmente fica bem ilustrado pelas iniciativas que se perspectivam no âmbito da “fiscalidade verde” e pela aberrante nova lei da cópia privada aprovada recentemente na Assembleia da República pelos deputados da maioria PSD/CDS.

Face à proximidade do acto eleitoral, o famoso “que se lixem as eleições” de Pedro Passos Coelho parece ter sido substituído por um bem mais prosaico “que se lixem os portugueses que não pertencem a qualquer grupo de interesses politicamente favorecido”. A começar pelos desempregados com menos qualificações e menos experiência profissional, os principais prejudicados com a subida do salário mínimo. É pena, porque sendo certo que o Governo liderado por Passos Coelho foi incapaz de concretizar muitas das reformas estruturais de que o país necessita, podia pelo menos reclamar o mérito de ter feito em algumas áreas uma tentativa honesta de as levar a cabo. Não obstante ter conseguido evitar o colapso financeiro do país (o que não foi pouco), com esta série de decisões à medida dos vários lobbies que há décadas bloqueiam o desenvolvimento do país Passos Coelho arrisca-se a sair de cena da pior maneira.

Professor do Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica Portuguesa