Eu, pecadora, me confesso. Gostava de resistir à inércia e de ter a coragem dos Mesquita Guimarães e impedir também os meus filhos de frequentarem as aulas obrigatórias de cidadania. Não o fiz, e em troca tenho o trabalho de seguir a par e passo o programa e desconstruir em casa praticamente tudo o que por lá se ensina. Ganho eu e ganham eles em espírito crítico. Mas perdemos todos pela desvalorização daquele que é o bem mais precioso da vida: a nossa liberdade.

O que os Mesquita Guimarães recusam é absolutamente legítimo. Reclamam para si o direito de educar os seus filhos de acordo com a sua consciência e recusam que o Estado lhes imponha os seus critérios. Estados que recusam a liberdade de consciência aos seus cidadãos chamam-se ditaduras ou totalitarismos. O artifício usado para doutrinar as crianças é tornar obrigatória uma disciplina que não o podia ser, pelo simples facto de que, em grande parte do seu currículo, ensina matérias que são da esfera da consciência e, portanto, devem estar no âmbito da liberdade de educação conferida somente aos pais e educadores.

Por recusarem ser limitados na liberdade de consciência e de pensamento, muitos foram presos e torturados no Estado Novo. Agora o Estado atua de forma mais discreta, tornando obrigatório o que devia ser opcional e assim impondo a doutrina de alguns grupos a toda a sociedade, com especial empenho nos mais novos.

Estes pais de Braga recusaram que os seus filhos fossem cobaias de um Estado que quer impor o pensamento único e estão a ser alvo de perseguição. Para já, no gabinete do Secretário de Estado, prepara-se o retrocesso em dois anos letivos de dois alunos de excelência. Em curso pode estar também a retirada dos filhos aos seus pais. acusados, pela obscura e comprovadamente incompetente Comissão de Proteção de Menores, de incúria na educação dos filhos. O processo está a decorrer e se se mantiver este braço de ferro esta é mesmo uma hipótese real.

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Toda esta história faz-me lembrar tragédias de tempos longínquos, algumas delas transformadas em filmes premiados, em que homens e mulheres que recusaram ceder no seu direito à liberdade de consciência acabaram presos e mortos em nome daquilo que consideravam justo. Pensávamos que esses tempos estavam ultrapassados. Que já não se repetiriam casos como as sentenças de morte de Thomas More (por sinal o santo padroeiro dos políticos) ou de Franz Jägerstätter do filme Uma Vida Escondida, que conta a história verídica do agricultor austríaco que se recusou a integrar o exército Nazi, apesar de à época ser obrigatório.

Todos conhecemos estas e outras histórias do passado e emocionamo-nos com elas. Na antiga prisão do Aljube até temos um museu a louvar os feitos dos que não se deixaram manipular pelo regime. Em novembro de 2021 estamos a assistir ao mesmo, sem que isto nos faça ter um sobressalto cívico. Esta família está a ser perseguida por motivos de liberdade de consciência e de pensamento.

Pela minha parte acabo como comecei. Admiro a coragem dos Mesquita Guimarães, penalizo-me por não fazer o mesmo, mas ao menos uso os meios ao meu dispor para denunciar a tirania dos tempos modernos.