Após a lamentável morte do cidadão ucraniano Ihor Homeniuk, falou-se muito da extinção do Serviço de Estrangeiros e Fronteiras e da distribuição das suas responsabilidades por outras entidades.

Em Abril de 2022 anunciaram o diferimento da extinção do SEF até Junho, em Julho até ao final do verão e em Novembro decidiram esperar pela criação da Agência Portuguesa para as Migrações e Asilo (APMA).

Desde então, após vários adiamentos, o SEF encontra-se no limbo da sua existência. Tecnicamente existe mas é extremamente difícil sentir-lhe o pulso.

Isto torna-se ainda mais evidente com a afluência dos refugiados que relatam que desde Setembro ainda não têm a sua situação regularizada, embora impacte todos os estrangeiros residentes em Portugal. Até os que vivem em território nacional há décadas e construíram a sua vida por cá.

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No caso dos refugiados, sabemos que muitos esperam longos meses pelos números de utente, Segurança Social e de Identificação Fiscal para poderem integrar-se na sociedade, conseguirem arrendar uma casa e ingressarem no mercado de trabalho legal. Sem estes, só lhes resta trabalhar ilegalmente para conseguir meios de subsistência. O acesso aos cuidados de saúde também fica comprometido, sendo o serviço de urgência a sua única opção não ausência do cartão de utente. Processo que demorava cerca de 48 horas em Março de 2022 neste momento sofre de um atraso na cadeia sem se perceber bem qual das entidades é que não está a conseguir dar resposta.

Por outro lado temos os imigrantes que entram num ciclo infinito donde parece não haver outra saída senão desistir e ir embora. Apesar de serem anunciadas renovações automáticas para os títulos de residência, parece difícil descobrir os critérios de elegibilidade para as mesmas. O portal do SEF, que antes da anunciada reestruturação permitia seleccionar a delegação, ver um calendário com as vagas disponíveis e seleccionar o dia e a hora da visita, neste momento alerta o utilizador que simplesmente não existe disponibilidade nos postos de atendimento. Sem possibilidade sequer de escolher o motivo do agendamento (renovação do título de residência, sendo a única opção de momento, está automaticamente seleccionada) ou procurar vagas noutra delegação. A única alternativa que o portal apresenta é ligar para a rede fixa do SEF onde é impossível sequer conseguir a ligação da chamada, já para não falar em ser atendido.

O desespero levou alguns imigrantes a manifestarem-se no passado dia 16 de Dezembro de 2022, mas não teve grandes resultados.

A elevada procura e o desespero em conseguir renovar as suas autorizações de residência deu espaço à oferta de um novo serviço por parte de solicitadores que promete ajudar com a renovação do título de residência por cerca de 700 euros, fora as taxas do SEF.

As últimas notícias referiam que a reestruturação do SEF terminará até Março de 2023, adiantando que as políticas públicas em matéria migratória e de asilo ficarão a cargo do APMA. Com o Março já à porta, o único dado concreto apresentado é o da proposta salarial do diretor da APMA que “poderá rondar os oito mil euros”.

No universo de mais de 750 mil estrangeiros a residir em Portugal à data de Dezembro de 2022, segundo o próprio SEF, ter essa entidade a funcionar é estratégico para termos imigração controlada e regularizada.

Os imigrantes são uma parte importante da recuperação económica do país, contribuem para a demografia, trazem novas ideias e podem colmatar a escassez de mão de obra. Contribuem até para a sustentabilidade do sistema de Segurança Social. Prova disso, por exemplo, é o Relatório Estatístico Anual 2022, elaborado pelo Observatório das Migrações, que demonstra que as contribuições de imigrantes para a Segurança Social atingiram um recorde de 1.293,2 milhões de euros.

É imperativo garantir que os que chegam e os que já residem no país não passem por obstáculos burocráticos e que tenham um processo de legalização claro e eficiente.

O estado foi reativo à situação trágica que aconteceu com o Ihor, mas, não conseguindo levar a cabo a reestruturação em tempo útil, deixou os cidadãos estrangeiros nas mãos de um SEF de Schrodinger que existe e não existe ao mesmo tempo. Sem coragem de voltar atrás na decisão, continuamos à espera de uma solução.