No dia 16 de março de 2020, a Resolução do Conselho de Ministros n.º 10-B/2020 suspendeu a circulação de pessoas com a vizinha Espanha até 15 de abril de 2020. A Resolução do Conselho de Ministros n.º 22/2020 renova esta última até 14 de maio de 2020. Por outro lado a ordem interna 239/2020 do ministério do interior do governo de Espanha, de 16 de março e sucessivamente renovada, com, actualmente, período de vigor até 24 de Maio de 2020, suspende a entrada em território Espanhol de pessoas que não residentes, cidadãos ou trabalhadores transfronteiriços.

Passados dois meses desde o início destas restrições e com situações de retoma económica internas por parte dos dois países, é necessário reabrir a fronteira Portugal-Espanha, quer do lado Português como do lado Espanhol.

E, para ser claro, defende-se a reabertura de fronteiras para cidadãos europeus por razões de trabalho. Isto é, deslocação para procura de emprego ou início de actividade laboral. Algo que não está permitido, ao momento, nos documentos citados. Algo que é mais abrangente do que a circulação de trabalhadores transfronteiriços, aqueles que vivem numa localidade fronteiriça e trabalham numa localidade fronteiriça de país vizinho.

Argumentos sanitários

Primeiro porque há infectados tanto em Portugal como em Espanha. Se se pudesse considerar que o fecho de fronteiras para certa população existisse por esta estar significativamente mais contaminada, e, assim, poder contaminar outra população ainda mais, esse racional já não existe.  A proporção de infectados nos dois países não é significativamente diferente, especialmente considerando que os dois países estiveram em severas medidas de contenção em todas as suas regiões.

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Segundo, porque é perfeitamente possível pensar na liberdade de circulação se se for um pouco mais além do básico e obtuso evitar qualquer contacto (que aliás deixa bem evidente a necessidade de uma modernização dos estados): Com medidas de proteção exigentes durante a circulação, possivelmente com contact-tracing e com testes no início e fim de passagem.

Mas, sobretudo, porque a interacção/número de contactos não escolhe nacionalidades, sendo o factor humano que determina a rapidez de contágio (daí que as medidas sejam de distanciamento social). De facto, estas interacções, por pessoa, serão maiores devido às retomas económicas internas (ou à realização de comemorações do 1º de maio) do que a uma passagem transfronteiriça!

Razões socioeconómicas

Agora, é bem sabido que esta relutância não se alicerça em razões sanitárias, como seja senso comum, mas sim em razões socioeconómicas. Primeiro, é difícil para governos preocupados em popularidade  abrir as portas aos “estrangeiros”, mesmo que sejam concidadãos europeus. Depois porque para os decisores políticos, deve-se proteger o sistema administrativo de “confusão”. Por fim, porque os sistemas de saúde estão muito fracamente coordenados para dar resposta a procura externa.

Ora, se os dois primeiros argumentos não passam de gestão política incapaz, o segundo poderia ser de relevo. Seria problemático se, por exemplo, um cidadão europeu que passasse a residir noutro país ficasse doente e não tivesse cuidados de saúde. Mas, estando a falar-se de deslocações por motivos de trabalho, seria claro que o trabalhador já teria um contrato de trabalho que lhe asseguraria capacidade de procurar resposta de saúde adequada. No extremo, poderia-se, de forma temporária e proporcional, avaliar-se a imposição de um nível de rendimentos mínimos por parte desse cidadão para responder à doença.

Custos de não reabrir a fronteira

Os custos de não reabrir a fronteira, são e têm sido, por outro lado, elevados, ultrapassando estes de a manter fechada.

Por um lado, política e socialmente, são um forte ataque à liberdade de circulação. Os cidadãos europeus reconhecem a possibilidade de viajar e trabalhar em qualquer país da União Europeia como fundamental. Não poder fazê-lo é uma grave restrição ao projecto de abertura e intercâmbio que é a comunidade europeia. Por dados do Eurostat e por exemplo, em Espanha, no segundo trimestre de 2018 trabalhavam 851 mil cidadãos Europeus, uma percentagem de 5 por cento da sua força de trabalho. Em Portugal, 36 mil, cerca de 1%.

Por outro lado são causa de elevada perda económica. As pessoas e famílias que podem aproveitar as oportunidades de cada economia, com a consequente maior especialização e aumento do produto total vêem-se incapazes de o fazer. Os desempregados e os empregadores ficam com menor possibilidade de escolha, prejudicando as suas possibilidades de trabalho e a sua eficiência. Em Espanha, por exemplo, considerando os números de trabalhadores e um rendimento mediano de 8.826 euros, fala-se de cerca de 4 mil milhões de euros em 6 meses. Em Portugal, de 178 milhões. Números que nos devem exigir uma resposta rápida!

Posto isto, é imperativo reabrir a fronteira Portuguesa e Espanhola para a livre circulação de trabalhadores. Impedi-lo por razões de saúde pública deixou já de ser razoável. Impedi-lo por problemas socioeconómicos pode ser remediado. Os custos de não o fazer são elevados.