Esta semana foi finalmente aprovado pelo Parlamento Europeu o Orçamento 2021-2027 e o plano de recuperação Next Generation EU. Do montante global de 1,8 biliões de euros, aproximadamente um terço deverá ser dedicado à economia “verde”. Por sua vez, Portugal irá receber perto de 58 mil milhões de euros de subvenções a fundo perdido. Portugal já apresentou o Plano de Recuperação e Resiliência que é necessário para aceder a uma parte dos fundos, correspondente a quase 13 mil milhões de euros, prevendo uma despesa em investimentos verdes de 2,6 mil milhões de euros.

A enorme oportunidade que representa este pacote da União Europeia, exige-nos também uma reflexão séria sobre como podemos melhor usar estes fundos. As prioridades da sustentabilidade em Portugal não podem ser as mesmas dos países no Centro da Europa, porque a situação em Portugal é muito diferente.

Desde logo, nos últimos vinte anos, apesar do apoio financeiro da União Europeia, Portugal quase estagnou, com um crescimento médio de 0,7% ao ano. Os investimentos verdes previstos no plano que agora é lançado devem por isso ser criteriosamente orientados para, de uma forma sustentável, aumentarem a produtividade da economia. Uma economia mais verde, mas que continua a não crescer, não serve.

Em segundo lugar, Portugal tem um problema seriíssimo de pobreza energética. Em 2018, segundo o Observatório da Pobreza Energética da União Europeia (energypoverty.eu), uma em cada cinco famílias portuguesas considerava que não conseguia aquecer adequadamente a sua casa, o quinto Estado-Membro com pior desempenho neste indicador. No entanto, não existe um levantamento sistemático destas situações de pobreza. A única política para combater a pobreza energética, a Tarifa Social da Energia, revela-se claramente insuficiente para atender a todas as situações de pobreza energética. Na maioria dos países Europeus existem políticas específicas para grupos de risco, como os idosos, os mais endividados e para a habitação social, que deveriam ser replicadas em Portugal.

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Nos índices de eficiência energética, Portugal encontra-se também abaixo da média europeia. Em 2018, Portugal apresentava um consumo energético face ao PIB 20% superior à média Europeia. Portugal foi também o país que menos diminuiu o seu consumo energético face ao PIB entre 2018 e 2000. É urgente implementar programas que melhorem a eficiência dos edifícios, incluindo da habitação social, o que permitiria combater ao mesmo tempo a ineficiência e a pobreza energética.

Por fim, apesar de Portugal ter uma taxa de renováveis no consumo de energia muito considerável (30% comparando com uma média de 19% na UE), ainda assim, as emissões por unidade de PIB estão acima da média (320 contra 250 gramas de gazes com efeito de estufa por euro). A chave está provavelmente também na ineficiência energética, que limita os benefícios ecológicos das energias renováveis, obtidos na geração. As vantagens das renováveis desvanecem-se pela ineficiência!

É compreensível o entusiasmo do Ministério do Ambiente com investimentos inovadores e que aproveitam o potencial elevado de energias renováveis que Portugal tem, como é o caso do plano para o hidrogénio verde. No entanto, a transformação para uma economia verde tem de ser feita para melhorar de forma visível a qualidade de vida das pessoas e não pode deixar de lado os problemas de ineficiência e de pobreza energética e a estagnação económica das duas últimas décadas. Sem uma resposta a estes problemas, arriscamo-nos a que a economia verde seja mais um fator de desigualdade em Portugal, que beneficia apenas alguns, em vez de ser um fator de coesão. A recuperação verde tem de ser também uma recuperação justa.