Se fica a ideia que o momento merece solenidade é, muito acertadamente, porque o momento merece solenidade. Vale mesmo a pena escutar as palavras do Presidente da Assembleia da República, aquando da última reunião sobre a Covid, que juntou peritos, políticos e parceiros sociais. Disse Ferro Rodrigues: “Não consigo perceber porque é que não se apreenderam lições da primeira fase e não se retiraram lições para a evolução da situação em julho e em agosto, nomeadamente”. Por brevíssimos instantes, imaginei que o organismo de Ferro Rodrigues tivesse, enfim, desenvolvido uma espinha. Mas, quase de imediato, veio a desilusão. Aquele desabafo de Ferro não era para ser ouvido pelo público e só foi escutado pela comunicação social devido a trapalhadas técnicas. Definitivamente, para os dirigentes do PS, os grandes problemas do momento não são nem a recessão, nem o desemprego. São, isso sim, as declarações em off e a cobardia. Costa, cobardemente, chamou cobardes aos médicos, em off. E agora, Ferro denota cobardia ao demonstrar, em off, ser fortemente crítico da acção do Governo, quando nunca o ouvimos fazê-lo publicamente.

Mas Ferro Rodrigues poderá ter outro problema em mãos. É que, ainda em off, arriscou comentar também que não consegue “olhar para as estatísticas que mostram os números de casos em Portugal e na China sem ficar com um misto de perplexidade e de alguma irritação”. Alto. A insinuar que os chineses aldrabam forte e feio? Ui, se calha o Partido Comunista da China ainda ter funcionários a desmontar a barraquinha da Festa do Avante, o mais certo é aproveitarem para, de caminho, passarem por São Bento. E aí o Presidente da Assembleia experimentará o tratamento que as autoridades chinesas baptizaram, carinhosamente, de “Placagem à Hong Kong”, estreado há dias com uma subversiva menina de 12 anos, que andava numa rua daquela região a adquirir, subversivamente, material escolar.

Enquanto isto, Ana Gomes apresentou a sua candidatura à Presidência da República. Portanto, na corrida à Presidência temos, agora, uma candidatura apoiada pelo Partido Socialista e a de Ana Gomes. Há alguma curiosidade relativamente à posição que António Costa vai tomar, mas creio que o primeiro-ministro tem as suas opções bastante limitadas. Tendo-se tornado, por via de auto-convite, naquela célebre visita à Auto-Europa, mandatário da campanha de Marcelo Rebelo de Sousa, não vejo que solução resta a António Costa. Mas, se tivesse de apostar, punha o meu dinheirinho todo em simulação sonsa de distanciamento durante a campanha eleitoral.

Assim que se soube da candidatura de Ana Gomes, o também candidato André Ventura brindou-nos com a sua análise político-ideológica da mesma, afirmando que, “numa certa metáfora, Ana Gomes é a candidata cigana destas Presidenciais. Eu sou o português comum.” Por acaso, em termos de figuras de estilo, o que me parece é que, numa certa hipérbole, André Ventura é o português comum. É que, apesar de tudo, o português comum não costuma ser tão burgesso.

Já a Câmara Municipal de Lisboa não pára de anunciar medidas na área da habitação. Só nos últimos dias foram duas. Primeiro ficámos a saber que a Casa dos Animais, o centro de recolha da Câmara, vai receber obras de ampliação para acolher mais cães, no valor de 1,2 milhões de euros. Quase de seguida, foi apresentado um novo projecto, desta feita para humanos, com o objetivo de “melhorar a eficiência energética das casas”, através da atribuição de um máximo de 7.500 euros para pequenas obras de remodelação. Portanto, para os cães, casas novinhas em folha. Para os humanos, com sorte, o problema de infiltrações na marquise resolvido. Já bem bom. Entretanto, esta noite, na nova sala de cinema da renovada Casa dos Animais, tudo o que é cão vai poder assistir à película “Vida de munícipe da Câmara de Lisboa”.

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