1 Palavra dada, palavra honrada. O Primeiro-ministro disse que Marta Temido só podia deixar funções depois de aprovar em Conselho de Ministros o diploma que confere as competências da nova Direção Executiva do Serviço Nacional de Saúde, e assim foi. Cumprido o castigo, a ministra que já não o era ainda teve de passar pela humilhação final de dar explicações à imprensa sobre o referido diploma e, já agora, sobre as razões que a levaram a pedir a demissão. Em resumo, é como se Costa tivesse dito a Marta Temido: “já que já estás queimada, faz o trabalho difícil e, se não der resultado, há sempre alguém para responsabilizar.”

No mesmo dia desfez-se o tabu e ficámos a saber que o próximo ministro não é o atual secretário de estado, mas um ex-secretário de estado. Para o caso tanto faz. Manuel Pizarro é alguém fácil de recrutar e fácil de controlar. Será que era disto que António Costa estava à procura? Ou será que, com apenas alguns meses deste Governo de maioria absoluta, já ninguém na sociedade civil está disponível para a função? São perguntas para as quais não tenho respostas, mas pondo-me na pele de um hipotético ministro independente e competente, chego facilmente à resposta: não estou disponível.

A verdade é que ninguém devidamente preparado para resolver os problemas que o sistema de saúde enfrenta está disponível para se sacrificar em nome de reformas que este Governo nunca aceitará fazer.

Para quem tenha dúvidas, basta ver a habilidade que a máquina socialista inventou para fazer o mesmo corte de pensões que o inábil governo de Passos Coelho já tinha anunciado. A habilidade dos socialistas, agora denunciada pela comunicação social, não é cortar menos do que Passos Coelho cortou. É fazer os mesmos cortes tentando criar a ilusão de que está a fazer coisa diferente. Há quem goste de ser comido por parvo, e há quem prefira viver na ignorância. Eu, por mim, prefiro viver em cenários realistas, apesar de lamentar a falta de profissionalismo político de quem realmente quis fazer o país avançar enfrentando os problemas. A comunicação não é um pormenor no exercício do poder. A par da estratégia política, é talvez o fator mais importante para quem quer levar avante um projeto político. Enquanto o PSD não perceber isto, será muito difícil voltar ao poder.

PUB • CONTINUE A LER A SEGUIR

2 No Reino Unido tivemos a experiência oposta à portuguesa. Isabel II, com 96 anos, morreu ao fim de 70 anos de uma chefia de estado que se confunde com a história do século XX e das primeiras décadas do século XXI. Ao contrário do que se tornou um cliché no nosso léxico político, a Rainha de Inglaterra não foi rainha de Inglaterra no sentido pejorativo do termo. Isabel II e a casa real inglesa souberam gerir o silêncio público da rainha ao longo de sete décadas, com uma estratégia de comunicação ímpar no mundo inteiro.

Os especialistas de comunicação deviam estudar bem o legado de Isabel II e da casa real britânica. O espetáculo mediático a que estamos a assistir nestes dias e a transição de poder para Carlos III mostram-nos muito mais do que um ritual simbólico. A transição de reinado no Reino Unido e na Commonwealth demonstram aos mais céticos que sim, tudo aquilo faz parte de uma identidade única no mundo. Perder o ascendente de que Isabel II tão bem soube cuidar ao longo de décadas significa perder um ascendente que, gostemos ou não, os britânicos conservam no mundo. Mesmo depois do Brexit, Londres continua a ser sinónimo de um poder único no mundo inteiro. Quem está dentro conserva uma imagem de glória e solidez que nem Moscovo, nem Pequim, nem Washington, nem Bruxelas conseguem igualar. Quem está fora ou procura pôr-se de fora arrisca a sua sobrevivência e a dos seus companheiros de história comum.

É para isto que serve a monarquia. Não é para encher páginas de revistas de Lifestyle.

Assim se vê o peso das sucessões.