Que saudades do KITT, o carro falante do estiloso Michael Knight, esse sim um KITT que salvava pessoas de qualquer dificuldade, bem ao contrário deste monte de cangalhadas que é o kit de emergência dos programas do Ministério da Administração Interna “Aldeias Seguras” e “Pessoas Seguras”. Aliás, acho que “Pessoas Seguras” é uma referência à quantidade de gente que, em zonas de maior incidência de fogos e sem ajuda para os combater, tem de ser agarrada pelos amigos para não ir aos fagotes do ministro Eduardo Cabrita.

Além das já famosas golas-acendalha, o kit de emergência inclui um apito, uma lanterna, uma bússola e coletes refletores. Tudo coisas que podem ser bem úteis num cenário de combate a incêndio:

– Ó Fernando, com esta falta de meios isto vai mesmo arder tudo, não é?
– Sim, mas não desanimes, pá. Pelo menos temos o kit de emergência da Protecção Civil.
– É verdade! Tinha olvidado!
– O Júlio, como tem a farda dos sapadores, é o árbitro. Dá-lhe o apito.
– Nós jogamos de t-shirt, vocês jogam com os coletes reflectores.
– OK. A nossa baliza são aqueles dois pinheiros em chamas e a vossa é a lateral do autotanque.
– Bússola ao ar para ver quem sai a jogar?

– Vamos lá. Ponteiros para cima começamos nós, parte de trás saem vocês.
– Então e a lanterna?
– É o prémio de jogo para o melhor em campo.

Pois é, ao contrário do que antecipavam os especialistas, a moda verão 2019 não está a ser dominada nem pelas listas coloridas, nem pelos laços, nem pelo estampado vichy. Que é aquele padrão axadrezado tipo toalha de piquenique, para os leigos. Não, este é o verão das golas, das carapuças e do capote, cortesia desse verdadeiro criador de tendências – mormente da tendência para a trafulhice – que é o governo do Partido Socialista.

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Bom, mas pode haver uma boa razão para fornecer golas-acendalha às populações em zonas de maior risco de incêndio. É o mesmo princípio de levar uma bomba para o avião. Se eu levar uma bomba, qual a probabilidade de haver uma segunda bomba a bordo? Reduzidíssima. As hipóteses de haver duas bombas a bordo são incomparavelmente menores do que as de haver uma bomba a bordo. Conclusão: por segurança é sempre conveniente levar a sua própria bomba quando viaja de avião. É possível que o raciocínio da Protecção Civil tenha sido semelhante: toca a distribuir bastante material inflamável pelas zonas mais susceptíveis de arder, porque assim é menos provável que apareçam outros engenhos combustíveis como os commumente usados para atear fogos.

Causou forte polémica o facto de também esta negociata das golas-acendalha ter ficado toda em família, nomeadamente na família socialista, mas tal não é surpreendente. É evidente que os socialistas não são os únicos que sabem fazer golas, mas a verdade é que são os mais eficientes na sua produção. Isto porque nas últimas décadas acumularam inestimável know-how em acessórios de vestuário para envergar na cabeça à conta das sucessivas carapuças que têm enfiado aos portugueses.

Já o ministro Eduardo Cabrita diz que o governo não tem culpa neste caso e está correcto. Apesar de tudo tresandar a estupenda incompetência, a realidade mostra que o executivo não está a alijar responsabilidades. Isto porque se o governo estivesse efectivamente a sacudir a água do capote haveria neste momento água suficiente no país para apagar fogos até 2157. Aliás, o capote do executivo está de tal forma encharcado que se a água tivesse sido sacudida neste momento em vez de lamentarmos os incêndios estávamos a lamentar ter de ir todos os dias para o trabalho de barco a remos.

Bom, demita-se ou não, o ministro da Administração Interna já não se livra de ficar pelo menos com uma ideia da delícia que deve ser usar uma destas golas-acendalha num cenário de fogo. Eduardo Cabrita já deve ter levado tanto calduço de António Costa por causa desta barafunda tão perto das eleições legislativas que neste momento terá certamente o pescoço em brasa.