Sou crente, penso e sinto como crente, mas já estive afastada da Igreja e sei como é fácil criar distância e ficar cada dia mais longe e, porventura, mais abstrata. Talvez esta experiência dos meus vinte anos se tenha tornado fundamental, no sentido em que passei a compreender melhor as dúvidas dos que não creem. Gosto particularmente de ouvir e conversar com não crentes porque aprendo muito com eles. Também por isso, identifico-me particularmente com padres que dialogam constantemente com os que não têm fé e escrevem a pensar especialmente neles. Tomáš Halík e Tolentino de Mendonça tornaram-se dois ícones contemporâneos deste diálogo e são, hoje em dia, uma referência e uma inspiração universais.

Halík, um dos mais respeitados teólogos do século XXI, assume que escreve livros para pessoas com mentes e corações abertos. Basta-lhe isso. Não precisa que sejam crentes nem têm que acreditar no mesmo em que ele acredita. “Ouvir os críticos é importante para nós, mas críticos inteligentes. Também na Bíblia vemos que o nosso Deus gosta de quem luta com ele, como Job ou Jacob. É sempre uma provocação para pensar de modo mais profundo” disse recentemente numa entrevista a António Marujo, do Ponto SJ, quando esteve em Portugal para o lançamento do seu último livro.

Nesta semana, em que os crentes celebram o seu tempo maior, nem precisamos de ir tão atrás. Basta o exemplo de Jesus quando, por exemplo, conversou com a mulher adúltera trazida por quem estava disposto a só abandonar o terreiro depois de a apedrejar até à morte. Jesus estava lá e não gritou nem apontou o dedo a ninguém. Não chamou uns de parte para lhes perguntar se tinham fé e para ter com eles uma conversinha impecável. Também não foi moralista com a mulher, não ralhou com os homens nem condenou um único dos que estavam presentes naquela cena. Tão pouco lhes perguntou se acreditavam em Deus, nem lhe ocorreu mandar a mulher ir a correr confessar-se dos seus pecados e voltar de seguida para ver que castigo lhe dariam e o que haveriam de fazer com ela. Olhou simplesmente para a mulher naquela sua circunstância, escreveu em silêncio umas palavras na terra do chão e, depois, sugeriu que quem estivesse livre de culpas atirasse a primeira pedra. Ninguém o fez.

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