Qual crise? pergunta que me colocavam no mês passado em Bissau, quando fui falar sobre o comportamento de jornalista em tempo de crise. Vivia-se e vive-se ainda o tempo de suspeitas sobre os resultados da ultimas eleições presidenciais. O processo arrasta-se desde 2020 mas a verdade é que o Presidente da Guiné-Bissau não perde ocasião para se referir ao assunto, ameaçando quem ponha em dúvida a sua legitimidade.

A suspeita da maioria dos 50 jornalistas de rádios comunitárias que participavam neste encontro e que vinham de todo o país é que o poder instalado utiliza a crise sanitária universal para colocar debaixo do tapete todas as crises que a Guiné-Bissau enfrenta: a segurança da sociedade civil, os atentados e ameaças aos jornalistas e à liberdade de imprensa e o quadro rocambolesco em que o candidato Sissoco se assumiu como Presidente da República.

Que o constitucionalista Marcelo Rebelo de Sousa não tenha reparado em toda a situação em que o atual presidente:

  • se auto proclamou vencedor;
  • foi investido pelo vice-presidente do Parlamento, desrespeitando todo o formalismo que obrigava a que o ato ocorresse nesse mesmo Parlamento e presidido pelo presidente da instituição;
  • quando outros candidatos tentaram levar a disputa eleitoral ao Supremo Tribunal Justiça, o espaço foi invadido por tropas que inviabilizaram  qualquer hipótese de decisão.

O que pensarão os seus alunos de constitucional, muitos deles hoje juristas de renome na Guiné-Bissau?

Sabe-se que a pandemia em geral obrigou a comunidade internacional a fechar olhos e a pactuar com situações moralmente insuportáveis. Foi assim em todo o mundo. Mas que as autoridades portuguesas pactuem com situações em que os interesses francófonos presentes em temas tão importantes como a exploração do petróleo na zona costeira do país e o futuro da região de Casamança não será um bom sinal para as fraternas relações bilaterais.

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